Foto noturna em cores de foco de incêndio em prédio cercado de andaimes.

Foto de Lai Man Nung via Unsplash.

Edição 375 – Incêndio em Hong Kong gera luto e  alerta sobre corrupção 

Política e economia

O maior incêndio de Hong Kong em 70 anos. Na tarde da última quarta-feira (26 de novembro), um incêndio foi detectado nos andares baixos de um prédio de 31 pavimentos no condomínio residencial Wang Fuk Court, no distrito de Tai Po. O fogo só foi extinto na sexta-feira (28), depois de atingir sete dos oito prédios de Wang Fuk Court e mobilizar mais de dois mil bombeiros. O número oficial de mortos na tragédia chegou a 151 pessoas e 63 animais nesta segunda-feira (1 de dezembro), mas ainda há dezenas de desaparecidos; estima-se que as buscas no condomínio, que tinha 4.600 moradores, ainda deva levar três semanas.

Causas e culpados. Na quinta-feira (27), o órgão local responsável pelo combate à corrupção iniciou uma investigação sobre o caso: Wang Fuk Court estava em reforma desde 2024, e o serviço contava com orçamento generoso; apesar disso, análises preliminares indicaram que plásticos e isopores altamente inflamáveis estariam sendo usados na obra, contrariando diretrizes de segurança – e barateando custos. Não era uma surpresa: a construtora responsável pela reforma já havia sido autuada por irregularidades em outros projetos e sua contratação para Wang Fuk Court havia causado protestos e denúncias de moradores havia mais de um ano. No mesmo dia, a polícia começou a prender executivos da empresa, totalizando 13 detenções até esta segunda-feira. O governo também suspendeu outras 28 obras da construtora, além de duas reformas de outras companhias que também estariam usando materiais inadequados. O secretário da segurança da cidade declarou que deve acelerar o projeto de eliminação do uso de bambu em andaimes (muito tradicional em Hong Kong), apesar da falta de evidências científicas para basear decisões sobre o assunto, reacendendo um vigoroso debate sobre a segurança do material em construções.

A sociedade civil. No sábado (29), Hong Kong iniciou três dias de luto oficial; milhares de cidadãos levaram flores para um memorial nas proximidades dos prédios afetados, prestando suas homenagens. Desde o incidente, diversas organizações civis coordenam a coleta e distribuição de doações, além da atuação de voluntários. As iniciativas não passaram despercebidos: no sábado, o Escritório de Salvaguarda da Segurança Nacional, um órgão de Pequim na cidade, declarou que agitadores “anti-China” estariam tirando proveito da tragédia e que apoiavam punições realizadas pelo governo local; o governo de Hong Kong anunciou que centralizará os esforços de apoio às vítimas a partir de uma plataforma online a ser criada nos próximos dias; e a polícia dispersou um posto de doações organizado por voluntários. No mesmo dia, o estudante Miles Kwan foi preso pela Polícia de Segurança Nacional da China sob acusação de sedição e, no domingo, o ex-conselheiro distrital Kenneth Cheung e uma voluntária também foram detidos pelo mesmo crime. Kwan é um dos organizadores de um abaixo-assinado pedindo uma investigação independente sobre as causas da tragédia, motivado pela percepção de que, ao reforçar a eliminação do uso de andaimes de bambu em construções, o governo estava desviando o foco das investigações. O documento, que coletou mais de dez mil assinaturas em seu primeiro dia, não está mais disponível online. Nesta segunda-feira, Kwan foi visto deixando a delegacia. O coletivo Lausan publicou um panorama das falhas da governança estatal sobre a construção civil de Hong Kong e de como a população pode contribuir para promover mudanças.

Internacional

Trump anunciou que vai a Pequim em abril e ainda convidou Xi Jinping para uma visita de Estado aos EUA até o fim de 2025, depois de uma “ligação muito boa” em que os dois falaram de Ucrânia, fentanil, soja e, claro, Taiwan, tema que ainda ferve por causa das declarações da nova primeira-ministra japonesa, Sanae Takaichi, sobre possível apoio militar à ilha. Enquanto a retórica gira em torno de “soberania”, “Segunda Guerra” e ameaças cruzadas entre China e Japão, o pano de fundo é bem menos simbólico e bem mais numérico.  Nas últimas duas décadas, a China tomou dos EUA a liderança comercial em boa parte do mundo e hoje é o principal parceiro de 141 países, contra 82 que ainda priorizam Washington, segundo levantamento da Folha de S. Paulo com dados da ONU e da OMC. Na prática, cada vez mais o mundo depende da infraestrutura industrial chinesa: baterias, painéis solares e contêineres, máquinas e eletrônicos. Enquanto isso, os EUA tentam administrar o paradoxo de ou disputar influência, impondo tarifas e sanções, ou manter boas relações com Pequim.

A tensão entre Japão e China não diminuiu muito desde o encontro do G20. Na semana passada, a representação chinesa na ONU falou que levaria a questão para discussão com o Secretário-Geral António Guterres, sob a afirmação de que o vizinho do leste asiático teria indicado ambições de intervenção pelos comentários, conta a Folha de S. Paulo. O presidente dos EUA, Donald Trump, falou por telefone com Xi Jinping e Takaichi, e tem quem diga que é o momento mais tenso da relação dos dois países na última década. O estadunidense teria dito para Takaichi baixar um pouco o tom. Para quem acompanha a história política da recém indicada primeira-ministra, os comentários não foram necessariamente surpresa, como mostra esta outra matéria da Folha.

As disputas diplomáticas entre Pequim e Tóquio dificilmente ficam só no discurso e há reverberações para as relações entre cidadãos, o turismo e principalmente na economia, com riscos de boicote de marcas quando os ânimos ficam mais nacionalistas, além de – claro – militarmente. Em 2012, a disputa vinculada às ilhas Diaoyu/Senkaku causou um alvoroço, com manifestações e boicotes pesados às marcas vizinhas.
Gui (china-india) > A tentativa recente de aproximação entre Índia e China ganhou um tropeço diplomático curioso. Pema Wangjom Thongdok, cidadã indiana nascida em Arunachal Pradesh, foi barrada por 18 horas no aeroporto de Shanghai na sexta-feira retrasada (21). O motivo? Seu local de nascimento. Para Pequim, Arunachal é “Tibete do Sul”; para Nova Délhi, território soberano, e a divergência, que costuma aparecer em comunicados militares no Himalaia, desta vez surgiu no balcão da imigração. A Índia chamou o episódio de “arbitrário”; a China insistiu que tudo seguiu “procedimentos normais” e reforçou que o estado “não existe”. O caso acontece justamente num momento em que os dois países vinham ensaiando um lento degelo, com retomada de voos, arranjos de patrulha e discursos de “parceria”. Mas, como sempre na relação sino-indiana, basta um carimbo para lembrar que certas fronteiras continuam mais simbólicas do que geográficas.

Sociedade

As múltiplas formas de maternar. Nem aqui, nem na China existe uma forma única de ser mãe. É isso que um recém-publicado ensaio fala sobre como mulheres chinesas estão lidando com um tema. O texto saiu no Made in China sob o título de “Caminhos para o Empoderamento da Maternidade na China Contemporânea”, 

As autoras exploram como mulheres grávidas adotam ao menos duas estratégias distintas de empoderamento. Enquanto um grupo opta por reivindicar apoio – envolvendo o parceiro nas consultas pré-natais, dividindo tarefas e transformando a gravidez num projeto compartilhado, um segundo escolhe afirmar sua independência, mantendo rotinas pré-grávida e recusando tratamento diferenciado. O texto fala como essas abordagens refletem não apenas decisões pessoais, mas também negociações íntimas com normas patriarcais profundas, num contexto marcado por pressões sociais, históricas e políticas. Ao reconstruírem o papel da mãe, desta vez como agente consciente, autônoma e negociadora de sua própria vida, essas mulheres estão contribuindo para a construção de um novo modelo de parentalidade mais igualitário e autodefinido. O que será que vem pela frente?

Zheng He

Publicidade: em mais um primoroso esforço de se adaptar à cultura local, a Nike lançou uma campanha com uma loja temporária em Guangzhou usando elementos cantoneses e com uma colher de sopa imitando o logo da empresa.

Legado: o South China Morning Post fez um compilado sobre como a cultura chinesa foi moldada pelas dinastias que controlaram o país por séculos. 

Master chef: para muita gente, uma cidade só é cosmopolita se a culinária de requinte está presente. Cada vez mais, chefs famosos abrem restaurantes fora dos seus países de origem – e com Shanghai não é diferente. Mas quantos se dão bem? É o que se pergunta este texto de Christopher St. Cavish. 

Fashion: entre tradição, diversidade cultural e inovação, esta reportagem recente do NYT mostra como a moda de Hong Kong está redefinindo o estilo urbano global.

 

segurança? Aquecimento em climas extremos? Este vídeo explica por que bebês são tão bem embrulhadinhos na Mongólia Interior.