O economista Zhang Jun, que também é diretor da Escola de Economia da prestigiosa Universidade de Fudan, escreveu um texto para o Project Syndicate sobre a transformação da economia chinesa para uma economia digital. Em 2018, o setor constituía 34,8% do PIB chinês, cerca de 31 trilhões de yuans, tendo gerado 191 milhões de empregos. Os números representam apenas ⅓ do tamanho da economia digital estadunidense, mas o seu crescimento foi notável em comparação ao restante do PIB chinês. A pandemia acelerou a transformação digital de alguns setores em países pelo mundo e na China — para além de tecnologias na área da saúde, as mudanças são perceptíveis desde a maior adesão ao e-commerce até a educação online. Por fim, Zhang argumenta que, se a China terminar o ano como a única economia com crescimento positivo, isso terá se dado em boa parte pelo investimento nos últimos 10 anos em pesquisa e infraestrutura focada em tecnologia, como 5G e processamento de dados.


De acordo com relato da Reuters, o governo central da China estaria se opondo à venda forçada do TikTok nos Estados Unidos. Citando fontes confidenciais, a publicação afirma que, aos olhos de Pequim, o encerramento das atividades do aplicativo no país norte-americano seria preferível à transferência de suas operações a uma empresa estadunidense. Temendo que a transação transpareça fraqueza frente a Washington, oficiais do gigante asiático estariam dispostos a se utilizar das revisões feitas à lista de tecnologias sujeitas a controles de exportação no fim do mês passado para atrasar ou inviabilizar a venda a um potencial comprador. A princípio, a ByteDance negou as informações, mas pouco tempo depois a Microsoft (que até então despontava nas negociações) anunciou que teve sua proposta de aquisição do TikTok negada. Alguns chegaram a anunciar que a Oracle levaria a melhor na corrida pelo aplicativo, mas rapidamente a estatal CGTN, também sem especificar suas fontes, afirmou que a ByteDance não pretende vendê-lo para quaisquer compradores estadunidense.


O modelo de circulação dupla, que já comentamos na edição 118 da Shūmiàn, voltou a ocupar as manchetes dos jornais chineses nessa semana. O presidente Xi Jinping enfatizou a necessidade da modernização do sistema logístico nacional para que o modelo opere plenamente. Faz sentido: o setor logístico demanda altos investimentos em infraestrutura que, por sua vez, são fundamentais para o melhor escoamento de produtos e consumo nas regiões mais interioranas do país, além de utilizar vasta mão de obra. Apesar de o modelo de circulação dupla ser bem recebido em Zhongnanhai, há quem veja problemas sérios na (não tão nova) estratégia.

O pesquisador Covell Meyskens, que acabou de lançar o livro “Mao’s Third Front: The Militarization of the Cold War”, escreveu um interessante texto sobre a renovada utilização do conceito de Guerra Fria. Meyskens argumenta que o significado da expressão “Guerra Fria” como enxergado pelos estadunidenses não foi de fato relevante para a China continental — cuja discussão interna do período focava na luta contra o imperialismo. Para a maioria dos estadunidenses (com exceção dos que foram para o campo de batalha), a Guerra Fria ocorreu na mídia e fora do seu território até os anos 90, enquanto muitos países enfrentavam guerras de fato como resultado da disputa. Assim, os governantes chineses fizeram preparações concretas para se contrapor a uma possível invasão dos EUA. Esses investimentos foram abandonados no contexto da aproximação com o país na década de 70. Meyskens sugere que é necessário refletir se o termo se aplica a uma situação que resultou em experiências radicalmente diferentes pelos dois países.

Para além do termo, as tensões seguem concretas. Sob a autoridade de uma proclamação presidencial do início deste ano, Washington anunciou, na última quarta-feira, a suspensão do visto estudantil estadunidense de mais de mil cidadãos chineses. Chad Wolf, chefe interino do Departamento de Segurança Interna do país norte-americano, afirmou que a decisão, que atinge alunos e pesquisadores da China com ligações às forças armadas do país, busca prevenir “o roubo e a apropriação de pesquisas sensíveis” dos Estados Unidos. Em resposta, Zhao Lijian, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, classificou a medida como um ato de “perseguição política e discriminação racial que viola gravemente os direitos humanos dos estudantes chineses”. Pequim, por fim, ainda sinalizou que pode retaliar, mas detalhes de uma possível represália não foram dados.


Em 2020, a ONU comemora 75 anos da assinatura da Carta das Nações Unidas por 50 países, inclusive a China — à época representada por T.V. Soong (do Kuomintang). O Ministério das Relações Exteriores chinês lançou um position paper em comemoração ao aniversário da organização. No documento, Pequim reafirma a importância da ONU enquanto o mundo enfrenta a pandemia e critica a sua politização, ressaltando o respeito à soberania, a cooperação internacional para o desenvolvimento, a proteção do meio ambiente e mais. Há também uma seção sobre o papel da tecnologia 5G, críticas a decisões com base em segurança nacional para discriminar empresas e um pedido de respeito ao livre mercado.


Na semana passada, comentamos sobre o encontro em Moscou dos ministros da defesa da China e da Índia para discutir a crescente tensão fronteiriça entre os dois países. A conversa, ao que parece, foi produtiva: em declaração conjunta divulgada dias após a reunião, chineses e indianos clamam por diálogo e se comprometem a aliviar hostilidades. Concordando que a presente situação não é do interesse nem de Pequim, nem de Nova Déli, os oficiais assentiram com a manutenção da distância entre tropas e com a prevenção de novos atritos nos Himalaias. Resta saber, porém, se o esforço vai funcionar: na semana passada, tiros foram trocados ao longo da fronteira (com ambos os lados acusando um ao outro sobre quem teria efetuado os disparos), e há ainda quem acredite que as duas potências encontram-se em curso de um conflito mais sério.

Tempo extremamente reduzido para fazer uma entrega, rotas que levam à contramão e penalidades pesadas por segundos de atraso: esses são só alguns perrengues enfrentados pelos entregadores de comida da Meituan e Ele.me, gigantes do setor na China. Com promessas de salários altos, muitos trabalhadores de regiões rurais do país se mudam para as grandes cidades e veem nas empresas de delivery de comida um prato cheio. Isso é o que esperavam; só em Xangai, um entregador morre a cada 2,5 dias em acidentes de trânsito. Rotas sugeridas pelos aplicativos — que incluem passar por calçadas e não respeitar o sinal vermelho — mais os descontos no fim do mês por atrasos ou más avaliações pressionam os entregadores a pôr a própria vida em risco para terem o que comer no fim do mês. Atentas às recentes críticas, Ele.me e Meituan anunciaram que irão aumentar o tempo de entrega de 5 a 8 minutos, contanto que o cliente aceite a nova condição.


Dada a gravidade da pandemia da COVID-19, não surpreende que o debate em torno da volta às aulas esbarre em um grande número de desafios. Como explicar, então, o feito chinês de já ter trazido quase 200 milhões de estudantes de volta à sala de aula? Por um lado, o gigante asiático faz uso de medidas comuns de contenção — uso de máscara, distanciamento entre indivíduos, controle de movimentação etc. — para garantir a segurança no ambiente escolar. Por outro, a implementação desses procedimentos segue uma abordagem característica: mobilização de batalhões de oficiais locais e quadros do PCCh para inspecionar salas de aula, implantação de ferramentas tecnológicas para vigiar alunos e professores, e restrição de movimentos dentro e fora de escolas e universidades. Deu certo por lá (o próprio Xi Jinping parece estar muito satisfeito com a operação), mas é evidente que, ao redor do mundo, talvez outras soluções sejam necessárias.


Na edição passada, falamos sobre a criação de um novo sistema de parques nacionais na China. A notícia não poderia ter vindo em melhor hora. Segundo relatório da World Wildlife Fund, lançado na última quinta-feira, mais de 68% das espécies de animais do mundo sofreram uma redução em suas populações. A perda da biodiversidade mundial é um dos riscos mais prováveis e com maior impacto sobre a humanidade, acompanhando acontecimentos como a ocorrência de eventos climáticos extremos e crises hídricas. Como já falamos, o país será sede da próxima Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU; a China tem importância fundamental na condução das discussões sobre nossas relações com o reino animal. O relatório relembra, por exemplo, que cerca de 60% das doenças infecciosas emergentes têm origem nos animais — sendo que 75% desses casos se referem à fauna silvestre.


Em um mercado já saturado, empresas chinesas como Tencent e NetEase buscam novas formas de atrair jogadores para o mundo do gaming. Um nicho que tem se destacado é o de mulheres jovens, que há muito tempo lidam com estereótipos sexualizados de personagens e histórias. A nova onda de títulos para celular, como Fate of the Empress e Love and Producer, ainda reproduz a fantasia romântica em torno de homens virtuosos e encantadores. Porém, ao mostrar uma realidade focada na experiência feminina, esses jogos conquistam as jovens gamers chinesas — que tendem a se tornar cada vez mais exigentes quanto aos produtos que consomem. Com o tempo, espera-se que essa indústria se reinvente, para atender a crescentes expectativas de um público diferenciado e promissor.

Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.

Por conta da casa: a dose dupla da semana vai para o rap com batida latina de 江靜 Jiang Jing e MC HotDog熱狗, e para o R&B aconchegante de 李友廷 Yo Lee.

Podcast: vozes negras falando sobre a China são o tema do episódio recente do podcast Sinica.

Filmes: o Cine CPFL está com programação de alguns filmes clássicos chineses até fim de outubro. Fizemos um fio no Twitter com recomendações.

Conferência de Pequim: há quase exatos 25 anos, a 4ª Conferência Mundial das Mulheres aconteceu em Pequim. O evento, que reuniu 31 mil mulheres de 200 países, e a sua resolução são considerados importantes e visionários marcos na defesa da igualdade de gênero pelo mundo. Hillary Clinton chegou a fazer um famoso discurso chamado “Direitos das mulheres são direitos humanos”. Veja um vídeo curto sobre os resultados já atingidos.

%d blogueiros gostam disto: