Edição 319 – Criança japonesa esfaqueada na China acende debates sobre nacionalismo

Vale tudo. Na sequência de ações para tentar impulsionar a economia chinesa, o Banco Central da China (BoC, na sigla em inglês) anunciou a redução das taxas de juros, tornando mais barata a tomada de crédito. As medidas incluem a diminuição de juros de curto prazo e também se aplicam para empréstimos já existentes para fins de compra de imóveis. Além disso, o BoC também passa a autorizar que bancos estatais emprestem mais ativos para iniciativas comerciais. O dirigente da instituição disse em entrevista coletiva que bancos poderão liberar ainda mais crédito em caso de necessidade. O anúncio veio acompanhado de uma fala de Xi Jinping após uma inesperada reunião do Politburo. O presidente fez um apelo para que integrantes do governo ajudem empresários a aquecer a economia. Xi pediu que autoridades não tenham medo de errar ao tentar inovar e estimular mais atividade econômica. Vamos ver se agora vai.

Meu emprego, minha vida. Na última quarta-feira (25), o governo chinês anunciou um pacote de 24 medidas para aquecer o mercado de trabalho. A ideia é promover a empregabilidade de “alta qualidade” com o desenvolvimento de novas profissões e encorajando o empreendedorismo, além aumentar a supervisão estatal sobre o assunto. Um dos pontos de maior preocupação é o desemprego entre trabalhadores de 16 a 24 anos, que chegou a 18,8% em agosto – dois meses antes, o número era 13,2%. A Sixth Tone indica que uma medida recente relacionada às ambições do governo foi a redução da oferta de cursos que não “contribuem para o desenvolvimento econômico e social”– só neste ano, 1.670 graduações foram encerradas.

Multiplicando peixes? De olho na segurança alimentar e metas de sustentabilidade, a China tem apostado em cheio na aquacultura – fazendas marinhas ou terrestres para a produção de peixes, camarão e outras espécies em cativeiro. Pequim lidera uma tendência mundial de reduzir a exploração da pesca comercial, com uma série de incentivos que misturam regulações para limitar a pesca na costa chinesa (impostas desde 2003), além de medidas estratégicas para coibir a expansão da pesca em alto mar, como conta Xie Ruohan para o Dialogue Earth.

Questões econômicas ou de segurança nacional? Em nova investida contra a China, o governo de Joe Biden acaba de propor que softwares chineses sejam banidos de veículos em circulação nos Estados Unidos. De acordo com o The New York Times, a Casa Branca contabilizou poucos casos em que isso acontece atualmente, mas fez um apelo para que haja cautela, alegando riscos para a segurança nacional. O governo nega qualquer intenção econômica com a medida – mas a decisão vem poucos meses depois de Washington ter anunciado tarifas de 100% para carros elétricos chineses. 

Arriscando a vida. Não é só no Estreito de Darién, no Panamá, que grupos de imigrantes chineses têm cruzado a fronteira sem visto. Os Balcãs tem virado uma nova rota para os que desejam, a duras penas, construir uma vida na União Europeia. Diferentemente de imigrantes oriundos de países assolados por guerras, condições financeiras precárias ou mesmo motivados por desastres ambientais, os chineses que têm arriscado a vida em uma longa jornada partem por razões políticas, como relata a jornalista Amy Hawkins que conversou com esses grupos na cidade de Bihac, na Bósnia. Vale passar um cafezinho e aproveitar a leitura.

Um ataque a um estudante japonês desencadeou uma série de discussões sobre o nacionalismo crescente na China – que frequentemente vem acompanhado de sentimento antijaponês. Em Shenzhen, no dia 18 de setembro, uma criança japonesa de 10 anos foi esfaqueada por um homem adulto chinês. O ataque aconteceu pela manhã, em frente à Escola Japonesa de Shenzhen, onde o menino estudava. Ele era filho de pai japonês e mãe chinesa, e faleceu devido aos ferimentos. As autoridades locais disseram que foi um incidente isolado, mas outros ataques a estrangeiros ocorreram no país nos últimos meses. Empresas japonesas, como Toshiba, Panasonic e Toyota, avisaram seus funcionários japoneses para ficarem vigilantes, aumentaram protocolos de segurança e até ofereceram a opção de retorno para o país de origem. O primeiro-ministro do Japão Fumio Kishida cobrou respostas de Pequim sobre o ataque, visto que as motivações não foram divulgadas pelas autoridades.

Coincidência ou não, o ataque ao menino ocorreu no dia do aniversário do Incidente de Mukden de 1931 – quando uma explosão forjada pelo Japão na sua linha ferroviária na Manchúria gerou uma onda de violência e foi a justificativa para a invasão e posterior ocupação do território chinês por forças japonesas.

Mas e o fulaninho? A Wired conta como anda o processo de defesa do TikTok nos Estados Unidos – como contamos em abril, sob acusações de espionagem e manipulação política, a Byte Dance recebeu um prazo de nove meses para vender seu aplicativo. Segundo a reportagem da Wired nesta semana, uma das estratégias dos advogados da empresa tem deixado outros apps chineses em maus lençóis: a defesa alega que a legislação estaria sendo injusta ao focar apenas no TikTok, visto que outros aplicativos, como o Temu e Shein, coletam tantos dados quanto o seu, mas seguem em uso normalmente. Assim, seria possível afirmar que a legislação teria sido desenhada para afetar diretamente (e punir) o TikTok. O argumento visa fortalecer a ideia de que o banimento do app e a obrigação de vendê-lo a uma contraparte dos EUA tem a ver com uma violação da liberdade de expressão (Primeira Emenda) e não com preocupação acerca da proteção de dados. É incerto se vai colar ou não, mas definitivamente coloca os colegas no holofote.

Fotografia: vale conhecer o trabalho do casal Liu Ke e Huang Huang. Entre 2016 e 2018, eles fotografaram um ao outro todos os dias – em meio a uma crise no casamento.

Olhando: o think tank alemão Mercator lançou o China Tech Observatory para acompanhar políticas e o desenrolar de seis áreas chave, incluindo semicondutores, IA e tecnologias verdes.

Apoie a tia: este texto da Sixth Tone conta sobre os elogios ao filme Like a Rolling Stone, que estreou dia 19 nos cinemas chineses. A história é baseada na vida de Su Min, uma mulher de 59 anos que se separou e saiu a viajar por aí. Já contamos sobre ela por aqui.

Nesta semana, a geralmente bem-sucedida Diplomacia do panda virou notícia porque a Finlândia anunciou que vai devolver dois pandas emprestado pela China oito anos antes do prazo, alegando que os custos de manutenção são muito altos. O South China Morning explica neste vídeo como funciona essa forma de diplomacia.