Fotografia em cores de céu azul visto a partir da base da área vazada de um prédio. O prédio é fechado dos quatro lados.

Foto de Chor Tsang via Unsplash

Edição 266 – Evergrande e Country Garden elevam risco da economia chinesa

Vacinas chinesas e gigantes de tecnologia na China

O mercado não tá para imóveis. Enquanto a cadeia de comando do PCCh tira as tradicionais e anuais férias em Beidaihe, o noticiário econômico não dá folga. Logo depois de ter anunciado a retomada das negociações na Bolsa de Hong Kong, a Evergrande viu seu valor de mercado despencar, com perdas de HK$11,6 bilhões (R$ 7,48 bilhões). A crise no setor não para por aí e agora a Country Garden, maior incorporadora privada do país, corre risco de ir à falência. Além de ter perdido valor, a companhia acumula em torno de US$ 200 bilhões em débitos (cerca de R$ 998 bilhões). A notícia criou um temor de que uma crise possa prejudicar a economia chinesa, e até se espalhar pelo mundo. O JP Morgan elevou o risco de calote de economias emergentes, que podem ser afetadas se as dívidas da gigante imobiliária não forem honradas. Enquanto isso acontece, o setor de tech tem se movimentado no sentido contrário e acumulou ganhos recentes, como mostra o Asia Times.

Reconhecimento facial na mira. A Administração do Ciberespaço da China, órgão que regulamenta a internet no país, abriu para consulta pública o rascunho de regras para restringir o uso de tecnologia de reconhecimento facial em território nacional. Com 25 artigos, a proposta proibiria o uso dessa tecnologia como forma de verificação de identidade em bancos, hotéis, aeroportos, bibliotecas e estabelecimentos comerciais, a não ser que seja exigido por lei e, nesse caso, sistemas nacionais de reconhecimento facial devem ser utilizados. Como explica Evelyn Cheng para a CNBC, o reconhecimento facial pode ser usado atualmente para realizar pagamentos em algumas lojas, estações de metrô e para entrar em prédios e campi universitários. 

As regras propostas também estabelecem que essa tecnologia somente deve ser usada quando outros métodos de verificação de identidade não-biométricos não forem suficientes e que é necessário obter consentimento e declaração de fim específico do uso dos dados coletados. Chama atenção o artigo 11, que preconiza que nenhuma organização ou indivíduo pode usar a tecnologia de reconhecimento facial para obter dados relacionados a raça, etnia, religião, classe social e demais dados sensíveis. A consulta pública está aberta até sete de setembro e o rascunho da proposta (em chinês) pode ser lido aqui. Uma tradução para o inglês foi disponibilizada pelo China Law Translate.

Não é só no Brasil que militares se metem em escândalos. O governo chinês anunciou, no fim de julho deste ano, a substituição de oficiais de alta patente no comando da Força de Foguetes do Exército de Libertação Popular (ELP), no que a DW descreveu ser a maior dança de cadeiras militar desde a chegada de Xi Jinping ao poder. O anúncio não ofereceu muitas explicações, o que levou a especulações — segundo hipótese levantada pelo South China Morning Post, o general Li Yuchao e o alto comando da força estariam sob investigação por corrupção e por isso teriam sido afastados. No The New York Times, Chris Buckley comenta que, se confirmado, um caso de corrupção nas forças armadas envolvendo o alto comando seria uma grave mancha no governo Xi, que desde 2013 vinha combatendo o antigo problema de desvios por parte de militares. Contudo, a opacidade da decisão abriu espaço para diversas conjecturas envolvendo disputas políticas internas, sobretudo pela marcada semelhança com o caso de Qin Gang.

Como a Força de Foguetes é responsável pelo arsenal nuclear e o sistema de mísseis da China continental, surgiu o temor que a troca de comando sinalizasse uma mudança de postura com relação a Taiwan — especialmente no contexto do lançamento de um documentário sobre a capacidade militar do ELP já ser suficiente para reconquistar a ilha. No entanto, especialistas ouvidos pela DW apontam para a baixíssima probabilidade disso acontecer.

Divergências sino-americanas em alta. A “guerra fria” entre China e Estados Unidos ganhou novos capítulos nos campos econômico e político-militar. Dando sequência ao movimento de conter o avanço chinês na área tecnológica, Joe Biden lançou novas regras na semana passada, limitando o investimento do país em indústrias sensíveis chinesas. Na sequência, durante viagem a Utah, o presidente estadunidense chamou a economia chinesa de “bomba relógio”, afirmando que as dificuldades de crescimento e as taxas de desemprego enfrentadas pelo gigante asiático devem afetar o mundo todo. Para se aprofundar mais no movimento dos EUA em conter o avanço chinês em tecnologia, vale conferir esta edição da newsletter China AI. 

Não bastasse a divergência no campo dos negócios, a área militar e de espionagem também foi foco da estremecida relação entre as duas maiores economias do globo. Apenas este mês, o governo de Pequim prendeu um trabalhador chinês, parte de um grupo industrial militar, suspeito de fazer espionagem para a CIA e deteve integrantes da marinha sob acusações de espionagem. Em meio a isso, mostra o The New York Times, os EUA estão atrás de um malware chinês que poderia interromper ações militares estadunidenses — inclusive em um eventual conflito com Taiwan. Ainda na conta das tensões militares, O Asia Times mostra que cientistas do gigante asiático podem ter avançado na detecção de submarinos que circulem no disputado e conflituoso Mar do Sul da China. 

Investimentos chineses em energia renovável triplicaram na América Latina. Entre 2018 e 2022, o total dos aportes subiu de 960 milhões para 3,8 bilhões de dólares, e mais da metade foi direcionada para inversões greenfield, isto é, novos projetos e construções do zero. Esse foi o resultado de uma pesquisa do IPEA publicada em julho, que destaca que Brasil, Argentina, Colômbia, México e Chile são os destinos preferenciais. Exemplo dessa crescente presença de empresas chinesas no setor por aqui, a atuação da CTG Brasil, subsidiária brasileira da China Three Gorges International, tem sido tema tanto por recuar na sua decisão de fazer uma oferta pública inicial de ações na bolsa quanto por questões de racismo e assédio envolvendo funcionários terceirizados.

Pisando no freio. Após o golpe de Estado ocorrido no Níger em 26 de julho, a China Gezhouba Group Co. Ltd. optou por suspender a construção da hidrelétrica de Kandadji, que seria a primeira usina do tipo no país da África Ocidental. Como apura Kelly Wang para o Caixin Global, o golpe levou a diversas sanções financeiras de importantes atores internacionais, como União Europeia, Banco Mundial e Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental, afetando fundos essenciais para a construção. A hidrelétrica de Kandadji, com custo previsto de 800 milhões de dólares, é um projeto da Iniciativa Cinturão e Rota e seria concluída em 2025. A China é a segunda maior investidora no Níger, ficando atrás apenas da França. Além de hidroenergia, a China também investe em urânio, do qual o país africano é um dos maiores produtores do mundo.

Dez anos no Tibete. A organização International Campaign for Tibet, sediada nos Estados Unidos, lançou na semana passada um relatório avaliando os dez primeiros anos das políticas de Xi Jinping sobre a região. Segundo a análise, a década trouxe um controle mais reforçado da região autônoma, inclusive por meio de tecnologias como reconhecimento facial e coleta massiva de DNA, e um crescente foco na sinização do povo como parte de uma visão de “nação chinesa”, às custas do apagamento da identidade tibetana. Especial atenção é dada por Pequim à “harmonização” do budismo tibetano, em oposição ao budismo reconhecido na China continental, a estratégias de apagamento linguístico e ao foco na educação nacionalista.

A crise dos jovens. Sem relatório, não há crise. O governo chinês decidiu suspender a divulgação de relatórios mensais sobre o desemprego entre jovens após sete meses consecutivos de aumento na taxa, que atingiu um recorde de 21,3% em junho. A decisão levantou preocupações sobre transparência, a falta de informações legítimas sobre o país e as consequências disso para investidores. Sem perspectivas, alguns desses jovens adultos estão sendo contratados por seus próprios pais para se tornarem “filhos em tempo integral”, pagos para realizar tarefas domésticas, cuidar de parentes idosos e preencher lacunas nas responsabilidades familiares. Aqueles que não conseguem esse “auxílio” dos pais estão recorrendo a uma nova tendência orçamentária: dividir camas com estranhos para aliviar o custo do aluguel, como conta o SCMP.

reforma electoral en Hong Kong

Para ver com calma: o China Heritage traz uma seleção de podcasts e vídeos no Youtube para quem quer saber mais sobre China. Aproveite aquela viagem demorada ou aquela espera na sala do dentista para se atualizar. 

Convenção gamer: a ChinaJoy, convenção anual de gaming, completou 20 anos de existência em 2023, e a Radii publicou uma lista dos principais destaques.

Ritmo de veraneio: a estação mais quente do ano se aproxima do fim no hemisfério Norte, mas ainda dá tempo de se imaginar no calor (se você estiver no hemisfério Sul, abaixo do Trópico de Capricórnio), abrir a lista do Radii e ouvir os lançamentos musicais chineses do verão de 2023. 

Chocolate: quem diria que inserir o doce ultrapopular na China foi um desafio tão grande? Um calendário de 1915 é o ponto de partida para o fio que traça essa história.

Mídia chinesa. Como entender o People’s Daily, o jornal oficial do Partido Comunista Chinês? É essa a missão que o pesquisador indiano Manoj Kewalramani escolheu em sua newsletter Tracking People’s Daily. Vale ler a entrevista que ele deu para Jonathan Landreth no The China Project, em que ele explica as nuances e estratégia midiática do jornal.

Podcast: depois de ouvir o nosso podcast, confira duas dicas de documentários deixadas pelo nosso entrevistado, Felipe Alberto: As Crónicas de Wu Li No Colégio De S. Paulo, sobre o poeta Chinês e sua relação com as famosas ruínas de Macau, e The story of Matteo Ricci in China, sobre o cientista responsável por estabelecer as primeiras relações entre China e Itália. Vale conferir também as indicações bibliográficas da conversa, disponíveis na descrição do episódio no seu agregador preferido.

 

Essa é a mistura do Brasil com… Taiwan. E Hong Kong. O vídeo não é novo, mas vale assistir pra aprender sobre essas relações transcontinentais que permitiram a existência do boba — por aqui, conhecido como bubble tea.

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