Fotografia em cores de pessoas circulando pela Taiwan Station, em Taipei.

Foto de Shupin Zeng via Unsplash

Edição 216 – Viagem de Pelosi volta olhos para Estreito de Taiwan

Vacinas chinesas e gigantes de tecnologia na China

Semicrise. Em onda que vinha desde meados de julho, o fim de semana trouxe mais ventos de crise para figuras-chave na indústria de semicondutores chinesa. O órgão de combate à corrupção do Partido Comunista da China divulgou que Ding Wenwu, ex-presidente do principal fundo de financiamento do setor, está sob investigação e foi detido por suspeita de apropriação de recursos. Ding chefiava o China Integrated Circuit Industry Investment Fund, que também é conhecido como Grande Fundo. Criado em 2014 com apoio estatal para financiar a indústria de chips no país,  ele levantou mais de 340 bilhões de renminbi (cerca de 260 bilhões de reais) desde então. Além de Ding, outros executivos também estão em situação similar. A matéria de Zeyi Yang para o MIT Technology Review explica o caso.

A pauta é importante no momento devido à recente visita de Pelosi a Taiwan. A indústria de chips taiwanesa é um dos pontos mais contenciosos da relação de Pequim com Washington (e com Taipei), como explica este especial da Reuters. Não à toa, o governo chinês vem incentivando um movimento de autossuficiência na produção de semicondutores para vencer a fragilidade que ficou mais evidente nos últimos dois anos.

Problemas nos bancos rurais. Desde abril, uma série de problemas e calotes de bancos levou a protestos em massa na província de Henan, com pessoas sem acesso às suas contas. As autoridades acusaram uma gangue criminosa e conseguiram acalmar os ânimos com promessas de pagamentos parcelados (ainda que sem prazos exatos), mas a questão é mais profunda. As instituições em questão se encaixam na categoria de banco rural, um modelo encontrado na China para financiamentos pequenos e que costuma ter menos regulação do que os maiores. Em uma longa matéria, Wu Peiyue e Zhang Wanqing escrevem para a Sixth Tone sobre o impacto humano dessa crise, com pessoas perdendo poupanças e economias para tratamentos médicos, sendo alvos de violência por parte de seguranças e vivendo em meio a muita ansiedade.

Como anda o solo da China? É o que um estudo lançado em fevereiro promete descobrir ao longo dos próximos anos. A análise é demandada por pesquisadores há tempos, já que a última feita nessa esfera tem mais de 40 anos. Essa é uma preocupação atual, como trouxemos na edição 202. O China Dialogue mostra os motivos que levam à necessidade desse tipo de estudo. Um artigo publicado na Science, em 2010, indica, por exemplo, que o solo chinês tornou-se mais ácido nos últimos anos. Mas a China não está sozinha. Um relatório da ONU evidencia os riscos para as terras do mundo todo provocados pela ação humana, como agricultura e mineração.

Todos os olhos voltados ao Estreito de Taiwan. Depois de rumores e expectativas, a presidente da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, foi mesmo a Taiwan e defendeu sua atitude em um artigo no The Washington Post. A visita aqueceu o noticiário e os temores de um possível conflito entre a China continental e a ilha. Felizmente, até aqui, a possibilidade de o cenário se agravar parece uma ideia remota. Mas os chineses continentais esperaram a partida de Pelosi, que foi sancionada por Pequim, para realizar exercícios militares próximos ao estreito de Taiwan. O ministro das Relações Exteriores, Wang Yi, criticou os EUA durante uma visita a Bangladesh. Na manhã desta segunda (8), Joe Biden disse não temer uma escalada na tensão entre Pequim e Taipei. 

Além dos burburinhos sobre um possível conflito armado, a visita de Pelosi gerou muitas publicações jocosas, inclusive algumas de gosto duvidoso. Inclusive, teve meme, como mostra o What’s on Weibo (talvez você queira ler sobre quem é Hu Xijin).A forma como a imprensa ocidental cobriu a viagem da estadunidense também rendeu críticas. O China Digital Times ainda trouxe a queixa dos taiwaneses sobre a forma como foram retratados em toda essa situação. Vale conferir a entrevista da integrante da Shumian Aline Tedeschi para a CNN Brasil sobre o assunto. 

Negócios à parte. O jornal The Telegraph revelou neste domingo (07) que a gigante chinesa Tencent teria investido na Hadean, uma startup britânica que fornece softwares para o exército do Reino Unido. Além do governo britânico, outro investidor da empresa é In-Q-Tel, uma venture capital estadunidense que teria fundos financiados pela CIA. Apesar das companhias politicamente inconvenientes neste momento, segundo o jornal, o aporte teria sido considerado muito pequeno para disparar uma revisão baseada na Lei de Segurança Nacional chinesa ou em leis britânicas — apenas £15 milhões no total. Embora a Hadean ofereça ao governo do Reino Unido simulações de guerra para o setor de defesa militar, seu CEO garantiu que os investidores chineses não teriam acesso a tecnologias “sensíveis”.

A falta que o SUS faz. Financiamento de saúde é um tema frequente em muitas sociedades e na China não poderia ser diferente, em especial em tempos pandêmicos. A Caixin fez uma reportagem com analistas debatendo a necessidade de discutir qual a melhor forma de bancar a saúde do país. Aliás, vale voltar uns meses atrás na edição 207, quando falamos sobre o quanto a situação de Shanghai, num cenário de lockdowns e taxas preocupantes de Covid-19, expôs o frágil modelo de saúde pública do país asiático.

História de superação ou romantização da pobreza? Esse debate tomou as redes chinesas nas últimas semanas com o sucesso do vídeo 回村三天,二舅治好了我的精神内耗 (“Como meu tio curou minha saúde mental quando voltei ao vilarejo por três dias”, em tradução livre). Em 11 minutos, a peça conta a história do tio do cinegrafista, que perdeu o movimento das pernas após um tratamento médico quando ainda era jovem. Sem apoio financeiro do governo, ele conseguiu ganhar a vida como carpinteiro, criar uma jovem órfã e cuidar da mãe idosa. O vídeo ainda sugere que essa determinação viria de uma citação de Mao copiada em um dos cadernos do tio. Embora em um primeiro momento o vídeo tenha causado grande comoção como história de superação, sendo inclusive elogiado pela mídia estatal chinesa como “energia positiva” circulando na internet, alguns críticos apontaram que, mais do que receber uma mensagem otimista, o importante para a atual geração seria questionar a pobreza que persiste nas regiões rurais da China. Houve também quem apontasse inconsistências na história e similaridades com outros causos — o que só reforça que o tema da “pobreza inspiracional” parece estar se tornando um gênero em si.

O mundo de influenciadores virtuais parecia ser a solução perfeita para as empresas que buscavam celebridades para promover seus produtos e evitar os burnouts dos famosos. Afinal, seria como ter o alcance online de um influenciador, mas sem os problemas tão comuns de se trabalhar com celebridades: controvérsias, escândalos, fofocas. Mas, como apuraram Meaghan Tobin e Viola Zhou para o Rest of World, o mercado de influenciadores virtuais na China, estimado em US$ 16 bilhões (cerca de R$ 82 bi), é marcado por precariedade. Prepare seu cafezinho e aproveite a leitura.

reforma electoral en Hong Kong

Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.

Vamos fazer um piquenique lá embaixo: os confinamentos causados pela pandemia forçaram a redefinição de diversas relações humanas. Em Shanghai, um grupo de vizinhos decidiu combater a solidão e a ansiedade filmando suas rotinas e compartilhando entre si. Confira o resultado na matéria da Sixth Tone.

Tatuagem: qual é o estilo de tatuagem tatuagem de Hong Kong? O SCMP explicou neste vídeo spoiler: tem a ver, claro, com certas trocas culturais.

Fotografia: os registros de Peng Xiangjie da vida circense na China nos anos 1990 são o tema desta matéria do Chinanauts. Para ainda mais fotos, explore a série The Wandering Tent.

Capa vermelha, dragão, amarelo: os estereótipos nas ilustrações sobre China nos jornais e revistas são a pauta deste texto de Selina Lee e Ramona Li.

Autômatos: a Neocha mostra como o artista Yu Chenrui transformou mitos e histórias famosas em autômatos feitos de madeira com os quais produz vídeos sensacionais.

 

Imagem de fundo vermelho com texto em branco. Caracteres chineses cujo pinyin é 爱屋及乌 (ài wū jí wū).
Na semana que passou foi comemorado o Festival Qixi, data considerada (um dos) Dia dos Namorados chinês. Comemoramos o ar romântico com um chengyu dedicado ao amor. A frase 爱屋及乌 (ài wū jí wū) significa, em seu sentido literal, “amar a casa e seu corvo”. É uma expressão usada para dizer que o amor verdadeiro e duradouro é também aceitar as imperfeições da pessoa amada, abraçar o combo inteiro, “a casa toda, incluindo o corvo que paira sobre ela”.
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