Edição 229 – Visitas de líderes estrangeiros reacendem debate sobre reabertura
Muita especulação, pouca certeza sobre a reabertura da China. O noticiário recente voltou a especular se sinais recentes do PCCh poderiam ser lidos como o fim da política de Covid zero. Um deles seria o fato de Xi Jinping ter voltado a receber líderes estrangeiros no país, como diz o The Wall Street Journal, que fala em precaução e ausência de um cronograma definido. Como o próprio Keith Zhai, autor da matéria do WSJ, comentou: existem muitas formas de interpretar a Bíblia. Seja lá qual for o futuro da política contra a Covid-19, o mercado reagiu ao noticiário e apostou numa flexibilização, levando a bolsa de Hong Kong a registrar uma breve alta. Mas com o aumento de casos, Pequim voltou a fechar escolas e retomou o ensino remoto. Já na cidade de Lanzhou, na província de Gansu, um garoto morreu intoxicado por causa da dificuldade em acessar serviços de saúde em áreas consideradas de alto risco. A rigidez das medidas de contenção da Covid-19 está em destaque neste relato de um jornalista do Financial Times sobre os dez dias que passou em confinamento, ao qual ele se refere como uma “prisão”. Vale passar um café para ler.
Com todos os desafios que a Covid-19 impõe à economia chinesa, as oportunidades de crescimento para o e-commerce do país estão além das fronteiras. Este texto da Caixin apresenta as estratégias de expansão internacional de algumas big techs nacionais. Os resultados desse tipo de investimento já começam a aparecer: como observou o blog MIT Technology Review, no final de outubro, o app de compras Temu, versão internacional do Pinduoduo, se tornou o mais baixado da categoria nos Estados Unidos. Mas ainda deve haver um longo caminho para que as recém-chegadas aos novos mercados alcancem o sucesso da Shein, a maior referência de sucesso – que, aliás, abriu sua primeira loja física no Brasil, uma popup que vai funcionar por apenas cinco dias.
O setor imobiliário continua na pior. As 100 principais incorporadoras chinesas registraram uma queda de 28% nas vendas de novos imóveis em um ano, considerando o intervalo entre outubro de 2021 e o mês passado. O preço cobrado também está em baixa há quatro meses nas 100 maiores cidades do país, mau sinal para o setor. A empresa símbolo desse momento, a Evergrande, está sendo processada pelo Shengjing Bank por ter dado um calote de aproximadamente 4,5 bilhões de dólares, segundo informou a Yicai. Conforme análise da MacroPolo, a situação do setor imobiliário não deve melhorar sem resgate do governo central, o que ainda parece pouco provável.
Em tempo: nesta quarta-feira (9), houve forte alta de ações de incorporadoras chinesas após uma associação de investidores anunciar uma generosa expansão de um programa de auxílio a empresas endividadas. Segundo matéria da Reuters, embora a entidade não seja governamental, ela está vinculada ao Banco Central da China e a medida foi vista como uma mensagem do governo de que pretende estabilizar a economia e conter a crise no setor.
Olaf Scholz, chanceler da Alemanha, reuniu-se com Xi Jinping. A reunião, que marca os 50 anos do estabelecimento das relações bilaterais, aconteceu em Pequim na sexta-feira (4). Foi o primeiro encontro de Xi com um líder europeu desde a confirmação de seu terceiro mandato à frente do PCCh. Antes da chegada de Scholz, autoridades chinesas frisaram que os dois países são parceiros e não rivais, o que deu a tônica do encontro. Os representantes chineses pediram por um aprofundamento da cooperação bilateral para resolver os desafios em comum, especialmente o combate às mudanças climáticas. O jornal Süddeutsche Zeitung ressaltou que Scholz criticou a China pela situação dos direitos humanos em Xinjiang e pediu para que o país asiático procure influenciar a Rússia a pôr um fim à invasão da Ucrânia. Já Xi condenou países que ameaçam usar armas nucleares, numa crítica a Moscou. Na reunião, a China também se comprometeu a disponibilizar vacinas da Pfizer/BioNTech a estrangeiros residentes no país asiático. O jornalista Richard Walker resumiu neste fio os principais pontos do que foi discutido com a imprensa.
O país europeu passa por um momento de grande debate sobre como lidar com a China, tentando equilibrar interesses econômicos e valores políticos. A saída de Angela Merkel, há um ano, foi vista como uma perda de uma líder mais próxima dos chineses, ou que pelo menos evitava deflagrar conflitos com o país asiático. Scholz publicou um texto explicando que quer reduzir a dependência econômica para com a China, mas sem gerar uma desvinculação total. Thorsten Benner analisou como a recente decisão de aceitar investimentos chineses no porto de Hamburgo e a presença de uma comitiva empresarial na viagem a Pequim comprometem a tentativa alemã de tentar diminuir a dependência econômica do gigante asiático. No The Diplomat, Hans Maull comenta que, enquanto não sai a nova estratégia alemã para a China — que está nas mãos dos Verdes —, a política externa segue sendo a mesma, de teor mais comercial. Mas nessa disputa entre interesses econômicos e valores liberais democráticos, as empresas já têm um lado: riscos políticos são frequentemente ignorados pelas firmas alemãs, como mostra a Spiegel. No entanto, a opinião pública alemã vem ficando cada vez mais crítica a Pequim e a coalizão governamental cogita instituir novas regulamentações para restringir investimentos chineses em setores críticos alemães, como o de semicondutores.
O premiê do Paquistão, Shehbaz Sharif, também visitou o líder chinês na semana passada. Na reunião bilateral em Pequim, Xi expressou preocupação com relação à segurança de cidadãos chineses que moram no país vizinho — muitos agora só andam de carros blindados — e reforçou a importância do Corredor Econômico China–Paquistão (CPEC). A pesquisadora Rajeswari Rajagopalan publicou uma análise sobre as relações sino-paquistanesas e afirmou que a última reunião foi vazia de conteúdo e serviu mais para simbolizar a proximidade entre os governos. Porém, os resultados parecem ter vindo alguns dias depois: na segunda-feira (7), Pequim se comprometeu a ajudar financeiramente Islamabad, que passa por uma grave crise econômica.
Começou a COP27 no Egito e a China chegou preparada. Nas vésperas do evento, o governo lançou um paper sobre as ações chinesas no meio ambiente ao longo de 2022. O China Dialogue explica como o discurso chinês para o evento está girando em torno da resposta às demandas dos países em desenvolvimento — algo que o ministro do meio ambiente falou no lançamento do documento. Além disso, também há uma cobrança sobre os compromissos financeiros feitos por países ricos e que não foram cumpridos. O Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura, cuja sede fica em Pequim, advertiu que os governos de outros países não invistam em novas usinas de carvão. Enquanto isso, o secretário-geral da ONU pressionou por cooperação entre os adversários comerciais EUA e China, que são as duas maiores economias globais, para o clima.
Como se adaptar? Entre enchentes e secas recentes causando tragédias na China, o governo chinês tem pensado em formas de melhorar a resiliência climática do país. Como mencionado no paper que citamos na seção sobre a COP27, o país lançou o plano nacional de adaptação às mudanças climáticas (2022–2035) em junho, logo antes de um dos verões mais intensos dos últimos anos. Este texto do China Dialogue conta como as populações locais e a indústria se adaptam a climas extremos e explica algumas das ações mais pertinentes no momento. É preciso que haja investimentos para atingir as metas ambientais, como explica esse recente relatório do Banco Mundial.
Falando em meio ambiente: no sábado (5), Xi anunciou que cerca de 10% do território do país será destinado para parques nacionais. A sua fala (online) foi durante o encontro da COP14 voltado para Zonas Úmidas de Importância Internacional. Desde 2019, Pequim tem investido na ampliação dos parques nacionais no território chinês — conduzindo programas piloto e desenvolvendo um sistema próprio de governança entre diferentes esferas e órgãos públicos, como explicou Kyle Obermann neste texto de 2020.
Aprovada a atualização da Lei de Direitos e Interesses das Mulheres na China. O texto, deferido em 30 de outubro e em vigor a partir de 2023, tem entre seus destaques o encorajamento da educação sexual em escolas e mecanismos de prevenção ao assédio sexual no ambiente de trabalho, além da proibição a empregadores de questionarem o estado civil de candidatas ou de demitirem trabalhadoras por se casarem ou engravidarem. Apesar das críticas feitas à lei — como a responsabilização das mulheres pela manutenção dos “valores familiares” e a falta de detalhes práticos sobre as ideias propostas —, ativistas do movimento feminista chinês, como Xiaowen Liang, consideram essas mudanças uma vitória do movimento popular de mulheres. Os rascunhos das alterações da lei, publicados em dezembro e abril, atraíram milhares de comentários de diversos setores da sociedade — inclusive de pessoas contrárias à expansão dos direitos das mulheres.
Influenciador-recrutador. Entre todas as coisas possíveis de se comprar via streaming na China, há também oportunidades para fazer dinheiro. Como conta a Rest of World, desde janeiro, o Kuaishou, aplicativo de vídeos estilo TikTok, oferece uma funcionalidade focada em recrutamento de trabalhadores que já conta com 250 milhões de usuários ativos por mês. As vagas, em geral, são para empregos em fábricas, no campo, ou em diferentes formas de trabalho braçal. A ideia é que as pessoas possam conhecer o negócio antes de se candidatarem, ou até mesmo descobrir oportunidades que ainda não tinham considerado. A promessa é de que todo mundo ganha: os interessados nas vagas podem fazer perguntas e deixar comentários; o empregador tem a vantagem de economizar na busca por candidatos; e, como indica a reportagem, os golpistas já tem uma nova forma de aplicar seus golpes.
Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.
Casar ou comprar uma bicicleta?: o aplicativo de aluguel de bicicletas Hello Inc. decidiu que, na China, você não precisa escolher entre a magrela e o casamento. Aproveitando a base de usuários, o app também oferece serviços de namoro, conta o Sixth Tone.
Futebol é fashion? Tem quem torça o nariz para o uso de camiseta de time de futebol no dia a dia, mas o estilo está virando tendência na China. A Vogue Business explica essa moda.
Às compras! (Se couber no bolso). Lojas de roupas de alta costura que oferecem, além de peças cobiçadas, verdadeiras experiências a seus clientes na China foram ranqueadas pela WWD.
Fotografia: Boihugo, artista de Shanghai, e sua exposição Cuddle me, don’t colonize me, que celebra a gentileza e a feminilidade, foram assunto da NeoCha.
Acadêmico: a pesquisadora Luana Geiger analisou os recentes movimentos geopolíticos de China e EUA com relação à questão de Taiwan.
Novos tempos: com o alívio das medidas de combate à Covid-19, Taiwan voltou a receber a parada do orgulho gay, reunindo 120 pessoas, segundo os organizadores.
Sucesso: o disco novo de Taylor Swift tem sido comentado mundo afora. Na China não é diferente, e este vídeo de um coro em uma universidade em Pequim cantando a obra da cantora estadunidense viralizou. Merece ser visto e revisto.