Foto de Chris Linnett via Unsplash.

Edição 310 – Lula sinaliza para a entrada do Brasil na Iniciativa Cinturão e Rota

Vacinas chinesas e gigantes de tecnologia na China

Quem alimenta o consumo de dados? A discussão sobre gasto de energia e a crescente demanda por processamento de dados (como em sistemas de inteligência artificial) começou a ganhar tração – inclusive na China. O último relatório do Greenpeace East Asia mostra preocupação no pouco uso de energias renováveis de empresas de tecnologia, explica o South China Morning Post. A publicação da ONG ambiental analisou os principais provedores de data centers e serviços de nuvem no país (que somam 60% do mercado chinês) e pediu para aumentarem investimentos verdes. Isso se dá no contexto das novas demandas no uso de IA e computação em nuvem, com projeções de crescimento de demanda energética de data centers em 160% ao redor do mundo até 2030. Só na China, as emissões de gás carbônico dessas infraestruturas digitais estão estimadas a crescer 152% até 2035 (em comparação com 2020), segundo o Greenpeace. Ainda que algumas empresas tenham aumentado suas compras sustentáveis no último ano, há uma preocupação que essa nova demanda venha de fontes não renováveis ao longo de toda a cadeia de suprimentos se nada for feito – prejudicando alguns avanços recentes.   

Neste episódio do podcast da NPR, a jornalista Emily Fang conta também como o governo de Taiwan está pagando subsídios para fazendeiros não plantarem arroz e deixarem a água para as fábricas de semicondutores na região. A ilha enfrenta uma das suas piores secas e é um hub global de fornecimento de semicondutores – e os usados para IA são cada vez mais demandados na economia global. A gente já viu tensões entre a população do Uruguai e o Google nessa dinâmica de usar recursos hídricos – nesse caso para resfriar grandes centros de processamento de dados.

Imune. A China acaba de alcançar um marco importante a nível de infraestrutura de usinas nucleares. A usina HTR-PM (sigla fofa para um nome enorme) em Shandong, tornou-se o primeiro reator nuclear em escala real no mundo a ser completamente imune a derretimentos, mesmo em caso de perda total de energia externa. Diferente dos reatores tradicionais que dependem de mecanismos de resfriamento alimentados por energia externa e intervenção humana, o reator de Shandong possui mecanismo de resfriamento natural. A implementação desse modelo de resfriamento foi liderada por pesquisadores da universidade de Tsinghua. A ausência de um sistema de resfriamento de emergência no HTR-PM destaca sua segurança passiva e representa um modelo inovador para futuros reatores nucleares, uma vez que todas as usinas modernas dependem de mecanismos de resfriamentos energizados para retirar excesso de calor dos reatores.    

Brain drain ao contrário. O Center on China’s Economy and Institutions da Universidade de Stanford publicou um estudo que mostra como os EUA vêm perdendo cientistas chineses desde o endurecimento de políticas pelo governo Trump. Há pelo menos duas décadas, a China é o mais importante fornecedor de cientistas para o país americano, mas desde 2018 houve um crescimento de 75% no número de cientistas chineses partindo dos EUA, com pelo menos ⅔ voltando para a China. Embora a maioria dos cientistas chineses que vivem nos EUA pretenda permanecer em terras estadunidenses, 61% considera deixar o país e quase a metade evita solicitar subsídios do governo federal para evitar incomodações. Se a perda de talentos e o obstáculo ao avanço científico trarão impactos negativos para os EUA, a China só tem a agradecer pelo retorno de cérebros, que devem impulsionar o desenvolvimento técnico-científico do país, conforme argumentaram Christina Lu e Anusha Rathi na Foreign Policy. O tema também foi assunto mais cedo este ano aqui na Shumian.

Brasil mira na Iniciativa Cinturão e Rota. Na terça-feira (22), o presidente Lula anunciou que o governo brasileiro está estudando a possibilidade de ser o novo membro da Iniciativa Cinturão e Rota e como isso poderia acontecer, pensando também nas demandas de infraestrutura do país, como explica o SCMP. A especulação não é nova e a cobrança aumentou desde a visita de Lula à China em 2023 e nesse ano de 50 anos do estabelecimento das relações diplomáticas entre os dois lados. O que muda agora é o posicionamento de Lula, que mandou um sinal mais positivo do que os anteriores – suscitando até comentários da porta-voz de Pequim. Apesar do otimismo de alguns, o próprio Lula disse que ainda está no ar os detalhes de como isso se daria e qual o nível de participação. 

Os jogos mal começaram, mas a China já é campeã. Calma, não estamos falando do quadro de medalhas. Esta reportagem do South China Morning Post mostra como produtos e fabricantes chineses estão por todos os lados nos Jogos Olímpicos de Paris. A variedade de produtos vai de souvenirs, passando por bebidas e até equipamentos para competições, como windsurfing. O tema apareceu também em vídeo da Bloomberg, sobre como o Made in China saiu à frente nos jogos. 

Será? Aconteceu a reunião entre 14 grupos rivais palestinos em Pequim. Os dois maiores grupos, Hamas e Fatah, estiveram na China e assinaram uma declaração para formar um governo conjunto. Entre idas e vindas, ambos se encontram um pouco mais inclinados a cooperar desde o início da guerra com Israel, após os ataques em outubro de 2023. O acordo foi visto como uma vitória para a diplomacia chinesa – que há pouco mais de um ano atrás conseguiu fazer algo parecido com Irã e Arábia Saudita. Mas vamos com calma no otimismo: apesar do conflito entre si, Hamas e Fatah assinaram acordos de conciliação em Mecca (2007), no Cairo (2011 e 2017), em Doha (2012), e em Algiers (2022), e que não foram além das intenções. 

Repaginado. O perfil dos investimentos chineses na América Latina tem ganhado uma nova direção nos últimos anos: tradicionalmente focado em petróleo, megaprojetos de infraestrutura e mineração, a região faz parte da vanguarda industrial com foco na transição energética e tecnologia de ponta. Empresas chinesas investem mais agora na produção de baterias de lítio, extração do mineral e carros elétricos em Argentina, Brasil e Chile, algo novo para o perfil dos investimentos na região. Como discute Javier Lewkowicz para o Dialogue Earth, o movimento é acompanhado de menos liberação de linhas de crédito dos carros fortes na região — Bank of China e Eximbank da China — e mais por participação direta de empresas chinesas.

Resposta rápida. Um professor da Escola de Artes Liberais da Universidade do Povo em Pequim foi demitido em menos de 24h após uma denúncia de assédio a uma doutoranda. A aluna Wang Di postou um vídeo de quase 1h de duração no  Weibo no domingo (21) acusando Wang Guiyuan de assédio sexual e comportamento indecente em 2022, incluindo áudios como prova. A postagem viralizou e na segunda-feira (22), a administração da universidade já havia criado de madrugada um grupo de trabalho para investigar as acusações e logo anunciou a demissão do professor, que também foi removido do Partido Comunista. A postagem foi deletada. Wang era ex-vice-reitor e também representante do Partido na universidade, conforme informou o The Guardian. A reação rápida recebeu elogios – mas também suscitou críticas de respostas morosas ou inconclusivas em outros casos e até punição de mulheres que levantaram a bandeira do MeToo. 

Com expectativa de vida acima dos Estados Unidos, a China deve ajustar a idade para aposentadoria de seus trabalhadores. Reportagem da BBC conta que o país deve fazer mudanças graduais nos próximos cinco anos para tentar diminuir a divergência entre contribuintes e pensionistas. A China tem hoje uma das menores idades para aposentadoria: 60 para homens, 55 para mulheres que executam trabalho de colarinho branco e 50 para aquelas que atuam em trabalhos que exigem mais esforço físico. O gigante asiático conta hoje com uma expectativa de vida de 78 anos, um salto se comparado com 36 anos em 1949, quando o PCCh chegou ao poder. A estimativa é de que a idade mínima de aposentadoria não passe de 65 anos, segundo um documento lançado após a Terceira Plenária do partido. Aguardamos os próximos detalhes.

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Documentário: começaram os Jogos Olímpicos e um documentário conta a história de atletas do surf na China. O Surf Nation foi feito pelo World Channel e conta a saga do país para arrasar nesse esporte. Este será o primeiro ano que o país tem representante na modalidade.

Curso: o Instituto de Estudos sobre a China da UFSC irá oferecer um curso online gratuito sobre a China e as Relações Internacionais. As inscrições abriram ontem (25). A nossa colega Aline Tedeschi vai ministrar uma das aulas.

A venda de um carro e uma treta: quando um anúncio de venda de um carro ganha contorno sobre a China se fechando para estrangeiros. Para entender melhor, vale ler o texto de Peter Hessler, autor de uma série de livros sobre o país asiático. 

Cerâmica: para lidar com os efeitos negativos da rápida urbanização da China no meio rural, o vilarejo de Yaoli retomou a tradição milenar da cerâmica e outros fazeres artísticos para atrair turistas e milhões de reais à região. A inovação às vezes está em olhar para o passado.

 

Recordar é viver: com o início das Olimpíadas de 2024 em Paris, fica difícil não se lembrar do show de abertura que rolou com a edição dos jogos em Pequim.

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