É hora de se comunicar melhor, diz Xi Jinping

A nossa editora sênior Talita Fernandes concedeu uma entrevista para uma matéria do Global Voices sobre a falta de jornalistas brasileiros na China e como isso afeta as percepções em cada um dos países.

Xi Jinping

O que Xi Jinping entende por “melhorar” a comunicação com o exterior? Em reunião do Politburo no último dia 31, Xi enfatizou a necessidade de mudar a forma como as mensagens sobre a China chegam ao exterior. Num primeiro momento, pode parecer que Pequim vai adotar uma postura diferente do que vem fazendo nos últimos anos — como mostra este relatório do Foreign Correspondents Club of China, o trabalho da imprensa estrangeira tem enfrentado um clima cada vez mais hostil. Mas quem ouviu com mais cuidado a fala do presidente diz que não é bem assim. Em uma introdução ao discurso traduzido, Adam Ni no China Neican indica que a mensagem não trata exatamente de uma tentativa de diálogo, mas de uma competição entre narrativas. Também recomendamos este texto do China Media Project, que trata do papel da propaganda do governo também para o público fora das fronteiras chinesas. Para quem quiser arriscar no mandarim, a Xinhua detalhou a fala de Xi. Algumas edições atrás, sugerimos um artigo sobre construir pontes entre a China e o Ocidente por meio da comunicação e da imprensa, então deixamos a dica aqui novamente.

Corrupção prescreve? Após quase uma década, a campanha de controle para coibir atos de corrupção no PCCh e nas empresas estatais,  parece ter ganhado nova força ao investigar casos que aconteceram há até 30 anos. Muitos dos protagonistas, como dá para imaginar, já são idosos com 70 anos ou mais, aposentados e, em alguns casos, falecidos. O exemplo mais recente foi a abertura de uma investigação sobre a indústria mineradora na Mongólia Interior. Como analisa Chun Han Wong para o The Wall Street Journal, o inquérito parece funcionar como uma grande mensagem para as demais províncias. Joseph Brouwer do China Digital Times partilha da mesma avaliação e mostra como a pressão tem funcionado para “incentivar” a autodelação, sob possibilidade de redução da pena.

Caso você queira saber mais sobre os casos de corrupção já investigados desde a ascensão de Xi, o professor Yuhua Wang da Universidade de Harvard compilou em um diretório público informações de mais de 20 mil pessoas indiciadas até hoje.

Se você usa o Instagram, é provável que já conheça a Shein. Caso esteja por fora, a Shein é uma empresa chinesa de e-commerce de fast fashion que ficou extremamente popular por vender para todo o mundo roupas e acessórios baratos voltados para a geração Z. Se deu tão bem que foi avaliada em 15 bilhões de dólares (cerca de 75 bilhões de reais), domina lojas de apps em 54 países e talvez abra capital em breve. Mas de onde ela surgiu? A Caixin fez uma investigação sobre a empresa, que resultou em duas matérias para assinantes, para entender como a sua ascensão a colocou à frente de marcas consolidadas do setor, como H&M e Zara. A parte 1 conta como seu modelo é baseado em exportação de fast fashion ainda mais rápida, incorporando tendências e produzindo quase em tempo real a partir de análise de dados. Já a parte 2 aborda a presença discreta da marca: com uma atuação meio “caixa preta” e funcionando por aplicativo e site para vender fora da China, pouco se sabe do funcionamento e modelo de negócio da empresa. O texto também aborda temas como os custos humanos e econômicos desse formato, conhecidos pelos críticos da fast fashion: trabalho precarizado e danos ambientais. A pauta também apareceu na The Wire esta semana.

O dia 4 de junho chegou, passou e pouco ficou se sabendo das manifestações. A data marca o dia do violento fim dos protestos na Praça da Paz Celestial, em 1989. Em Hong Kong, o Parque Victoria — epicentro tradicional da vigília — estava vazio, como mostra sequência de fotos da AFP. Embora algumas pessoas tenham tentado entrar no parque, policiais fecharam seu acesso. Outras formas de manifestação acabaram acontecendo na região administrativa: menos das comumente usadas velas surgiram ao redor do parque, mas as pessoas usaram a lanterna dos celulares; também ocorreu a limpeza de um monumento às vítimas do episódio. Uma exposição dedicada ao evento foi fechada após uma investigação indicar a falta de licenças necessárias, segundo matéria da Associated Press.

Como contamos na edição passada, houve a proibição do evento pelas autoridades e punição pela divulgação do mesmo. Netizens notaram que emojis com velas sumiram da parte “frequentemente usados” da rede social Weibo, conforme relata o site WhatsOnWeibo. Um editorial do jornal estatal Global Times comentou as críticas (especialmente vindas dos EUA), dizendo que a liderança do Partido salvou o país em um momento crítico.

 

Afinal, quando a China vai reabrir as fronteiras? Enquanto países europeus e os Estados Unidos falam em reabertura na segunda metade deste ano, o gigante asiático deve ter um ritmo mais lento para voltar a aceitar a chegada de estrangeiros. Na última semana, Zhang Wenhong, diretor do departamento de doenças infecciosas de Shanghai, indicou que isso deve acontecer só a partir do segundo semestre de 2022, após a aceleração da vacinação no país, que agora deve incluir também crianças e adolescentes. A China está com as fronteiras fechadas desde o início de 2020, na sequência do surgimento da crise na cidade de Wuhan. Hoje, apenas casos excepcionais têm direito a entrar no país.

Na edição passada, falamos sobre vacinação e controle da crise epidemiológica no país, mas este apanhado do SupChina merece leitura. Logo depois de publicarmos nossa última edição, a OMS aprovou a Coronavac para uso emergencial, a segunda vacina chinesa com aval do órgão que, no mês passado, chancelou o uso da Sinopharm.

Oi, aqui é o hacker. Maior compradora de carne bovina do mundo, a China deve ter seu abastecimento prejudicado devido ao ataque de um hacker à JBS. A cadeia de produção e distribuição de carne foi paralisada, como mostra esta reportagem da Bloomberg. No texto, a agência lembra que o frigorífico, que tem sua sede em São Paulo, é o principal fornecedor do produto ao país asiático. Até agora, não se sabe muito bem o que aconteceu, mas o FBI apontou a ação de um grupo russo como possível responsável. A mesma reportagem trata também sobre a preocupação de Pequim com a questão da segurança alimentar nacional. A empresa indicou que a invasão teve impacto em suas plantas na Austrália e nos EUA, mas não atingiu o Brasil.

Prenda-me se for capaz (de me ver): um recente relatório da Oceana aponta que centenas de frotas pesqueiras da China e de outros países têm “desaparecido” perto das águas nacionais da Argentina. A organização monitorou as atividades na região de janeiro de 2018 até abril de 2021 e constatou que alguns navios simplesmente sumiam do radar por mais de 24 horas — fato ocorrido por mais de 600 mil horas no período analisado. Desses sumiços, 66% foram realizados por navios chineses, revelando um possível desligamento de instrumentos de rastreabilidade. A suspeita é que as frotas tenham cruzado as Zonas Econômicas Exclusivas (ZEE) nesses intervalos não rastreados para capturar, via pesca ilegal, lulas, camarões e outras espécies lucrativas. O governo argentino ainda não se pronunciou.

Saiu o relatório de 2020 do Novo Banco do Desenvolvimento, o NDB. Conhecido como “Banco dos BRICS”, começou sua atuação em 2015 e atualmente está sob a presidência do brasileiro Marcos Troyjo. O relatório apresenta as ações do banco em meio à pandemia, indicando projetos específicos de financiamento para combate à Covid-19. Com uma análise também desses primeiros cinco anos de vida, serve de boa bibliografia naquela leitura com café ou chá.

ONGs chinesas no exterior é o tema da pesquisa de Ying Wang que escreveu para o People’s Map of China um texto sobre a história e a atuação recente dessas organizações. As ONGs chinesas começaram a marcar presença fora do país há cerca de 15 anos e algumas já ganham destaque, como a Fundação Alibaba. Na sua pesquisa, compilada e acessível nesta base de dados, Wang já mapeou cerca de 700 doações/projetos para mais de 100 países, realizados por 130 organizações. Com destaque na vizinhança chinesa, questões transfronteiriças são uma prioridade. Outros temas apontados pela pesquisadora são a legislação chinesa, que surgiu apenas recentemente no processo de criação e regulação dessas ONGs, e a dificuldade de financiamento.

Depois da tragédia em Gansu, a China proíbe esportes extremos. O governo chinês anunciou na última terça-feira (1) a proibição de esportes extremos, numa resposta ao fim trágico de uma supermaratona na província de Gansu, em maio, que resultou em 21 mortes. Por enquanto, estão proibidas atividades como corrida em trilhas, caminhadas no deserto e ultramaratonas. De acordo com as autoridades, as atividades permanecerão suspensas até que sejam estudados padrões e protocolos de segurança.

Uma mulher transsexual é a mais nova embaixadora da marca Dior na China. Jin Xing, coreógrafa, apresentadora de TV e ex-dançarina do Exército de Libertação Popular vai ser a representante da fragrância Dior J’adore no país. Em um vídeo (em mandarim) para a marca de luxo, Jin fala sobre empoderamento feminino e tem sido bem recebida pelo público. Apesar do feito e do tamanho da pink economy por lá, não se pode esquecer do estado de direitos de pessoas transsexuais no país: como já comentamos em um artigo exclusivo no nosso site, a comunidade transsexual (que chega a 4 milhões) sofre com a falta de políticas de inclusão em escolas, locais de trabalho e dificuldades para ter acesso a documentos básicos. Para as pessoas transexuais que desejam realizar a cirurgia de afirmação de gênero, o caminho é repleto de requerimentos que ilustram a falta de autonomia da comunidade. A transsexualidade ainda é considerada uma doença mental na China.

Como tragédias nacionais podem ser usadas para fortalecer uma ideia de nacionalismo? Em um texto para o Made in China Journal, digno de um bom cafezinho, Kailing Xie e Yunyun Zhou tentam responder essa pergunta analisando a série Heroes in Harm’s Way (最美逆行者), um drama sobre a eclosão do novo coronavírus em Wuhan. As pesquisadoras explicam como produções desse tipo — junto com premiações, cerimônias e matérias de jornais — fortalecem o que é conhecido como o “nacionalismo do desastre”, e mostram como isso já vem sendo trabalhado desde o terremoto de Sichuan, em 2008. Esse tipo de nacionalismo glorifica pessoas comuns que abdicam de desejos pessoais para servir o país e fortalecem o ideário da superioridade do socialismo com características chinesas.

Para que lutar, se você pode desistir? Essa é a grande ideia por trás do neologismo tang ping (躺平), uma palavra que tem dado o que falar em fóruns de discussão online e que se soma à ideia de “involution” (que abordamos aqui). O termo pode ser traduzido como “ficar deitado” e, mais do que uma ode à preguiça, tang ping representa uma juventude chinesa que está exausta de trabalhar tanto e colher poucos frutos de tamanho sacrifício. Trata-se de uma geração que não vê sentido à devoção total ao trabalho, já que é quase impossível comprar uma casa ou um carro com as economias que possui hoje. No lugar disso, o termo que tem ganhado popularidade na China preza pelo tempo de descanso e por curtir a vida. A hashtag #tangping tem sido sumariamente censurada online e criticada por mídias estatais, que enxergam nela um elogio ao ócio irresponsável e improdutivo.

reforma electoral en Hong Kong

Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.

Feminismo: assista este imperdível documentário de 15 minutos sobre feminismo contemporâneo na China. Com legendas em inglês, traz entrevistas com algumas das pessoas envolvidas no episódio das “Cinco Feministas”, sua atuação no país e fora dele. Para quem quiser uma leitura mais acadêmica, a tradução do texto de Chang Yiting e Yang Xia sobre discurso feminista no contexto chinês é a dica da vez.

Livros: a Ilustrada, da Folha, publicou uma matéria sobre livros asiáticos que devem chegar ao mercado brasileiro. São poucos chineses, mas vale destacar que em breve ganharemos edição da trilogia Condor, do famoso escritor de artes marciais Louis Cha/Jin Yong (que faleceu em 2018).

Música: hora de botar as pernas para cima e relaxar ao som do R&B de 何夏XiA. Aumenta o som!

Entrevista: a especialista Lillian Li falou sobre tecnologia chinesa para o The Wire China — e ficou bem interessante. Vale a leitura e a reflexão sobre pensar a tech do país no seu próprio contexto.

 

Não temos nada
“Não ter nada/não temos nada” – É também o título de uma música tradicional chinesa de Cui Jian e que se tornou o hino não oficial das manifestações de 4 de junho. Ouça.

%d blogueiros gostam disto: