Edição 195 – China e EUA vão a Roma enquanto ômicron provoca mais lockdowns
Ômicron, o desafio da Covid-19. Ainda que a China enfrente menos casos do que outros lugares do mundo, a variante de alta taxa de transmissão segue sendo um desafio. Nos últimos dias, o país viu o número de infecções diárias passar de 400 para mais de 1.000, chegando a 3.122 no domingo (13). Apesar da alta, o número de mortes permanece inalterado na China continental, com 4.636 mortes por Covid no total desde o surgimento do coronavírus. Ainda assim, o agravamento fez com que a cidade de Shenzhen, em Guangzhou, entrasse em lockdown e Shanghai adotasse uma série de restrições para atividades consideradas não essenciais, como aulas presenciais. As restrições levaram a queixas, por parte da população, sobre a dificuldade em conseguir acesso a alguns materiais, caso de estudantes da província de Jilin, também em lockdown, no nordeste do país. Mas o impacto também é sentido na atividade econômica nacional e na cadeia de produção de bens fabricados na China, como o iPhone, mostra o Axios. A situação segue complicada em Hong Kong, onde há alto número de infecções diárias e mortes, este fio do Twitter chama atenção para o elevado número de idosos ainda não vacinados na China.
Ainda na toada do Dia Internacional da Mulher, a Bloomberg fez um perfil de Sun Chunlan, uma mulher que está à frente do comando da política de combate à Covid-19 na China, desafiando a estrutura fortemente patriarcal do comando do Partido Comunista Chinês.
Adeus, camarada. Chegaram ao fim as Duas Sessões, sobre as quais falamos nas últimas semanas. Em sua entrevista coletiva, o premiê Li Keqiang se despediu, já que as sessões legislativas de 2023 vão acontecer após o 20º Congresso do Partido, em outubro, quando deve ser feita a troca de poder da China. Por falar em mudança, o Tracking People’s Daily mostra o tom das manchetes do jornal estatal no encerramento das Duas Sessões, indicando que o chefe do Executivo ganhou mais destaque nas sessões legislativas se comparado com o passado. A newsletter também indica um texto sobre os dez anos de participação de Xi Jinping no evento como líder.
O futuro é feminino. Não é de hoje que a crise demográfica é pauta por aqui e no noticiário sobre a China no geral. Voltamos ao tema com esta entrevista concedida pela ganhadora do prêmio Nobel de economia Esther Duflo à Caixin. A pesquisadora, especialista na temática de redução da pobreza, faz um alerta sobre a diferença entre o número de homens e mulheres na China, o que deve seguir em curso no país. O tema esteve presente nas Duas Sessões, como contamos aqui. Se você quiser entender mais a questão de gênero influenciando a crise demográfica, vale reler a análise que nossa editora sênior Talita Fernandes publicou com Tatiana Prazeres na Folha.
Quem tem boca vai a Roma. A semana começa com um encontro entre chineses e estadunidenses na capital da Itália para discutir a guerra na Ucrânia. O governo da China escalou o conselheiro de política externa Yang Jiechi para as tratativas com Jake Sullivan, conselheiro para assuntos de segurança dos Estados Unidos. A conversa acende um alerta a respeito da relação entre Pequim e Moscou: estariam os chineses se afastando dos russos? Embora a China se mantenha “oficialmente neutra”, o país tem evitado condenar as ações militares de Vladimir Putin, ao passo que bancos multilaterais localizados na China seguraram empréstimos para os russos.
Os relatos são de um longo e intenso encontro que durou sete horas, mas sem muitas novidades por enquanto. A cobertura da imprensa internacional dá conta de mostrar que os Estados Unidos vêm pressionando a China para que o país asiático não dê apoio a Putin. Enquanto vazamentos à imprensa estadunidense falam que Moscou teria pedido ajuda a Pequim, os dois países negam que haja qualquer conversa deste tipo. Para acompanhar mais de perto o que está em jogo nessas tratativas, vale a leitura desta análise do SCMP.
Por falar nisso, vale saber o que a guerra na Ucrânia tem provocado na opinião pública na China. Tem gente de Stanford pesquisando o assunto no Weibo e isso dá uma pista sobre como netizens reagem ao ataque. Aliás, a The Atlantic também publicou uma análise sobre como os comentários nas redes chinesas têm sido majoritariamente focados em criticar a influência dos EUA sobre o conflito.
Vai sair aquela visita da ONU a Xinjiang. Já estamos comentando isso desde 2018, mas finalmente houve um consenso sobre a visita de Michelle Bachelet, alta comissária da ONU para os Direitos Humanos, à China. A viagem ocorreria em maio e incluiria Xinjiang, conta o The Guardian. Embora Pequim já tivesse convidado Bachelet, os detalhes da negociação (e extensão do acesso que ela teria a pessoas, instalações e localidades na província) eram um ponto de tensão. O anúncio vem em um momento em que Bachelet sofre pressão, após uma carta aberta de 192 ONGs e grupos da sociedade civil, para liberar um relatório que deveria ter sido publicado no final do ano passado, sobre violações de direitos humanos em Xinjiang.
E a China com isso? Mais uma vez o Peru se vê em uma crise política em meio a suspeitas de corrupção. Enquanto o presidente Pedro Castillo se diz vítima de uma tentativa de golpe de estado, denúncias dão conta de um suposto esquema que teria a sucursal peruana da China Civil Engineering Construction como parte de uma rede de desvios de dinheiro público. A acusação foi apresentada pela empresária Karen Lopez, como mostra o El Comércio, que também traz uma negativa da empresa chinesa sobre qualquer irregularidade. Acompanharemos os possíveis desdobramentos políticos no Peru que possam vir a impactar a China. Por enquanto, uma “moção de vacância” contra o presidente foi aberta pelo Congresso. Termo estranho para você? Para gente também, é que o dispositivo para retirada de um mandatário do Peru tem este nome, e não impeachment, como no Brasil. Enquanto isso, recomendamos a leitura deste texto da Americas Quarterly, que fala sobre como Castillo, que chegou à presidência de seu país em 2021, aproximou-se de Pequim em sua gestão.
Sob nova direção. A vitória de Yoon Suk-yeol nas eleições presidenciais sul-coreanas deve trazer novos ares para as relações com a China. As apostas de analistas ouvidos por jornais chineses e ocidentais é que Yoon deve adotar uma postura mais próxima de Washington e de Tóquio, distanciando-se um pouco de Pequim em comparação com os dirigentes anteriores. Uma das pautas que pode ter força neste sentido é a questão da segurança nacional, sobretudo na conflituosa relação com a Coreia do Norte. Já analistas ouvidos pelo Politico apostam numa mudança na relação de poderes na Ásia, com diminuição da influência chinesa. O South China Morning Post destacou a mensagem enviada por Xi Jinping ao novo mandatário sul-coreano, dizendo esperar que a “cooperação amistosa” entre os dois países continue se aprofundando.
Repetindo à exaustão. É clichê falar o quanto nossa vida atual gira em torno do telefone celular, mas a gente esquece o trabalho que está envolvido na montagem dos aparelhos. A Gushi traz uma leitura longa do relato feito por Lai Lin sobre a vida de trabalhar em uma fábrica de smartphones. O título do texto, publicado originalmente em chinês, é “eu montei 6 mil lentes de câmera em um dia”, que dá conta de sugerir o trabalho extenuante numa linha de montagem.
Sexualidade e pornografia na China. Desde que surgiu, o Chaoyang Trap vem trazendo temáticas interessantes e diferenciadas sobre a sociedade chinesa, tanto que vez ou outra a gente sugere o trabalho. A temática desta vez é sobre como funciona a pornografia na China, um país com forte controle do conteúdo da internet. Vale ligar uma musiquinha e acompanhar o debate deste episódio.
Disrupção? Desde o início deste mês está em vigor a nova regulação chinesa de algoritmos de recomendação, aprovada no final de 2021. Como falamos por aqui e durante um cafezinho, a iniciativa de Pequim permite que netizens chineses possam avaliar como algoritmos tomam decisões com base em seu perfil de usuário e até desativar completamente a personalização. Esses algoritmos definem preços de produtos, conteúdos sugeridos, resultados de busca — praticamente tudo que acessamos na internet hoje. Assim, o mundo está atento ao impacto da nova legislação, pois, se algo similar for adotado por mais países, poderá mudar a internet como a conhecemos hoje (e deixar muita gente feliz). Nossa curadoria 100% humana garante que vale a pena ler esta análise sobre o assunto escrita pelo especialista em inteligência artificial Alberto Romero — enviada por Rodrigo Ghedin (do nosso parceiro Manual do Usuário) .
Acabou a Paralimpíada de Inverno. Chegaram ao fim no último domingo (13) os Jogos Paralímpicos de Inverno de Pequim. China, Ucrânia e Canadá se destacaram no quadro de medalhas, com larga vantagem para o país-sede. Assim como ocorreu durante o discurso de abertura dos jogos, trechos do discurso antiguerra do presidente do Comitê Internacional Paralímpico Andrew Parsons foram censurados pela estatal chinesa CCTV.
Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.
Em mandarim: para quem gosta de teoria das relações internacionais, o famoso professor da Universidade Tsinghua Cui Zhiyuan escreveu sobre o dilema de segurança na crise da Ucrânia.
Xô, clichê: o Radii China conta a história de Liu Xinmei, uma ilustradora chinesa conhecida como Cat Mover, que mostra o trabalho artístico para além do lugar-comum do que se sabe sobre a arte chinesa.
Plano infalível: Maurício de Sousa falou à Xinhua sobre a homenagem da Mônica à Olimpíada de Inverno de Pequim, além de sua experiência em ser publicado em chinês e os seus planos para a China.
Moderna e brasileira: a pintora modernista brasileira Tarsila do Amaral é tema de exposição em Pequim, em meio às comemorações da Semana de Arte Moderna de 1922.
Feminismo: o SupChina trouxe uma conversa com a pesquisadora Leta Hong Fincher sobre o estado atual do feminismo na China. Vale um chazinho.
A Guerra: nessas duas semanas do conflito entre Rússia e Ucrânia, a guerra é assunto constante. O Sixth Tone trouxe uma entrevista com Xu Shijie, um jovem estudante chinês que conseguiu fugir do conflito.
Oportunidade: especialista em China? Confere a chamada para a vaga (remota e voluntária) junto à rede Observa China. Inscrições até 24 de março.