Pela agilidade e pujança em se reerguer, a China vinha, até então, sendo vista como a grande história de sucesso econômico frente aos desafios impostos pela pandemia da COVID-19. Um indicador, porém, preocupa analistas. Em 2020, o nível de consumo do país já ficou aquém do desejado, registrando retração de 3,9% em comparação ao ano anterior. Agora, dado o recente surto do novo coronavírus registrado no noroeste chinês e as medidas de contenção que imediatamente se seguiram, a expectativa é de que a tendência negativa se mantenha, já que esse período coincide justamente com o Ano Novo Lunar — época em que tradicionalmente centenas de milhões de chineses viajam e alavancam as vendas no país.

E as preocupações não se limitam ao consumo: Hebei, a província atingida pela nova onda do vírus, é também uma das principais regiões siderúrgicas do gigante asiático. Para dar dimensão ao problema, a China é a maior produtora de aço do mundo, e Hebei corresponde a aproximadamente 20% de toda a produção do insumo no país. Mudanças imediatas são pouco prováveis, mas no médio prazo a relação entre oferta e demanda do material — assim como das commodities necessárias para sua produção — pode se alterar significativamente a depender do desenvolvimento da presente situação.

Uma das maiores startups do mundo, a ByteDance, anunciou na semana passada mais um passo em seu processo de expansão: o lançamento de um sistema de pagamento integrado ao Douyin, o TikTok chinês. Os usuários poderão, agora, usar o sistema para fazer pagamentos pela plataforma, incluindo itens vendidos pelos próprios influenciadores da rede. Concomitantemente, porém, o Banco Central chinês afirmou que pretende intensificar medidas antitruste direcionadas a empresas no setor de pagamentos não-bancários. Por enquanto, os principais alvos seriam nomes como o Alipay, do Ant Group, e o Wechat Pay, da Tencent. Com o novo anúncio, porém, a ByteDance também entra na lista, que é observada cada vez com mais cuidado pelas autoridades chinesas.

OFO, Luckin Coffee e Yongcheng Coal: o que essas três empresas têm em comum? Apesar de já terem sido as queridinhas do mercado financeiro em algum momento, todas elas entraram em inadimplências sucessivas – muitas vezes logo após terem recebido um bom parecer por agências de classificação. Mas como essas avaliações foram capazes de cometer tamanho equívoco?

Para Zhang Yuzhe e Guo Yingzhe, há duas grandes explicações para esse fenômeno. A primeira diz respeito a falhas estruturais no mercado de títulos, que inclui intervenções excessivas e corrupção de reguladores. Temerosas de serem vistas como causadoras de riscos no mercado financeiro, as agências frequentemente só alteram as classificações após autorização de um regulador do governo. A segunda explicação é sobre o funcionamento do sistema interbancário no país, que faz ajustes generosos em suas regras para atrair mais emissões de títulos.

Brasil, China e a vacinação. O número de pessoas contaminadas e mortas pela COVID-19 cresce diariamente no Brasil. Uma esperança apareceu com o começo da vacinação, no dia 17 de janeiro. Contudo, em meio ao caos nos hospitais, há caos também na única solução para o longo prazo: a vacina. Após tantos meses de farpas e comentários negativos por parte de membros do governo brasileiro, o Ministério da Saúde e o Ministério das Relações Exteriores se veem numa disputa diplomática com sérias consequências. Os insumos da CoronaVac, produzida em parceria entre a Sinovac e o Instituto Butantan, precisam ser importados da China e há dificuldade em liberar seu envio.

Houve especulação, ainda não comprovada, sobre pressão chinesa para demissão do chanceler brasileiro Ernesto Araújo (Pequim teria se recusado a negociar com ele). A notícia gerou controvérsia entre especialistas brasileiros — dentre os que acreditam ser possível e os que enxergam o acontecimento como bastante improvável. Mas, de fato, parece haver um gelo entre as autoridades: Bolsonaro teria tentado ligar para Xi Jinping, ainda sem sucesso. O governo brasileiro afirma que os entraves são burocráticos. O colunista d’O Globo, Marcelo Ninio, avalia que aparenta ser isso mesmo, já que a liberação na China de importação de carnes brasileiras ocorreu essa semana após alguns meses de crise. Para Ninio, apoiar a CoronaVac é positivo para Pequim, dentro do contexto da diplomacia da vacina. Em meio a essa questão na semana passada, a Embaixada da China anunciou apoio de empresas e associações chinesas ao estado do Amazonas com o envio de material hospitalar e oxigênio, e enfatizou a cooperação entre os dois países.

Na segunda-feira (25), no fechamento desta edição, o presidente Jair Bolsonaro anunciou que a Embaixada da China notificou o governo brasileiro da liberação dos insumos para a vacina CoronaVac e que o mesmo deve ocorrer para a da AstraZeneca (parceria com a FioCruz) nos próximos dias. Ele também agradeceu o governo chinês.

Uma série de análises sobre a China e a América Latina para pensar 2021. Passou o tempo de retrospectivas e agora é hora de analisar o que se espera do ano que começou. Algumas publicações focando na atuação da China por terras latino-americanas podem valer a atenção. A pesquisadora Isabel Bernhard, da Universidade de Oxford, escreveu ao The Diplomat, apostando em uma política externa chinesa cada vez mais expansionista e também intervencionista — com pretensões grandes para a América Latina, o que convoca os líderes dos países a refletirem sobre suas posições nesse contexto. Já o Diálogo Chino publicou uma análise focada nas relações sino-latinoamericanas com base no meio ambiente e na cooperação (ou não) em seis pontos-chave. Por fim, a análise de Margaret Myers, do Inter-American Dialogue, olha para o futuro a partir da reflexão sobre as opiniões no continente sobre a presença chinesa e a imagem positiva que o país asiático cultiva, de modo geral.

A Iniciativa Cinturão e Rota (BRI, na sigla em inglês) pode e deve eliminar o carvão de seus projetos. É o que avalia Erik Solheim, consultor sênior do World Resources Institute (WRI) e ex-chefe do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Solheim coordenou uma coalizão internacional junto ao Ministério de Ecologia e Meio Ambiente da China para tornar a BRI mais sustentável – uma opção que migre da matriz de carvão mineral para energias renováveis e que leve em conta impactos socioambientais. O consultor avalia que a Iniciativa pode caminhar em boa direção caso alguns padrões de respeito à natureza adotados domesticamente sejam seguidos nos investimentos chineses no exterior.

Na semana passada, uma decisão judicial enfureceu o público chinês: sob a acusação de estuprar a própria sobrinha no banheiro público de uma estação de ônibus local, um homem de 20 anos de idade foi multado em cerca de 500 dólares e condenado a apenas 5 anos de prisão por uma corte no interior da província de Yunnan. Aos olhos de muitos, a decisão foi demasiadamente leniente. A família da vítima, também indignada, pretende recorrer, mas especialistas alertam que será difícil alterar o desfecho do caso — as provisões das leis chinesas em se tratando de casos de estupro são relativamente brandas (em alguns casos, os agressores não passam mais de 3 anos encarcerados). Assim, apesar da indignação popular, a corte parece ter agido dentro dos limites da lei.

Um escândalo de uma celebridade chinesa foi destaque essa semana nas redes sociais do país. A famosa atriz Zheng Shuang enfrenta críticas dos fãs, da mídia e das autoridades após uma postagem de seu ex-parceiro, Zhang Heng. Segundo ele, o casal teria duas crianças de uma maternidade de substituição (popularmente conhecida como “barriga de aluguel”) nos Estados Unidos, já que a realização é proibida na China. Não é tão incomum para pessoas ricas da China buscarem maternidade de substituição fora, já que a lei não proíbe isso expressamente. Zhang também afirma que a atriz abandonou as crianças e que ele se mudou para os EUA para cuidar dos bebês. A atriz perdeu não apenas patrocínios (como da marca Prada), mas também teve prêmios rescindidos e aparentemente foi colocada em uma lista de personas non gratas em projetos. Postagens criticaram a moralidade da decisão, não só de abandono das crianças, mas de toda a prática de pagar uma maternidade de substituição.

Após um hiato de 88 dias, Jack Ma volta a aparecer. O “renascimento” de Ma ocorreu em uma cerimônia de premiação do Rural Teacher Award no dia 20 de janeiro, parte de um programa da Jack Ma Foundation para melhorar o acesso à educação de crianças que vivem em zonas rurais do país. Como comentamos em edições passadas da Shumian, o bilionário e fundador da gigante de tecnologia Alibaba havia sumido de cena após a suspensão do tão esperado IPO histórico do Grupo Ant. Segundo fontes próximas, a ordem para cancelar a oferta pública teria vindo diretamente do líder chinês Xi Jinping, como reação às críticas de Ma ao sistema bancário chinês.

Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.

Passarinho, que som é esse: você sabia que Pequim é um paraíso para os observadores de aves? Não parece óbvio, mas a cidade fica no meio de uma rota migratória importante e existem sites e tours especializados para quem se interessa, como o Birding Beijing. É um passatempo que tem se tornado cada vez mais popular. A cidade tem o segundo maior número de espécies de pássaros dos países do G20 — só perdendo para Brasília.

Aumenta o som: a dica musical dessa semana fica com 少女打東東 (Yilith), que capricha com uma mistura de blues e um leve toque de pop.

Cinema: Eddie Huang, personalidade sino-americana cuja auto-biografia inspirou a série Fresh Off the Boat, estreia como diretor no longa Boogie, que retrata a história de amor de um casal interracial em Nova Iorque. Confira o trailer aqui e já vá preparando a pipoca.

Música e resistência: para além da origem da Revolução Xinhai de 1911, que derrubou a Dinastia Qing e estabeleceu a República da China, Wuhan também foi palco de outras revoluções, uma delas na música: na década de 1990, foi na capital da província de Hubei que nasceu o movimento punk chinês. Ficou surpreso? Leia mais sobre esse episódio da longa e interessante história da cidade aqui.

A moda sempre volta? Talvez sim. Confira o vídeo e a história da marca Yat Pit, que está buscando trazer uma tendência de uso e adaptação para o dia a dia de roupas, tecidos e estilos tradicionais chineses.

%d blogueiros gostam disto: