Economia da China está em recuperação

"Ashton Kutcher sent *you* a tweet?" by Ed Yourdon is licensed under CC BY-NC-SA 2.0

Economia chinesa em recuperação, construções ilegais no Butão

Economia chinesa

Fazer do limão uma limonada. Assumir um cargo governamental em meio a uma pandemia não é exatamente o sonho de nenhum político, porém, foi o que aconteceu com Wang Zhongli, que se tornou secretário-geral do PCCh em Wuhan em meio ao surto de Covid-19. A gestão de Wang começou de forma conturbada: pouco depois de ter sido promovido, em fevereiro de 2020, Wang se viu envolvido em críticas após uma desastrosa declaração que fez sobre implementar uma política de gratidão dos cidadãos ao governo chinês.

Mas agora ele parece estar colhendo os frutos do controle da circulação do coronavírus.  Esta semana, a imprensa chinesa publicou que o secretário pode se tornar governador da província de Hubei, cuja capital é Wuhan.

Crescendo, mas com parcimônia. É cansativo acompanhar o intenso volume de análises sobre o futuro da economia chinesa. Mesmo assim, achamos que vale retomar o tema já que, na semana passada, ele voltou à pauta devido ao entusiasmo em torno do feriadão de 1º de maio, que dura cinco dias na China. Os indicadores de consumo e turismo interno são bons, mas nada no patamar pré-Covid: as viagens cresceram, mas os gastos ficaram abaixo dos registrados em 2019, como mostram a Caixin e o Asia Nikkei. Ainda segundo a Caixin, um ponto positivo foi a expansão nas bilheterias de cinema, com a reabertura de salas e o lançamento de novos filmes.

Como o comando do país vê isso? Em reunião que antecedeu o feriado, o Politburo — órgão decisório mais elevado do PCCh — concluiu que a recuperação da economia chinesa ainda é desigual e não tem bases sólidas. Segundo a agência estatal Xinhua e a Reuters, o governo central se comprometeu a buscar uma forma de crescimento mais equilibrada. Recomendamos a leitura deste texto trazido pela Pekingnology sobre as palavras do próprio presidente Xi Jinping a respeito do estágio de desenvolvimento e do fenômeno da dupla circulação, do qual já falamos aqui. A declaração é de janeiro, mas só veio a público agora.

A bolha que nunca estoura: especula-se que o mercado imobiliário chinês está prestes a enfrentar uma crise semelhante à que viram os Estados Unidos em 2008, mas é preciso ter cautela. É verdade que os preços não param de crescer e que poucas construtoras controlam o setor de imóveis do país — as 50 maiores detêm 60% do mercado. Associados a isso, o envelhecimento da população e a urbanização mais lenta (se comparada às taxas do final dos anos 1990) inflam o cenário, como diz a matéria do The Economist. Mas a bolha existe em tamanho e fragilidade diferentes a depender da região: Pequim, Hangzhou, Shanghai e Shenzhen estão no limite, mas cidades menores, ou locais cujas indústrias oferecem baixos salários, relatam preços muito abaixo do mercado e nenhum comprador.

É o caso de Zhengzhou, cidade onde está a Foxconn, como conta o Financial Times. Houve um boom imobiliário antes da instalação da empresa, mas uma rápida depreciação no momento em que novos trabalhadores chegaram. Imigrantes, eles não tinham um salário à altura de bancar um imóvel por lá. A pandemia acentuou as diferenças regionais e pode dificultar a recuperação econômica da China e, assim, aumentar as bolhas imobiliárias localizadas.

A China é o modelo, pelo menos para as redes sociais, é o que diz Andy Tian, CEO do AIG (Asia Innovation Group). Em entrevista para o site Rest of the World, Tian fala que o futuro dos aplicativos de redes sociais em países em desenvolvimento deve ser cada vez mais similar ao modelo chinês, com seus superapps (que combinam diversas utilidades em um lugar só). Ele faz essa associação em contraponto ao atual modelo que mais usamos em boa parte do mundo, nascido no Vale do Silício. Para Tian, a popularização de métodos de pagamento dentro dos aplicativos é a chave para o sucesso. Ele também afirma que as empresas chinesas precisam melhorar muito a sua adaptação aos mercados locais — algo que o TikTok parece já ter aprendido.

Economia chinesa

Qual a relação entre a fala de um líder e o aumento de violência racial? Não é uma pergunta fácil de ser respondida, muito menos algo simples de ser mensurado.  Este texto do China Data Lab traz um bom debate sobre o impacto para os chineses, mas também para toda comunidade de origem asiática, das declarações do ex-presidente estadunidense Donald Trump, especialmente após ele ter se referido ao coronavírus como “vírus chinês”. Lembramos que um dos casos de ódio direcionado contra asiáticos nos Estados Unidos foi o massacre em spas em Atlanta, conforme noticiamos aqui. O Sixth Tone traduziu para o inglês um texto cuidadoso sobre o funeral de uma das vítimas, que morreu longe de casa, sem familiares por perto.

Os discursos com viés xenofóbico em relação à China não são exclusividade de Trump. Na esteira da declaração desastrosa do ministro Paulo Guedes, o presidente Jair Bolsonaro voltou a acusar os chineses de terem fabricado o vírus que causa a Covid-19. Não se sabe ainda o efeito prático que isso pode ter na relação entre os dois países, e apesar do Instituto Butantan ter emitido um alerta sobre eventual atraso nas vacinas, a Embaixada diz que não há anormalidade nesse sentido. Pequim, que tem evitado entrar num debate com o governo brasileiro, respondeu que se opõe a politizar o tema.

E vamos de diplomacia da vacina. Na última sexta-feira (7), a Organização Mundial da Saúde (OMS) aprovou o imunizante da chinesa Sinopharm para uso emergencial, ainda que haja críticas à ausência de alguns dados. O mesmo deve ocorrer em breve com a vacina da Sinovac (a Coronavac), cujos dados são mais completos do que a da Sinopharm, segundo técnicos da organização. Também essa semana, a Agência Europeia de Medicamentos começou a análise da Coronavac para uso em países da União Europeia. Porém, na disputa das vacinas, as ações de empresas farmacêuticas chinesas despencaram na quinta-feira (6), após o anúncio do apoio dos EUA à suspensão de patentes de imunizantes contra a Covid-19.

Ao dirimir dúvidas sobre segurança e eficácia, o aval da OMS a vacinas permite que elas sejam utilizadas mais amplamente pelo mundo. No entanto, o número de doses produzidas e exportadas não deve aumentar nos próximos meses devido a um gargalo de produção que só deve se resolver no final de junho. Vale lembrar que possíveis problemas de produção também preocupam Pequim, que finalmente atingiu a meta de 10 milhões de doses aplicadas por dia e pretende vacinar 40% da população até junho. Ainda assim, três empresas chinesas se comprometeram a produzir e exportar para a Rússia 260 milhões de doses da vacina russa Sputnik V — e mais uma possível vacina contra Covid-19 começou a passar por testes de fase 3 com 40 mil voluntários no Quênia.

Azedou de vez a relação entre China e Austrália. Pequim suspendeu na quinta (6) um dos principais tratados econômicos com Camberra em reação a medidas do governo australiano, como noticiamos aqui. A gota d’água parece ter sido o anúncio da Austrália de que o contrato de concessão do porto de Darwin à empresa chinesa Landbridge estaria sob revisão e poderia ser rompido por motivos de segurança nacional. A cidade, ao norte do país, é geograficamente estratégica e abriga soldados dos EUA. Já a empresa Landbdrige pertence ao bilionário Ye Cheng, que seria muito próximo de militares chineses. A medida de Pequim, no entanto, é considerada simbólica por não ter efeito direto sobre os laços comerciais e financeiros entre os dois países. A tensão com a Austrália preocupa a China, porque o país fornece até 60% de todo o minério de ferro importado por Pequim (a segunda posição é ocupada pelo Brasil) e o preço da commodity vem subindo nos últimos meses.

Uma pegada de gigante. É assim que o grupo internacional de pesquisa Forests & Finance avalia o impacto de instituições financeiras chinesas sobre o desmatamento das maiores florestas tropicais do mundo. A explicação vem do financiamento das cadeias produtivas das commodities mais responsáveis pela destruição de florestas tropicais do mundo, como carne bovina, soja, celulose, óleo de palma, borracha e madeira. O estudo, realizado em parceria com instituições e sociedades civis dos Estados Unidos, Indonésia, Holanda, Brasil e Malásia, aponta que as instituições, bancos de desenvolvimento e seguradoras da China falham ao implementar as salvaguardas socioambientais já existentes, como a de emissão de créditos verdes (2012), e mitigação de riscos no estrangeiro (2017).

Caso você queira ficar por dentro de todas as medidas socioambientais criadas por agências governamentais e bancos de desenvolvimento da China para empresas trabalhando no exterior, recomendamos a leitura do relatório da IISCAL sobre o tema.

Uma reportagem exclusiva na Foreign Policy chamou atenção ao relatar construções ilegais pelo governo chinês no território do pequeno país do Butão, que possui 470km de fronteira com a Região Autônoma do Tibete. A reportagem afirma que, desde 2015, foram construídas estradas, vilarejos e até postos militares na região de Beyul Khenpajong, um vale sagrado no Butão. O esforço de pesquisa que levou à matéria, liderado por Robert Barnett, utilizou imagens de satélite para sustentar seus achados. Como o texto afirma, seria uma atuação inédita das autoridades chinesas de ocupação de outro território em terra (o Mar do Sul da China manda um alô, como o artigo relembra) — e é improvável que o governo do Butão não esteja ao menos ciente. Contatados pela FP, os governos da Índia, China e Butão não se manifestaram.

Com relações complicadas há um século, China e Butão negociam questões de delimitação territorial desde 1984. Em 2017, uma disputa fronteiriça no planalto de Doklam (próximo com a fronteira indiana) rendeu muita tensão, gerando choques entre tropas chinesas e indianas. No ano passado, a construção de vilarejo na região de Doklam também causou irritação do lado indiano. A matéria da Foreign Policy reacende esse problema ainda que China e Butão tenham acabado de realizar um encontro diplomático no início de abril, justamente sobre demarcação territorial.

O mundo aguarda os resultados do mais recente censo chinês, previstos para saírem nesta terça-feira (11). Em sua newsletter sobre notícias que afetam mulheres por todo o continente asiático, o South China Morning Post relembrou que uma pesquisa de 2019 indicou que 20% das esposas chinesas se arrependiam de terem se casado. Em 2012, o número era de apenas 9%. Entre as solteiras, o estigma de não se casar parece estar diminuindo — embora os homens ainda tenham expectativas de encontrarem uma noiva. Para quem deseja se aprofundar no histórico da luta feminina pela igualdade prometida pelo comunismo, mas ainda não atingida, recomendamos o livro Enfrentando o Dragão (em português mesmo!), da pesquisadora feminista Leta Hong Fincher. Para ter um gostinho do trabalho dela, você pode ler sua participação recente (em inglês) no Politico.

Falando em gênero, um grupo de artistas fez uma instalação no norte da China para protestar contra o discurso de ódio online (um “Museu de Discursos Violentos na Internet”, tradução livre). São mais de 700 faixas com comentários coletados na internet, muitos com forte tom machista e nacionalista. Em vídeo, é possível ter uma ideia do espaço e de alguns comentários (em mandarim). O contexto foram os recentes ataques a feministas em fóruns chineses, sobre os quaisque falamos aqui.

O ócio criativo, segundo Mao. As críticas ao modelo de trabalho 996 — trabalhar das 9 da manhã às 9 da noite, 6 dias por semana — não é novidade na China. Mas os jovens chineses adotaram uma solução inusitada após serem criticados por um executivo da Tencent por “dormirem muito”. De acordo com o South China Morning Post, as vendas de livros com citações do líder comunista Mao Zedong tiveram um boom recentemente. O motivo? Jovens acharam uma declaração do ex-dirigente chinês dizendo que “Jovens entre 18 e 25 anos precisam estudar e trabalhar, mas também é o período para o desenvolvimento de seus corpos … o trabalho e o estudo direcionado a eles não podem ser muito pesados … a juventude precisa dormir bem”. Esse trecho viralizou nas redes sociais chinesas e teve mais de 90 mil comentários e compartilhamentos.

Não é só no Big Brother que mobilizar torcida é importante. Na China, o programa CHUANG — um reality show em que 90 participantes internacionais disputam 11 vagas em uma boy band — levou as torcidas a gastarem milhões de reais para ter seu favorito na final. Isso porque, além do voto normal, feito pela a Tencent Video (produtora do show), fãs também podem comprar votos extras se adquirirem produtos do patrocinador do programa (uma marca de iogurtes não muito boa, diga-se de passagem). Fãs-clubes fazem então uma vaquinha e arrematam milhares de votos em um único dia. Segundo Yan Cong, da Chaoyang Trap, os diferentes fãs-clubes do CHUANG conseguiram levantar mais de 120 milhões de reais nessa brincadeira. Haja iogurte.

A classe média chinesa gosta de arte internacional, pelo menos na cosmopolita Shanghai. Cheng Li discute nesse interessante ensaio (excerto de um livro seu sobre o tema) para a Brookings sobre como a arte ocidental contemporânea encontra público cativo e intercâmbio com artistas chineses da cidade. Vale ler o texto (e conferir as fotos das obras) para aprender mais sobre a cena artística em Shanghai. Já dá para anotar umas dicas para ir depois da pandemia, quem sabe?

A morte do comediante brasileiro Paulo Gustavo chegou à China, nas páginas do Diário do Povo, jornal estatal chinês. O texto, publicado em português e em chinês, remonta alertas feitos pelo ator sobre os riscos da pandemia, além de contar parte de sua trajetória de sucesso na TV e no cinema brasileiro, em especial com o filme “Minha mãe é uma peça”.

reforma electoral en Hong Kong

Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.

Convite: Amanhã (11), o Ciclo de Cinema e Psicanálise debate o filme taiwanês “A Sun”, do diretor Chung Mong-Hong. O evento é online e gratuito. Na edição deste mês, estaremos representados pela nossa editora sênior Talita Fernandes. Para assistir é só clicar aqui.

Vozes Negras na Sinologia: conheça Tiago Ferreira, integrante do projeto Vozes Negras na Sinologia e especialista em terras raras. Não deixe de conferir a entrevista que fizemos com ele!

Podcast: agora em maio, o ContraRegra está lançando um especial de cinco episódios sobre a China. O primeiro é uma entrevista com o sinólogo Athos Munhoz a respeito das raízes da China moderna, e pode ser ouvido aqui. Não perca!

“Fantasmas do Oriente no México”: em seu último romance, o escritor Imanol Caneyada construiu sua narrativa em torno de um triste e controverso capítulo da Revolução Mexicana, que culminou com o assassinato de mais de 300 chineses. Rodolfo Cárdenas também dedicou uma série de suas colunas no jornal Milénio a este tema tão pouco conhecido.

Fotografia: sem poder viajar devido à Covid-19, o fotojornalista Zhou Pinglang fez uma série de fotos explorando o metrô de Shanghai. Vale conferir aqui.

Você não pode dormir sem antes ver: as ilustrações de Xu Deqi, artista da província de Shandong que faz uma viagem no tempo com imagens carregadas na arte pop e elementos da cultura e história chinesas.

Bom dia, minha esposa no céu: a ótima nova newsletter Far & Near foca em histórias visuais sobre China. A primeira edição traz um belo vídeo da Caixin, premiado pelo World Press Photo, sobre a morte de uma mulher no início da pandemia na China.

Economia chinesa
及时行乐 — jí shí xíng lè — ou o bom e velho Carpe Diem (“aproveite o dia”).

 

%d blogueiros gostam disto: