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Edição 359 – Férias de verão do PCCh começam com foco na alta tecnologia

É temporada de praia pro PCCh. Bastou a aparição do chefe de gabinete de Xi Jinping em Beidaihe no último domingo (3) para que todo mundo entendesse o recado: começaram as “férias” de verão do Partido Comunista Chinês. De acordo com o noticiário local, acadêmicos e especialistas de indústrias de alta tecnologia se reuniram com Cai Qi, representante do comitê permanente do Politburo. O início das férias e um registro fotográfico da reunião foram divulgados pela imprensa estatal. O encontro anual no balneário de Beidaihe – a 300 km de Pequim, na província de Hebei— , é uma tradição do PCCh desde 1953, com uma interrupção apenas durante o período da Revolução Cultural.
Em meio à coleta de dados para o próximo plano quinquenal, a China estuda novas formas de aumentar o consumo doméstico. Uma matéria do South China Morning Post nesta semana trouxe sugestões de economistas para a criação de metas mais factíveis para o gigante asiático, entre elas a de vincular o consumo ao crescimento do PIB. A demanda interna é há mais de uma década o foco do governo chinês para a economia, depois de anos voltado para o mercado externo. Comentando a reportagem no X (ex-Twitter), o especialista em economia chinesa Michael Pettis explicou porque esse foco no mercado doméstico faz sentido como estratégia para manter o crescimento do PIB. O 15o plano quinquenal começou a ser preparado em dezembro de 2023 para guiar a economia chinesa de 2026 a 2030.
Um timing curioso. Os Estados Unidos lançaram seu AI Action Plan, com o objetivo de “vencer a corrida” da inteligência artificial, no dia 23 de julho. Três dias depois, a China lançou um plano para a governança global de inteligência artificial. Sem citar nominalmente os Estados Unidos, mas fazendo referência à guerra comercial, os 13 pontos foram anunciados pelo premiê Li Qiang, durante o World AI Conference, em Shanghai. A proposta chinesa foca em multilateralismo, cooperação global e vitórias conjuntas, critica a regulação dispersa pelo mundo e alerta para uma corrida pela IA que vai limitar tais desenvolvimentos a um pequeno grupo de países e/ou de empresas. No fim das contas, é uma chamada à ação para o Sul Global e a uma plataforma multissetorial de governança, bem como uma proposta para maior cooperação de mercados e investimentos em infraestrutura.

Brasil aumenta sua presença na China. De acordo com reportagem da Folha de S.Paulo nesta semana, o governo brasileiro está em busca de um novo imóvel para a embaixada em Pequim. Isso porque o posto ganhará adidos da Receita Federal e da Polícia Federal, além de novos representantes das Forças Armadas. Segundo um decreto publicado no dia 2 de junho, a China receberá um Oficial-General do Exército, um Contra-Almirante da Marinha, um Coronel da Aeronáutica, um Coronel ou Tenente Coronel do Exército e um Capitão de Mar e Guerra ou Capitão de Fragata. Assim, pela primeira vez, o Brasil passa a ter um oficial general como adido militar na China, equiparando a representação militar no país à que hoje tem em Washington, nos Estados Unidos, sua maior embaixada.
Guerra de cabides. Nem Milão, nem Roma. Prato, uma pequena cidade têxtil nos arredores de Florença, é a responsável pelo pulsante fast fashion europeu – por meio de mais de 5 mil pequenas confecções chinesas. Ironicamente, o lugar que já foi símbolo da etiqueta Made in Italy hoje é palco de uma guerra silenciosa entre grupos criminosos chineses. Eles disputam o controle da produção, transporte e logística de vestuário no continente, um negócio que gira em torno de 600 milhões de reais. Toda a questão na região é um emaranhado difícil de desfazer já que o “Sistema Prato”, como é chamado, é um nó político e social que envolve informalidade trabalhista, contrabando de tecidos, evasão fiscal e corrupção. Uma roupagem perfeita para um modelo difícil de se resolver a curto prazo.
Vai entender… Mesmo em meio a um desgaste político significativo, as empresas chinesas parecem cada vez mais dispostas a atravessar o Pacífico em busca do capital americano. Segundo uma matéria da Reuters nesta semana, mais de 30 companhias chinesas (principalmente pequenas e médias) abriram capital nos EUA em 2025 e, seguindo nesse ritmo, o total pode superar o recorde de 64 empresas que, no ano passado, venderam suas ações ao público pela primeira vez para captar recursos. No fim, dois fatores de mercado ainda parecem pesar mais que as tensões políticas: as barreiras domésticas mais rígidas impostas em 2023 e a possibilidade de obter avaliações de mercado mais altas, muitas vezes por meio de SPACs (Special Purpose Acquisition Companies), empresas já listadas em bolsa criadas apenas para adquirir outra companhia e, assim, permitir uma entrada mais rápida no mercado. É complexo, mas o pragmatismo fala mais alto, já que Wall Street ainda oferece melhor liquidez, mais velocidade e acesso a um pool de investidores que, por enquanto, Pequim não consegue igualar.

A creche está inclusa no pacote? Sim! Na última terça-feira (5), o governo chinês anunciou que a educação pré-escolar passará a ser gratuita em todo o país, começando já neste ano letivo (que lá se inicia no segundo semestre). A novidade complementa a nova política de subsídio familiar anual de 3.600 yuans por criança de até três anos, que mencionamos na semana passada, combinando a transferência direta de renda com a redução de custos fixos essenciais, ao mesmo tempo em que se combate a desigualdade de acesso à educação – um desafio agravado pelo fechamento de mais de 20 mil creches em 2024. Além de incentivar a natalidade, a política busca fortalecer o capital humano e reduzir o fosso urbano–rural, especialmente para famílias migrantes e em situação de vulnerabilidade.
Memórias à moda da casa. Entre trilhos e tigelas de chow mein, o projeto multimídia Sons & Daughters, da produtora e diretora sino-canadense Suyin Looui, reconstrói a memória da diáspora chinesa no Canadá por meio das histórias de cafés e restaurantes familiares. A iniciativa documentou 30 famílias de imigrantes chineses que transformaram vagões e estações ao longo da Canadian Pacific Railway em pontos de encontro cultural, onde sobrevivência, comida e construção de identidade se misturavam em uma receita única de registro do cotidiano. Looui fez os registros acompanhada de seu pai, que viveu a experiência de trabalhar, ainda adolescente, no restaurante fundado pelo avô após emigrar de Taishan, um vilarejo do Cantão, nos anos 1940. Juntos, eles percorreram o país três vezes para fotografar, entrevistar e compreender como esses espaços se tornaram marcos culturais da diáspora chinesa, capturando memórias, sacrifícios e legados deixados por quem construiu parte significativa da sua vida atrás de um balcão. Looui buscou capturar não só a gastronomia, mas o legado, as rotinas exaustivas e os sonhos transmitidos pelos imigrantes aos filhos e filhas. É possível conferir fotos e relatos (em inglês) neste site.

O retorno: Para quem já nos lia em 2019, falamos muito sobre a história de He Jiankui e a sua pesquisa genética que gerou dois bebês editados pela técnica CRISPR. As discussões éticas reverberaram pelo mundo científico e He foi condenado à prisão por três anos. Mas ele voltou – e agora adentrou na persona de influenciador.
Textão: No blog Developing Economics, o pesquisador Felipe Irarrazaval escreve sobre a geopolítica dos minerais críticos no Chile e como uma disputa com as chinesas BYD e Yongqing Technology demonstra os desafios das economias periféricas em capitalizarem esses recursos para as suas próprias industrializações.
Tão ruim que é bom? Com 170 milhões de visualizações, os episódios toscamente gerados por IA de 狐妖为我倾城 contam (mais ou menos) uma história que envolve a figura mítica Huli jing (uma raposa de nove rabos), humanos e… o Labubu? A Radii fez uma seleta com legendas em inglês.
Especial: A revista Gama escolheu a China como tema da sua edição semanal mais recente. Tem entrevistas, textos sobre cinema e dicas de artistas acessíveis para o público brasileiro.
Se você cansou de IA escrevendo poemas enquanto você tem que lavar louça, este time lapse de 432 robôs fazendo o trabalho duro vai te alegrar. Eles estão movendo um complexo de prédios históricos de 7.500 toneladas em Shanghai, a um ritmo de 10 metros por dia, para dar espaço para uma construção no subsolo do terreno.
