Fotografia em cores de em que se vê a abóbada de uma madrassa no Reguistão, a praça principal de Samarcanda, no Uzbequistão.

Edição 221 – Xi fará sua primeira viagem internacional desde 2020

Vacinas chinesas e gigantes de tecnologia na China

Seja um humano digital você também. Em agosto, o governo municipal de Pequim lançou um plano para incentivar a indústria de criação de “humanos digitais” usando a Web3, conta a matéria da Rest of World. O inédito Plano de Ação, que diz respeito aos próximos três anos, menciona que o setor tem potencial alto de crescimento e de movimentar 50 bilhões de yuan em 2025. A ideia é também incentivar o desenvolvimento de tecnologias relacionadas, como reconhecimento de fala, simulação de gestos e expressões faciais, renderização e fomentar a criação de empresas que trabalham com propriedade intelectual na Web3. O documento veio logo após a realização da 2022 Global Digital Economy Conference na capital chinesa, em que o papel da inteligência artificial foi destaque. 

Ídolos virtuais não são novidade na China (nem no Brasil), como explica este texto da Sixth Tone. No estilo do filme Her, a XiaoIce, a bot em formato de humana da Microsoft, ganhou destaque em 2020 pela dependência emocional desenvolvida por alguns usuários com a inteligência artificial. Na Olimpíada de Inverno de Pequim, em 2022, também foi popular a versão digital da atleta Eileen Gu

Aliás, o órgão protagonista da história de regulação do setor de tecnologia e inteligência artificial no país – a Administração para o Ciberespaço da China – ganhou um artigo explicativo no DigiChina que vale conferir.

Uma equipe de militares chineses está desenvolvendo projéteis hipersônicos. Segundo matéria do South China Morning Post, foram realizados testes em animais vivos para estudar os efeitos que essa tecnologia pode ter na carne humana. Apesar do interesse em material biológico, o principal impacto das balas hipersônicas seria no combate contra veículos blindados, especulou o Asia Times.

Um importante passo para a paz: China e Índia anunciaram na quinta-feira (8) a retirada de suas tropas de uma zona fronteiriça disputada na Caxemira. As relações bilaterais estavam tensas desde 2020, quando soldados indianos e chineses atacaram-se sem armas de fogo, mas resultando na morte de dezenas de combatentes. Segundo o acordado, as tropas e a infraestrutura militar de ambos os países serão removidas da região de Gogra, com verificação mútua. Como assinala o India Today, o distensionamento é bem-vindo, mas ainda é preciso resolver vários outros pontos de atrito na fronteira.

Xi Jinping confirmou presença na reunião de cúpula da Organização para Cooperação de Shanghai (OCS) no Uzbequistão. Essa será a primeira viagem internacional do presidente chinês desde o início da pandemia de Covid-19 e vai incluir visitas oficiais ao Uzbequistão e ao Cazaquistão. Espera-se que Xi encontre Putin (Rússia) e Modi (Índia) bilateralmente durante reunião da OCS. O evento se dará em Samarcanda, cidade joia da antiga rota da seda situada no atual Uzbequistão, no final da semana (15 e 16 de setembro); a viagem ao Cazaquistão acontecerá já na quarta-feira (14). Vale lembrar que Uzbequistão e Cazaquistão são peças-chave da Iniciativa Cinturão e Rota, outrora “nova rota da seda”. Além disso, a viagem pode ser entendida também como uma tentativa de conseguir apoio regional às políticas adotadas em Xinjiang, que faz fronteira com a Ásia Central, recentemente criticadas em relatório da ONU.

Em mais um capítulo da disputa tecnológica entre China e EUA, Washington mandou a AMD parar de vender seu chip de inteligência artificial mais avançado para a China, medida que se estendeu também à Nvidia. Pequim considerou o banimento um ato de “hegemonismo tecnológico”, mas representantes do setor na China consideram que, apesar das dificuldades iniciais, a decisão dos EUA deve impulsionar a indústria chinesa de chips. Mas, em contraste, as restrições ao compartilhamento de tecnologia com a Huawei foram aliviadas para conter o avanço chinês na padronização tecnológica global, segundo apurou a Bloomberg. De todo modo, os EUA estudam ainda limitar os investimentos feitos por empresas do país em companhias de tecnologia da China: o governo Biden estaria negociando com o Congresso a formulação de uma lei que exija a divulgação antecipada de investimentos em determinados setores industriais chineses e que dê ao governo o poder de vetá-los. 

Ainda no campo da tecnologia, autoridades chinesas acusaram os EUA, especificamente a Agência de Segurança Nacional (NSA, em inglês), de tentarem hackear a Universidade Politécnica do Noroeste em Xi’an. A instituição participa ativamente em pesquisas envolvendo os programas aeronáutico e espacial chinês. Será que o jogo virou?

Falando de relações China-EUA, a pesquisadora Yuen Yuen Ang publicou um excelente texto na revista Noema sobre o que está em jogo na competição das grandes potências. Segundo a autora, longe de um “confronto civilizacional” ou de uma “nova guerra fria”, Pequim e Washington estão em uma corrida para domar os excessos do capitalismo, cada um a seu modo. Vale um cafezinho.

Mais uma pra conta. Xinjiang ganhou as notícias essa semana de novo, mas não pelo relatório publicado na semana passada. A região de Ili (ou Yili), na fronteira com o Paquistão, está em lockdown (não reconhecido oficialmente) um mês após um aumento de casos de Covid-19, similar ao que vinha acontecendo em outras partes do país. Os moradores decidiram usar o Weibo para chamar atenção das autoridades devido à falta de acesso a alimentos e tratamento médico. Os protestos foram feitos pelos Super Topics, que funcionam como uma mistura entre hashtags e comunidades. Uma postagem do China Digital Times resume a questão e mostra uma diretiva interna do governo para encher os tópicos com outras pautas ao longo do dia. Ao que parece, a morte de Elizabeth II na quinta-feira (8) foi um suspiro de alívio para os criticados, pois mudou o foco. Na sexta-feira (9), as autoridades pediram desculpas e reconheceram os problemas de distribuição de comida. No Twitter, a hashtag #starvationgenocide subiu uma série de imagens sensíveis (não verificadas) de pessoas que teriam morrido de fome em Ili, sob o argumento de que as carências seriam parte da política contra uigures na região.

A situação segue preocupante em Chengdu, que, além do fechamento e das reclamações sobre a política de Covid Zero, sofreu com um terremoto no dia 6 que já causou 93 mortes. Pessoas andam compartilhando nas redes vídeos de câmeras de segurança registrando suas reações no momento do abalo. O evento ecoou preocupações sobre a tragédia na província de Sichuan em 2008.

Falando em Covid Zero, os funcionários públicos chineses estão no limite de um burnout, ao que parece. Uma matéria de Eleanor Olcott e Maiqi Ding para o Financial Times conta das privações, cansaço e frustrações dos trabalhadores do setor público do país. Muitos saíram das suas funções — em escritórios — para atender a demanda por pessoas na linha de frente, controlando a circulação e realizando testagem em massa. A reportagem conta que, em algumas regiões, o peso fiscal da política de Covid Zero tem atrasado os salários desses funcionários. Isso é um golpe para muitos jovens que andavam considerando o serviço público como carreira, pela estabilidade oferecida. No início do ano, alguns governos locais já haviam anunciado cortes em bônus e subsídios devido a ajustes fiscais, como explicou o SCMP.

Legado colonial. A morte de Elizabeth II levou honconguenses a avaliar o saldo dos 150 anos sob a coroa britânica à revelia do discurso oficial do governo. De um lado, à luz dos acontecimentos atuais, houve quem considerasse o colonialismo britânico comparativamente menos mau. De outro, foram lembradas as opressões praticadas pelos colonizadores e como eles falharam em garantir sua promessa de democracia para Hong Kong. Houve ainda espaço para o saudosismo de quem lembra das visitas da monarca à região em 1975 e 1986 e filas para prestar homenagem no consulado britânico. Mas os resquícios do período se fazem lembrar além dos charmosos prédios e caixas de correio: no sábado (10), cinco fonoaudiólogos acusados de conspiração para imprimir, publicar e distribuir publicações sediciosas foram condenados a 19 meses de prisão. As obras em questão são livros infantis sobre ovelhas resistindo ao domínio de lobos. A legislação que possibilitou esse processo foi a lei colonial antissedição de 1938, uma relíquia que voltou a ter uso desde os protestos de 2019.

reforma electoral en Hong Kong

Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.

Leitura: o Asia Times fez uma resenha do livro Perfect Police State de Geoffrey Cain sobre monitoramento em massa em Xinjiang. 

Na onda: o livro The Backstreets: a novel from Xinjiang do escritor uigur Perhat Tursun foi traduzido para o inglês e o tradutor Darren Byler escreveu sobre o processo. Em 2018, Tursun foi detido e relatos não confirmados dizem que foi sentenciado a 16 anos de prisão.

Bota o som, DJ: você conhece o Knopha? O DJ chinês é um sucesso, apesar de ser muito discreto. De todo modo, dá pra ouvir o homem trabalhando aqui ou no Spotify.

Sem opção: em vídeo e fotos, veja como vivem os moradores de prédios chineses cuja construção foi abandonada.

Hànyǔ: A Macau University of Science and Technology abriu inscrições para seu primeiro programa online de mandarim (é gratuito). 

Lua vai: procurando uma recomendação de filme e ainda inspirada no Festival do Meio Outono ou Festival da Lua? Pode conferir a animação A Caminho da Lua, que conta a história da busca de uma jovem para encontrar a deusa Cheng’e.

Imagem de fundo vermelho com texto em branco. Caracteres chineses cujo pinyin é 镜花水月 ou jìnghuā shuǐyuè.
O Festival de Meio do Outono ou Festival da Lua veio aí e o chengyu de hoje é dedicado à lua e às vibes: 镜花水月 ou jìnghuā shuǐyuè significa literalmente “flores no espelho e o reflexo da lua na água”. Com o tempo, deixou de ser referência poética e passou a descrever algo ilusório.
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