Edição 211 – Xi ‘deixa bolha’ e visita Hong Kong em primeira saída da China continental
Do caos à ordem. Esse foi o tom da mensagem de Xi Jinping em seu discurso, na última sexta-feira (1), durante as celebrações dos 25 anos da transferência de soberania de Hong Kong dos britânicos para a China. O presidente declarou que a política de “Um país, dois sistemas” foi testada e aprovada, de modo que não haveria razão para mudanças. Também garantiu que ela conta com aprovação unânime dos residentes de Hong Kong e amplo apoio da comunidade internacional, e que a verdadeira democracia se iniciou em Hong Kong quando a região foi devolvida à China.
O 1º de julho é uma data tradicionalmente marcada por protestos políticos, como relembrou o Hong Kong Free Press, o que não ocorreu neste ano. Além da celebração, Xi também participou da cerimônia de transferência do cargo de CEO da cidade para John Lee Ka-chiu e de encontros com a elite local, em eventos fechados ao público e com acesso restrito de jornalistas sob alegação de ameaças à segurança nacional. Esta foi a primeira vez que o presidente deixou a China continental desde o início da pandemia de Covid-19, em 2020, e a única viagem a Hong Kong em cinco anos. Ele chegou na quinta-feira (30), mas passou a noite em Shenzhen, retornando para mais compromissos no dia seguinte. Para a visita, a cidade foi colocada sob um forte esquema de segurança.
Montadoras chinesas financiam startups para produção de chips domesticamente. Enfrentando escassez de semicondutores devido à pandemia, empresas do setor automotivo estão investindo em negócios locais para tentarem resolver o problema. Na semana passada a startup Horizon Robotics anunciou um novo financiamento da montadora estatal FAW. Conforme apuração do Technode, pelo menos outras 20 empresas automotivas já fizeram aportes financeiros na Horizon Robotics. Em 2021, apenas 5% dos chips usados em carros na China foi produzido no país. O governo prometeu adotar mais medidas de estímulo ao setor.
Ainda sobre a indústria automotiva, a CATL divulgou um novo modelo de bateria de lítio, o Qilin 3.0. Com autonomia de mais de 1.000 km e capacidade de carregamento em apenas 10 minutos, a inovação da empresa pode revolucionar o mercado de carros elétricos com sua introdução em 2023.
Mais uma incorporadora imobiliária deu calote. Nesta segunda-feira (4), a empresa Shimao anunciou que não realizou o pagamento de US$ 1 bi que deveria ter sido feito no último domingo (3). Esse é o primeiro calote da incorporadora especializada em imóveis de luxo após meses de tensão. Chamou a atenção de investidores que a Shimao sequer tentou renegociar a dívida antes, o que pode ser um mau sinal. Porém, em comunicado separado, a empresa informou estar otimista com os sinais de reaquecimento do mercado imobiliário, possibilitando a venda de novas unidades e projetos.
Será um respiro aliviado? Depois de um primeiro semestre difícil, bons ventos parecem soprar na China em termos do controle de Covid-19. Os grandes centros do país, como Pequim e Shanghai, parecem estar voltando ao mais próximo à normalidade. A capital chinesa deve reabrir as escolas depois de quase dois meses fechadas. Em Shanghai, a celebração foi pela maior cidade do país ter zerado as taxas de contágio pela primeira vez desde março, após meses de sucessivos fechamentos. A política de Covid zero segue firme, mas o governo dá sinais de flexibilidade para quem chegar do exterior ao país. O tempo de isolamento vai ser reduzido de 14 dias fechados e sete em observação para sete dias de isolamento e três de monitoramento domiciliar, como mostra a Reuters.
O que esperar das relações entre China e Peru nos próximos anos? Em entrevista ao Diálogo Chino, Luis Quesada, embaixador do país sul-americano em Pequim desde 2018, falou sobre os desafios ambientais dos investimentos chineses na região, como o famoso caso de Las Bambas, e a necessidade de se discutir um novo acordo de livre comércio, já que o atual seria, nas palavras de Quesada, “obsoleto”. O embaixador refletiu ainda sobre como a nova política climática da China, investindo mais em energia verde, pode encontrar no país sul-americano um bom parceiro, visto seu enorme potencial para energias hidrelétrica, solar e eólica. O Peru é o país que mais recebe investimentos chineses na América Latina depois do Brasil.
Consequência das sanções contra a Rússia, a UltraTech Cements, principal fabricante de cimento da Índia, adquiriu um carregamento de carvão russo fazendo pagamento em renminbis. Segundo apurou a Reuters, a empresa está importando um carregamento de 157 mil toneladas do insumo ao preço de aproximadamente ¥173 milhões (cerca de R$ 137 mi). A moeda chinesa parece estar sendo usada por empresas indianas e possivelmente de outros países para contornar as sanções dos EUA e da União Europeia à Rússia, impulsionando sua internacionalização tal como se especulava no início da invasão da Ucrânia. Tanto Índia quanto China recusaram-se a condenar o ataque russo e intensificaram a importação de combustíveis fósseis do país. O maior uso da moeda chinesa em transações internacionais é visto como positivo por especialistas consultados pelo Global Times por prover uma alternativa ao dólar estadunidense. Segundo o periódico, bancos russos também já teriam convertido seus depósitos originalmente em euros e dólares para renminbis.
Nova iniciativa foca em cibersegurança. Desde 2020 que autoridades chinesas falam sobre a Iniciativa Global sobre Segurança de Dados (ou Global Data Security Initiative). A proposta, explicada neste texto do projeto DigiChina de Stanford, pretende angariar apoio de países do Sul Global para criar padrões de uso e tratamento de dados. O objetivo é trabalhar de forma multilateral (vem no mesmo pacote de política externa recente que a Iniciativa de Desenvolvimento Global), mas por enquanto as informações são vagas e muito vem sendo construído de acordo com cada caso. Alguns países já estão se envolvendo nesse ano, como o Equador e, mais recentemente, uma declaração conjunta a partir do fórum China + Cinco Países (Cazaquistão, Quirguistão, Uzbequistão, Turquemenistão e Tajiquistão). A pesquisadora Courtney J. Fung, que estuda governança global e a China, deu uma entrevista para o The Wire China sobre a proposta chinesa de governança de dados no âmbito internacional.
Um bilhão de pessoas afetadas em possível vazamento de dados. Em meio ao crescimento da iniciativa chinesa de cibersegurança, no domingo (3) começou a circular o boato de que uma base de dados da polícia de Shanghai (vinculada ao Ministério da Segurança Pública) estaria à venda, segundo os supostos invasores. O preço pedido pelos hackers no Telegram é de 10 bitcoins ou cerca de 200 mil dólares, segundo matéria da Reuters, que não conseguiu verificar a autenticidade dos dados. A base contém informações pessoais (nome completo, endereço, número de identidade, registros policiais e de saúde) de cerca de um bilhão de pessoas — quase toda a população do país, incluindo menores de idade. O CEO da corretora de criptomoedas Binance mencionou no Twitter que seus analistas já haviam identificado dados de um bilhão de residentes de um “país asiático” sendo vendidos na dark web. Lembrando que em abril entrou em vigor a lei de proteção de dados pessoais, o que gerou comentário do analista Roger Creemers sobre o uso da lei neste caso. As autoridades não se manifestaram, mas se confirmado, seria um dos maiores vazamentos de dados da história. Os brasileiros não estão sozinhos.
O controle estatal sobre os direitos reprodutivos dos cidadãos foi o tema de uma análise da pesquisadora de relações diplomáticas e culturais entre EUA e China Rui Zhong. A partir da decisão da Suprema Corte dos EUA de não mais garantir o direito ao aborto e do papel do procedimento na política do filho único na China, ela compara as mudanças das políticas de saúde reprodutiva nos dois países. Rui destaca que a crise demográfica chinesa têm levado as autoridades a adotar medidas como restringir o acesso ao aborto e ao divórcio — enquanto, ao mesmo tempo, submete mulheres uigures e cazaques a esterilizações e colocações de DIUs à força.
Rússia paralela. O escritor de romances históricos Yifan foi à Wikipédia chinesa aprender sobre a cidade de Tver Oblast, na Rússia. Ele descobriu fatos e personagens que, curiosamente, não estavam documentados na Wikipédia russa. Foi assim que começou uma investigação que revelou 206 artigos amplamente ficcionais, ricos em detalhes, escritos ao longo de 10 anos por uma só autora: Zhemao. A “Borges chinesa”, como ficou conhecida entre netizens, publicou um pedido de desculpas, dizendo que de início só queria aprender sobre história, mas que para cada criação eram necessárias várias outras para servirem de fonte. Segundo a autora, ela é uma dona de casa que estudou até o ensino médio; em um perfil já deletado, ela afirmava ser filha de um diplomata alocado na Rússia, formada em história da Rússia e casada com um russo. Após investigação da Wikipédia, a maioria dos artigos criados por Zhemao foi apagada, alguns foram corrigidos e ampliados e ela foi banida. Embora a comunidade de editores da plataforma chinesa sinta que sua credibilidade tenha sido abalada, algumas pessoas elogiaram Zhemao por seu talento e persistência, encorajando-a a escrever e publicar romances. Vale ler tudo sobre o caso no artigo da Sixth Tone — cujo autor ficou tão abalado que teve dificuldades em entender o que era real e o que era invenção nesse causo.
Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.
Economia solidária: o fechamento de Shanghai demonstrou sérias dificuldades logísticas na cadeia de suprimentos da cidade. Esse texto de Lin Zi para o China Dialogue propõe repensar a produção agrícola que alimenta as cidades, focando na economia solidária.
Ainda sobre sustentabilidade: o think tank MERICS lançou um relatório sobre o uso do hidrogênio verde como combustível na China e como governo, empresas e academia trabalham juntos para viabilizar essa indústria.
Independente: procurando umas dicas de cinema? No SupChina, uma entrevista com a jornalista Karen Ma sobre cineastas indies da geração de 1980.
As ruas falam: se você já esteve em Hong Kong, talvez tenha encontrado os grafites de Tsang Tsou-choi, ou o “rei de Kowloon”. A curiosa história do subversivo grafiteiro é tema dessa matéria e podcast de Louisa Lim, que ficou oito anos atrás desse personagem urbano.
Videogames: a RadiiChina publicou uma lista de 10 jogos épicos imperdíveis dos últimos anos. Os títulos estão disponíveis em diversas plataformas.