Fotografia em cores do Monumento à mãe pátria em Kiev, na Ucrânia. A estátua de um homem de braços erguidos, segurando um escudo e uma espada, está cercada de um nevoeiro. Ao fundo, árvores.

Edição 250 – Pequim tenta iniciar mediação da crise na Ucrânia

Vacinas chinesas e gigantes de tecnologia na China

Adeus pandemia? Com um crescimento do PIB de 4,5% no primeiro trimestre de 2023, a economia chinesa parece dar sinais de recuperação após atravessar mais de dois anos com restrições devido à pandemia de Covid-19. Como assinala a CNN, o desempenho econômico no início deste ano foi puxado por um aumento dos gastos de consumidores — o varejo viu um pulo de 10% nas vendas e a produção industrial subiu 3,9% apenas em março. No entanto, a matéria chama atenção para a estagnação do investimento privado e a altíssima taxa de desemprego entre jovens como possíveis indicadores de que as expectativas de longo prazo estão negativas.

O espião que escrevia demais. Detido desde fevereiro de 2022, o jornalista Dong Yuyu, ex-editor do jornal Guangming Daily, ligado ao Partido Comunista Chinês, deve ser julgado em breve em Pequim. As autoridades o acusam de espionagem para o Japão ou os EUA devido a suas frequentes interações com diplomatas e jornalistas de outros países. A família de Dong, no entanto, sugere que considerar contatos estrangeiros como indício de “espionagem” seria uma criminalização da atividade jornalística. Dong é conhecido por seus textos de viés mais liberal, críticos a autoridades públicas chinesas. Diversos de seus leitores e outros jornalistas nos EUA fizeram um abaixo-assinado pedindo por sua absolvição. Caso seja considerado culpado no julgamento ainda sem data, Dong pode pegar até 10 anos de prisão, segundo publicou o The Guardian.

Uni-vos! Este ano, o feriadão do Dia do Trabalhador na China promete emoções além do turismo. Desde a semana passada, entregadores do app Meituan estão em greve em Shanwei, cidade na província de Guangdong, por conta de redução nos pagamentos pelas entregas. A plataforma de compras teria então convocado entregadores de outras regiões para atuar na cidade, gerando reações dos grevistas. O caso vem sendo documentado em redes sociais e até o momento não há previsão de desfecho para o impasse. Enquanto isso, em Hong Kong, uma passeata planejada para o 1º de maio foi cancelada nesta quarta-feira (26) após um dos organizadores, Joe Wong, ex-membro da extinta Confederação de Sindicatos de Hong Kong, desaparecer por quatro horas. Outro organizador, Denny To, afirmou que não seria possível oferecer mais explicações sobre o caso por conta da Lei de Segurança Nacional, mas que Wong teria sofrido uma crise emocional e estaria sob grande pressão.

O ministro da Defesa da China Li Shangfu foi à Rússia na semana passada, onde se encontrou com Vladimir Putin e seu contraparte russo, Sergei Shoigu. Em reunião com Putin, Li enfatizou a importância dos laços estratégicos bilaterais e mencionou que a parceria sino-russa vai além das alianças militares da Guerra Fria. Já o presidente russo frisou a relevância da cooperação militar bilateral. Enquanto a visita ocorria, um vídeo de origem desconhecida de Li elogiando Putin por “promover a paz mundial” foi assunto na Bloomberg. A parceria sino-russa está sob forte escrutínio após documentos estadunidenses vazados apontarem que o governo chinês teria autorizado a exportação secreta de armamentos para a Rússia – informações oferecidas por fontes russas e sem quaisquer evidências. Ainda esta semana, Li e Shoigu devem participar da reunião de ministros de defesa da Organização para Cooperação de Shanghai em Nova Délhi, Índia, nos dias 27 e 28, cuja principal pauta deve ser a estabilização do Afeganistão e o combate ao terrorismo.

Paralelamente, o embaixador chinês na França, Lu Shaye, ao tratar da anexação da Crimeia e da invasão da Ucrânia, polemizou fortemente ao afirmar que os ex-países soviéticos não seriam legitimamente soberanos. Além de prontas condenações da França e de países do leste europeu, o próprio governo chinês rejeitou a fala de Lu e ressaltou que Pequim prontamente estabeleceu relações diplomáticas com os ex-países soviéticos assim que surgiram.

Mas sem bobear em meio a essas questões (como especula Bill Bishop), Xi Jinping ligou nessa quarta (26) para o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky. É a primeira vez que os dois conversam desde o início da guerra, como explica o G1. O governo de Pequim prometeu enviar representantes à capital Kiev (e a outros países) para discutir sobre a resolução da crise – e disse que, como país com assento permanente na ONU, não irá “colocar lenha na fogueira”. Em seguida, Zelensky indicou Pavlo Ryabikin como embaixador da Ucrânia na China – a posição estava desocupada desde 2021. 

Está raro. A pauta sobre a exploração de terras raras e a sua relação com a China não é nova na Shūmiàn. As terras raras são um grupo de minerais importantes para a indústria de alta tecnologia, especialmente na produção de baterias de veículos elétricos, como já apareceu recentemente na newsletter. Em uma série de três artigos, Mary Hui escreve para a Quartz sobre a dependência chinesa da importação de minério, a percepção do governo sobre como reduzir essa fragilidade e a necessidade de expansão de investimentos pelo mundo, em que países ocidentais já estão de olho. Uma notícia da Nikkei traz a questão de que as autoridades chinesas estariam considerando proibir a exportação de terras raras, como retaliação pelas restrições dos EUA no âmbito de semicondutores. Se vai ou não, descobriremos ainda em 2023.

A questão de Taiwan chegou nas eleições do Paraguai. A disputa pelo cargo de presidente entre os dois favoritos (ambos de centro-direita) Santiago Peña e Efraín Alegre também traz tensão na questão bilateral. Como já comentamos, Alegre promete que, se eleito, reconhecerá Pequim e cortará laços com Taipei. Atualmente, o Paraguai é o único país da América do Sul a manter relações diplomáticas com a ilha e há um número crescente de paraguaios indo viver por lá. Mas talvez não faça diferença para Taiwan (e para Pequim), como se discute na Chaufa. A corrida presidencial será decidida no dia 30 de abril.

Expectativas irreais. Uma trabalhadora de uma empresa de tecnologia de Pequim ganhou na justiça direito ao pagamento de 500 horas extras realizadas por meio de mensagens respondidas no WeChat. Mais um exemplo do combate às jornadas excessivas de trabalho na China, o caso de outubro de 2022 ganhou a mídia em um momento em que se debate a afirmação estatal de que o crescente desemprego entre jovens é causado pelas altas ambições de universitários que se recusariam a trabalhar em fábricas e nos campos. Ao mesmo tempo, há um movimento desses profissionais de buscar formas alternativas de sustento e trabalhos manuais leves para escapar das demandas do mercado corporativo chinês. Uma pesquisa de 2018 revelou que 70% dos universitários chineses acredita que o trabalho duro compensa – mas isso foi em 2018, antes da pandemia de Covid-19, à qual se atribui muitas mudanças nas atitudes dos trabalhadores.

Chatbots são um problema para a China. A inteligência artificial só é tão boa quanto os dados em que é treinada – quais as consequências do grande firewall chinês sobre a sintetização dos resultados? E como censurá-los? Essas questões foram levantadas pelo pesquisador e jornalista Michael Schuman em um texto para a revista The Atlantic. Embora a China seja responsável por um terço dos artigos e citações acadêmicos na área de IA e o governo tenha metas ambiciosas para o setor, a política pode desacelerar o desenvolvimento da tecnologia: um caso emblemático é o Ernie bot, da Baidu, cuja apresentação para acionistas em meados de março foi pré-gravada, o que imediatamente derrubou as ações da companhia. Elas se recuperaram uma vez que o público foi capaz de testar o produto, mas ficou claro que o bot impõe limites a questões políticas. E isso não deve mudar: o primeiro rascunho da nova lei de Inteligência Artificial generativa, lançado este mês, indicou que os conteúdos gerados devem estar de acordo com o pensamento socialista e não devem subverter o poder do estado, a ordem social ou econômica.

Leia o livro. Na esteira do nosso encontro mensal do Clube do Livro, a boa notícia é que os chineses leram mais no último ano. Uma pesquisa nacional conduzida em 165 cidades pela Chinese Academy of Press and Publication, divulgada pela Xinhua, mostra que em média o adulto chinês leu 4,7 livros impressos e 3,3 ebooks em 2022. O livro de papel segue soberano, com crescimento também de audiolivros. Mesmo sem o Kindle, que encerra operações na China em julho, os livros digitais estão com um mercado sólido, chegando a 530 milhões de pessoas em 2022, um número 4,75% maior do que no ano anterior, atingindo principalmente pessoas entre 19 e 45 anos. Lembrando que isso inclui a leitura pelo celular, algo comum segundo 77,8% dos entrevistados.

reforma electoral en Hong Kong

Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.

Revisão: qual a perspectiva da academia chinesa sobre o colapso da URSS? O artigo original da pesquisadora Zuo Fengrong e a tradução estão no site do think tank Center for Strategic and International Studies. Para a versão resumida, confira este fio. Zuo, que é professora na Escola Central do Partido, já escreveu sobre a relação entre EUA e China e a “armadilha de Tucídides”.

De volta: uma matéria no Fantástico levou dois correspondentes brasileiros a Wuhan para mostrarem como a cidade se reergueu após o início da pandemia e o lockdown.

Oportunidade: a THINC China Tour é uma parceria da Tencent e da Fundação Viva la Vida para a realização de uma viagem de 6 dias em junho para aprender mais sobre a economia digital chinesa, passando por Pequim e Shenzhen. As inscrições estão abertas até o dia 30 de abril, há duas possibilidades de bolsa (com ou sem passagem inclusa).

Ícone:a influenciadora Nayina, uma mulher que fingiu ser uma russa na faixa dos 50 que vive no interior da China, se tornou uma sensação no Douyin (versão chinesa do TikTok) – e em bares gays, conta o The China Project. Errata: a edição que foi por e-mail afirmou erroneamente que Nayina é russa, mas ela fingiu ser, usando um filtro.

 

O documentário Eat Bitter busca apresentar as relações sino-africanas a partir de histórias pessoais (e fugindo do conflito, segundo essa crítica no The China Project). O filme é uma co-produção entre China e a República Centro-Africana. Confira o trailer acima.

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