Vacinas mais eficazes e gigantes de tecnologia da China sob pressão
Como tornar as vacinas contra Covid-19 mais eficazes? Com novas variantes do coronavírus surgindo com muita rapidez, a ciência nem sempre acompanha no mesmo ritmo para atualizar as vacinas. Nesse caráter de urgência, existem mais incertezas que respostas e, nesse contexto, uma declaração do chefe do Centro de Controle de Doenças (CDC) chinês, Gao Fu, levou a um debate sobre a eficácia das vacinas chinesas, que ganham espaço na América Latina. Em entrevista no sábado (10), Gao citou duas possibilidades para o aprimoramento de eficácia: a combinação de mais de um tipo de vacina ou mesmo a aplicação de uma terceira dose.
Rapidamente houve reações sobre a imprecisão na tradução para o inglês do termo usado pelo chefe do CDC e, na sequência, Gao concedeu uma entrevista ao Global Times rejeitando a forma como alguns veículos noticiaram sua fala sobre as vacinas. Ele condenou a publicação de matérias que afirmaram que a China teria admitido baixa eficácia de suas vacinas, acrescentando que sua declaração foi feita no sentido de apontar para um melhor alcance dos imunizantes num momento em que cientistas do mundo todo debatem a eficácia das vacinas contra Covid-19. Por falar em vacinas chinesas, foi publicado no domingo (11) um estudo que atesta a segurança da Coronavac, imunizante disponível no Brasil. O resultado se soma a outra pesquisa publicada por investigadores da Universidade do Chile na semana passada.
O governo da China publicou um livro branco sobre a redução da pobreza no país. Mais do que um documento detalhando estratégias para os próximos anos, o livro branco traz uma narrativa histórica do Partido sobre seus esforços de erradicação da miséria, desde a fundação da República Popular da China em 1949, passando por 1978 com as reformas e abertura econômica de Deng Xiaoping, até chegar à era Xi Jinping, quando a empreitada foi colocada como uma das maiores prioridades da gestão.
Chamam atenção no documento algumas das táticas usadas para reduzir a extrema pobreza no campo: remoção de populações pobres de zonas rurais para distritos mais desenvolvidos; correção de erros de inclusão e exclusão em políticas públicas (definições mais precisas sobre o que é ser pobre na China); seguros de saúde e subsídios para reduzir despesas hospitalares — já que esse tipo de dívida é o principal motivo que leva um chinês rural à pobreza — e transferência de renda incondicional aos que “…não conseguem livrar-se da pobreza apenas por seus próprios esforços”. É impossível entender a pobreza na China sem olhar para as disparidades entre o meio urbano e o rural. Sobre esse último aspecto, confira a entrevista de Scott Rozelle para o ChinaTalk sobre como a desigualdade entre as “duas Chinas” ameaça a ascensão do país.
A pressão em cima das big techs chinesas está aumentando, como temos relatado com frequência na newsletter. Desde o ano passado, o cerco vem se fechando sobre ações monopolistas por meio de algumas promessas do governo, além de uma nova legislação antitruste com foco online (que entrou em vigor em fevereiro), o colapso do IPO do AntGroup, e também novos impostos. Em mais um episódio dessa série, o Alibaba foi multado — e não foi pouco: 2,8 bilhões de dólares — como resultado de um processo instaurado no ano passado em referência à atuação da empresa em 2019. Além da multa, vieram uma série de exigências sobre a atuação de negócios na plataforma. Ainda que a cifra seja alta, isso não deve prejudicar muito o caixa da gigante, que registrou um lucro de 69 bilhões de dólares no mesmo ano.
Em sinal de que a mensagem foi recebida, a empresa afirmou que vai aceitar a penalidade e que a ação demonstra a preocupação e ponderação das autoridades em relação ao desenvolvimento da indústria. Na mesma leva de notícias dos últimos dias, a subsidiária AntGroup deve passar por uma reestruturação e virar uma holding financeira, resultado de negociações com o Banco Central chinês. Ajustes incluem os mecanismos de empréstimo na plataforma e de pagamentos feitos internamente. Toda essa movimentação é para deixar as big techs cientes sobre quem está no controle do setor.
Estamos cansados já da pauta de diplomacia da vacina, mas ela é importante para refletir sobre o lugar do Brasil e do Sul Global na geopolítica. Ainda que o discurso de diplomacia da vacina venha muitas vezes acompanhado de desdém por parte de analistas, a realidade em muitos países é de dependência no acesso a imunizantes. Segundo coluna publicada no The Guardian, países ricos, com 14% da população mundial, estão em posse de 53% das vacinas com melhores resultados, como a da Pfizer, ou pagando mais caro por vacinas como a AstraZeneca. Para as demais nações, os imunizantes produzidos na China ou em parceria com ela, mesmo que possam ter menor eficácia, se mostram como a única solução. No continente africano, 51 países fizeram compras, mas menos de 6% das doses foram recebidas, e apenas dois países (Marrocos e Seychelles) vacinaram mais de 10% da população, segundo um levantamento do Development Reimagined. Nesse contexto de escassez, as doações chinesas (e também russas e indianas) contam muito: com 4,3 milhões de doses doadas para 22 países, a China se destaca como a maior doadora ao continente. O Egito, em parceria com a empresa chinesa Sinovac, deverá ser o primeiro país no continente a produzir uma vacina.
Ainda sobre esse assunto, o uso de imunizantes chineses foi um dos temas da primeira conversa entre o novo chanceler brasileiro, Carlos Alberto França, e sua contraparte chinesa, Wang Yi. O ministro teria sinalizado a possibilidade de enviar ao Brasil 30 milhões de doses de outro imunizante chinês, da Sinopharm. Essa oferta surge em um momento de preocupação com a expectativa de que a ampla vacinação dos chineses possa levar a um atraso no abastecimento de outros países. Para quem quiser se aprofundar no debate sobre as vacinas, veículos de comunicação e periódicos científicos vêm publicando triagens da produção e testagem de vários tipos de imunizantes.
Nem só de algodão vive a divergência entre EUA e China sobre Xinjiang. Depois de semanas do foco do noticiário sobre a relação entre o país norte-americano e o gigante asiático estar focado para o debate sobre o algodão, um eventual boicote às Olimpíadas de Inverno de Pequim volta à pauta. Na semana passada, o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Ned Price, falou novamente sobre as preocupações de Washington em relação ao tratamento dado pelo governo à minoria uigur em Xinjiang. Questionado se um boicote seria proposto a aliados dos estadunidenses, o porta-voz disse que certamente trata-se de algo que está entre as intenções do governo, a despeito da oposição do Comitê Olímpico e Paralímpico dos EUA. Pequim, por sua vez, fez um alerta para que a medida não seja levada adiante. O debate não para por aí e esta matéria do Axios mostra que o imbróglio sobre o algodão de Xinjiang chegou aos uniformes das Olimpíadas, tanto as de inverno, sediadas por Pequim, quanto às de verão, em Tóquio.
A hora e a vez das marcas nacionais? Boicote a marcas estrangeiras à Xinjiang pode dar espaço para empresas chinesas? É o que esta reportagem do New York Times discute. Algum impacto já vem sendo sentido na venda de sapatos, como mostra o Protocol China: o preço de um tênis da marca chinesa Li-ning teria aumentado 17 vezes, e até mesmo chinelos de plástico antiderrapante para banho estariam mais caros. Também há quem aponte para as perdas de lojas como a H&M, um dos principais alvos do boicote, sobre eventual queda de vendas em um mercado de 1,4 bilhão de pessoas. Chamou atenção na última semana que marcas das empresas alvo das críticas pelo governo chinês passaram a ser borradas na televisão no país, como por exemplo, em casos de patrocínios em uniformes de equipes esportivas. Não lembra sobre o debate do algodão? Sem problema, a gente te ajuda a resgatar o que já contamos aqui.
Erramos: Caros leitores, na edição 147 escrevemos “árabes e palestinos” quando queríamos dizer “israelenses e palestinos”. Pedimos desculpas pelo erro e agradecemos ao atento leitor Sandro por ter nos avisado!
É possível coibir relações de abuso entre professor e aluno por meio da lei? A China vem apostando que sim e, na semana passada, o Ministério da Educação divulgou o documento preliminar de uma legislação que, entre outros pontos, visa à proibição de relacionamentos amorosos entre professores e alunos. O texto, que está aberto para a opinião pública, quer regulamentar de que forma os educadores podem interagir com estudantes das escolas primárias e secundárias. Além disso, a ideia é vetar o contato entre professores e alunos em ambiente extracurricular. Pelo rascunho, fica proibido que profissionais de educação toquem nos alunos intencionalmente, além de não poderem manter conversas com cunho sexual, mostrar vídeos pornográficos e “agirem de forma que possa ser configurado assédio ou abuso sexual”. Esse não é um debate recente na China e um primeiro protocolo tratando do assunto foi publicado pelo governo em 2018. Nos últimos anos, o gigante asiático viu uma série de escândalos sexuais envolvendo professores e alunos, como contamos aqui, mas a violência contra menores não se limita às relações escolares. Recomendamos a leitura desse fio do China Law Translate para quem quiser se aprofundar sobre o debate jurídico ligado ao tema.
Hora de fazer um bom cafezinho e ler a mais recente história que a newsletter Gushi publicou. Dessa vez, quem dá cor à narrativa é a jovem Wang, uma engenheira recém-graduada que se surpreendeu ao receber a proposta de trabalhar como ajudante de obras. Após ponderar muito, Wang decidiu fazer parte da equipe e compartilhou com os leitores as dificuldades e alegrias que encontrou no caminho. Entre outros temas, a autora relatou a falta de infraestrutura, como a ausência de banheiro feminino nos locais de obra, o encontro com seu futuro marido, as condições de trabalho precárias e as dinâmicas de gênero com seus colegas — relutantes que uma mulher pudesse supervisionar seu ofício.
Por aqui somos fãs confessos do site Reading the China Dream, que traduz para o inglês textos de intelectuais chineses sobre uma miríade de temas. Uma reflexão interessante trazida recentemente por David Ownby e Selena Orly é sobre as publicações no famoso site Aisixiang — fonte de discussões na academia chinesa. Infelizmente, menos de 4% dos 642 autores presentes lá são mulheres. Assim, o Reading the China Dream (que tem 9,8% dos textos de intelectuais chinesas) deve começar a traduzir mais produções de mulheres, como essa aqui da pesquisadora Wen Jiajun, tida como membro da “Nova Esquerda” chinesa, sobre a crise climática no país, escrito em 2009. A introdução ao texto traz as reflexões de David e Selena sobre gênero e o texto em si chama atenção do governo e da classe média do país a terem mais responsabilidade sobre questões ambientais.
O livro A Trégua, do autor uruguaio Mario Benedetti, causou uma bagunça no Douban, o site chinês que centraliza resenhas de filmes, seriados e livros. Tudo começou quando uma estudante de graduação chamada Gao Han escreveu para sua universidade criticando a edição da obra do uruguaio em chinês, recém-publicada. O texto postado no site de críticas fala que a edição está “cheia de sinais de tradução automática”. Discussões entre fãs e a tradutora levaram a uma queda nas avaliações do livro, o que pode ter prejudicado as vendas.
Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.
Bora dançar, mas quietinho: sabe os grupos de dança que se reúnem em praças públicas para dançar na China? Um deles encontrou uma solução inovadora para as reclamações de barulho dos vizinhos: os bons e velhos fones de ouvido. Confira!
Um pouco mais acadêmico: a pesquisadora Lizhi Liu discute a política em torno do uso de dados, a ascensão das techs chinesas e como isso tudo se relaciona com a presença delas no mundo.
Podcast: você provavelmente já ouviu falar de eunucos. Eram funcionários públicos (homens) que tinham a genitália removida e que serviam na Cidade Proibida como espiões e guardiões, especialmente das concubinas, obedecendo diretamente aos imperadores. O China History Podcast fez uma série de seis episódios sobre a história deles (o último ainda não saiu).
Lembra aquela visita a Pequim? Morto na última semana aos 99 anos, o príncipe Phillip visitou a China em 1986 ao lado da Rainha Elizabeth. Imagens resgatadas pelo Bing Tongxue lembram passagens por pontos importantes como a Cidade Proibida e a Grande Muralha. A visita foi realizada anos depois da assinatura da Declaração Conjunta Sino-Britânica de 1984, que colocaria Hong Kong sob o governo de Pequim a partir de 1997.