Fotografia em cores de estrada sinuosa em meio a árvores na China

Foto de Justin Ackison via Unsplash.

Edição 293 – As Duas Sessões e a rota do crescimento chinês

Vacinas chinesas e gigantes de tecnologia na China

Duas Sessões. Já se passaram duas semanas, mas o evento político mais importante do ano na China continua a reverberar. O think tank MERICS publicou uma análise sobre as decisões tomadas pelo Congresso Nacional Popular (NPC, sigla em inglês) chamando atenção para um desequilíbrio entre a ambição do governo e uma falta de medidas concretas para lidar com uma série de problemas afetando a economia do país—olhando demais para o futuro sem fazer a lição de casa. A análise também destacou duas medidas que apontariam para um endurecimento e falta de transparência do governo: o fortalecimento do papel do PCCh na tomada de decisões sobre políticas públicas e o cancelamento da coletiva de imprensa ao final do evento—uma tradição que vigorava havia 30 anos.

Já o impacto das duas sessões sobre as políticas climáticas foi analisado por Lin Zi e Cui Qiwen para o China Dialogue. No cerne de uma estratégia para a transição rumo a uma economia mais verde estão o levantamento de dados mais precisos sobre emissões de carbono, uma aposta em novas tecnologias, adoção de medidas para a redução da intensidade energética do país e a consolidação das políticas de controle e melhora do ar.

De novo, o TikTok. O que significaria uma proibição do aplicativo chinês nos Estados Unidos? O Hong Kong Free Press relembrou que esse já é o caso na cidade, onde a versão internacional do app foi banida em 2020 no contexto da aplicação da Lei de Segurança Nacional, e indica o que os estadunidenses podem esperar. Já esta análise geopolítica do jornalista Paris Marx traz o ponto de vista de que o banimento seria uma forma de manter o poder tecnológico dos EUA. Complementar a este texto, vale a leitura desta resenha do recém-lançado livro The Fear of Chinese Power: An International History, que fala sobre o temor que o Ocidente tem em relação à China. A proibição do Tik Tok nos EUA ainda é tema em aberto, mas a ByteDance, detentora do app, já se prepara para diversificar seus negócios retomando o setor de games.

Foi aprovada por unanimidade na terça-feira (19) a Lei de Segurança Nacional de Hong Kong. Conhecida como Artigo 23, ela entra em vigor em 23 de março, trazendo penas que podem chegar à prisão perpétua para os crimes de traição, insurreição, sabotagem, interferência externa e roubo de segredos de estado e espionagem. Residentes entrevistados pela BBC ressaltam a insegurança causada pelo texto abrangente da lei e os desafios que ela representa para o papel que Hong Kong tinha como conexão da China com o restante do mundo. Já a CNN tentou coletar a opinião de cidadãos que circulavam em público — obviamente, ninguém topou falar sobre o assunto diante da câmera. Nas redes sociais, a diáspora honconguense relembrou os 20 anos de manifestações populares contra a implementação do Artigo 23.

Propaganda. Os Estados Unidos passaram a realizar uma campanha clandestina de difamação da China em redes sociais, chinesas e de outros países, a partir de 2019, conforme reportagem exclusiva da Reuters. Segundo três funcionários do governo estadunidense ouvidos pela agência, o então presidente Donald Trump autorizou ações encobertas da CIA para tentar jogar a opinião pública contra o governo Xi e para semear a paranoia entre as lideranças políticas do país asiático. À reportagem, representantes de Pequim afirmaram que esse vazamento apenas confirma que Washington transforma redes sociais e espaços de debate público em armas para disseminar informações falsas e manipular a percepção global sobre a China. Em editorial duro, o China Daily afirmou que o conteúdo da reportagem não surpreende e apenas evidencia que os EUA são a verdadeira fonte da desinformação no âmbito global.

Tráfico de mulheres no leste asiático. As autoridades das Filipinas aumentaram o alerta sobre o tráfico de mulheres para a China como noivas por encomenda. A prática tem sido rastreada através de mulheres filipinas interceptadas tentando deixar o país com chineses que se passam por seus maridos, inclusive apresentando certificados de casamento aparentemente genuínos. As investigações chegaram à conclusão de que esses certificados de casamento estariam sendo emitidos por grupos criminosos. O texto de Sam Beltran destaca como o aumento dos investimentos chineses em jogos de azar nas Filipinas pode estar ligado ao fenômeno.

Angola. No dia 15 de março, o presidente chinês Xi Jinping realizou uma série de reuniões e cerimônias com o presidente da República de Angola, João Lourenço, em Pequim. Durante esses encontros, os dois líderes anunciaram a elevação das relações bilaterais para uma parceria estratégica cooperativa. Ambos concordaram em fortalecer a cooperação em áreas como infraestrutura, comércio, agricultura e desenvolvimento verde e, após os encontros, foram assinados acordos em várias dessas áreas, incluindo o plano de cooperação do Cinturão e Rota.

Enquanto, de um lado, as relações sino-africanas se estreitavam, do outro, a União Africana anunciva o fim da exportação de pele de burro para a China. Pode parecer algo sem maiores consequências, porém se trata de uma proibição de 15 anos às exportações dos animais que de imediato afetou grandes empresas que trabalham com Medicina Tradicional Chinesa.

A resistência digital na China tem se manifestado e achado brechas para expressar opiniões e críticas através das redes sociais e da internet de maneira bastante engenhosa. O China Books Review criou um léxico para agrupar todos os memes, ironias e sátiras usadas para burlar as vigilâncias mais duras, mas sem perder a graça. A China Digital Times fez um trabalho semelhante no ano passado, lançando um e-book contendo mais de 104 dos termos que ganharam força pelas redes na época, desde slogans oficiais até gritos de protesto.  

O céu é o limite. Depois dos batons, da educação, dos vegetais e dos empregos, chegou a vez dos imóveis. A Rest of World conta agora como agentes imobiliários estão usando aplicativos como o Douyin (a versão nacional do Tik Tok) e o concorrente Kuaishou para conquistar clientes e apresentar os imóveis disponíveis. Sim, na China é preciso ter uma veia influencer até para atuar no mercado imobiliário com sucesso entre os mais jovens. E não é pouco sucesso: a cidade litorânea Xishuangbanna, na província de Yunnan, propagandeada como Tailândia chinesa, viveu em 2023 um boom imobiliário atribuído aos apps. Em pleno mercado desaquecido, 80% dos compradores eram de outras cidades.

reforma electoral en Hong Kong

Lifestyle: a newsletter Chinarrative fez um apanhado de artigos que exploram mudanças no estilo de vida chinês causadas pelo desaquecimento econômico de 2023. 

Opinião: a Sinification publicou a tradução para o inglês de um artigo de opinião escrito por Wang Xiangsui, coronel da aeronáutica chinesa, argumentando pelo estreitamento de laços com a Rússia.

Perspectivas: este artigo acadêmico explora a história das jiashu, dependentes de trabalhadores de fábrica que ficaram esquecidas nos estudos sobre o papel heroico da mulher socialista chinesa.

 

Desde o final de fevereiro, a emissora estatal China Media Group exibe Qianqiu Shisong, uma animação totalmente criada por meio de inteligência artificial. Seus 26 episódios são baseados em textos tradicionais chineses.

 

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