Fotografia em cores do rio Yangtze. Vê-se um barco na água e um trecho da margem se elevando, com prédios chineses tradicionais e modernos ao fundo. Há uma névoa ofuscando o fundo da paisagem.

Edição 218 – Excesso de calor e falta de energia elétrica afetam cidades chinesas

Vacinas chinesas e gigantes de tecnologia na China

Muito calor, pouca energia. A combinação de muito calor e pouca chuva está causando uma escassez de energia elétrica, ameaçando o abastecimento na China. A seca é visível sobretudo na província de Sichuan: estátuas budistas de mais de 600 anos emergiram em Chongqing com a baixa do Yangtze – rio em que o complexo das Três Gargantas está instalado, na altura da cidade de Yichang.  As administrações locais anunciaram racionamento de energia por lá. Mas não são apenas as províncias do Sul da China as afetadas: em Shanghai, foram reduzidas as luzes do famoso Bund, principal cartão postal da cidade.

O outono vem aí. Todo ano, a cúpula do Partido Comunista vai à praia mais especificamente a Beidaihe, em Hebei. O encontro deste ano, que se encerrou no final da semana passada, obviamente foi marcado pela chegada do 20º Congresso Nacional do Partido em novembro. Após deixar Beidaihe, Xi Jinping voltou a aparecer em público e visitou um museu em Jinzhou, na província de Liaoning, no Nordeste da China. Já seu vice Li Keqiang foi para o Sul, a Shenzhen, e deu uma passada no túmulo de Deng Xiaoping, responsável pela abertura e reforma da China após a era maoísta. A foto de Li visitando Deng chamou atenção e levou a especulações sobre uma eventual discordância entre ele e Xi num momento em que o atual presidente está prestes a romper com a tradição criada por Deng de limitar a dois mandatos o poder dos líderes chineses.

Uma série de materiais, com apoio visual, pode ajudar a entender o contexto do que nos espera: a equipe gráfica do South China Morning Post criou a China’s Power Players, uma matéria multimídia com fotos, informações e perfis das figuras-chave do Partido. Por sua vez, o China Data Lab fez um levantamento histórico focado na elite do PCCh de 1997 a 2017, com um painel para visualização dos dados. Se você prefere ouvir, este Twitter Spaces reúne um grupo de especialistas em China discutindo a política da elite chinesa.

Está acontecendo. Na última sexta-feira (19), o órgão responsável pelo ciberespaço chinês publicou em seu site resumos dos algoritmos utilizados por 30 aplicativos de algumas das maiores empresas de tecnologia da China. Gigantes como Alibaba, Tencent e ByteDance foram as primeiras empresas a revelar para o governo as regras de seus algoritmos de acordo com a lei que está em vigor desde março. Embora a informação oferecida publicamente pelo órgão não seja muito esclarecedora, acredita-se que a versão entregue ao governo seja mais detalhada. Se você perdeu as discussões que rolaram sobre o assunto lá em março, pode passar um cafezinho que o tema é denso.

Adeus, incerteza. Diante do cenário ruim nas vendas e de um temor regulatório, a Tencent, detentora do WeChat, decidiu abandonar o mercado de NFTs. Como conta o SCMP, isso acontece apenas um ano depois de a gigante de tecnologia ter entrado neste setor, que começou com uma promessa de ser grande no futuro. Já tínhamos falado há algumas edições sobre a relação complicada da China com o mercado de NFTs.

Xinjiang tem — e vocês também. Ainda não é aquele relatório, mas um novo documento da ONU indica que seria “razoável” concluir que há trabalho forçado ocorrendo em Xinjiang. Segundo o relator especial da ONU sobre formas contemporâneas de escravidão, Tomoya Obokata, uigures, cazaques e outras minorias étnicas realizam trabalho forçado em setores como agricultura e manufatura em Xinjiang. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês rebateu as acusações, afirmando que isso não ocorre mais na região. Vale destacar que o relatório não foca na China — indícios de trabalho análogo à escravidão foram encontrados por todo o mundo: contra minorias na Índia, em países da África e no Brasil também. Vale a leitura.

Xi vai para o G20? Essa é a pergunta para a qual muita gente quer resposta. Na última semana, um assessor do presidente da Indonésia afirmou à imprensa que o presidente Xi Jinping viajaria a Bali em novembro para a cúpula do G20. Essa seria a primeira saída de Xi do território chinês desde janeiro de 2020, logo após o surgimento da Covid-19. Além do líder chinês, nomes como o do russo Vladimir Putin estariam confirmados. Até lá muita coisa pode rolar – até porque o encontro de lideranças mundiais deve acontecer após o Congresso do PCCh. Em julho, o SCMP publicou reportagem dizendo que Xi teria convidado líderes europeus a visitá-lo na China. Após a divulgação da notícia, Pequim negou os convites. Segue o mistério. 

Rusgas com a Índia. Na esteira da mais recente tensão a respeito de Taiwan nas últimas semanas, China e Índia também se estranharam. Primeiro veio a imprensa. Em coletiva realizada com os principais veículos indianos, o embaixador chinês Sun Weidong explicou o posicionamento de Pequim sobre a questão de Taiwan e pediu para que a mídia do país esteja atenta às tentativas de desestabilização no Estreito, que reporte sobre a situação com imparcialidade e que siga a política de “uma só China” tal como o governo indiano. Mas o tiro saiu pela culatra. Depois de décadas sem fazer cobertura in loco, jornalistas indianos foram a Taiwan cobrir os últimos acontecimentos — como, por exemplo, Gaurav Sawant, um dos principais âncoras do India Today — e a cobertura não está sendo nada positiva para Pequim.

Essas rusgas têm impactado os negócios. Como já falamos por aqui, autoridades da Índia estão passando um pente fino em empresas chinesas de tecnologia — e não só a Xiaomi. As marcas de smartphone ligadas à chinesa BBK (Vivo, Oppo e Realme), que dominam o mercado indiano, também estão sofrendo penalizações financeiras por supostamente evadirem ou sonegarem impostos. Conforme a matéria da Rest of World, essas empresas dificilmente perderão sua fatia do mercado, até porque são carros-chefe da iniciativa do governo indiano de incentivo à manufatura local de eletrônicos, mas o recado está dado: elas precisam mais da Índia do que a Índia delas.

Negócios à parte. Apesar da tensão com a guerra na Ucrânia, as relações da China com a Europa não minguaram tanto, conta matéria da Bloomberg. Apesar de uma queda nos investimentos, a motivação parece estar mais ligada aos fechamentos causados pela pandemia e política de Covid Zero do que às questões geopolíticas, como já comentamos por aqui. Ainda que algumas empresas considerem sair, o risco é perder espaço no enorme mercado para as empresas locais. 

Uma pesquisa do German Economic Institute revela que a Alemanha aprofundou sua dependência de Pequim nos últimos anos, como diz essa matéria da Reuters. Ainda assim, a relação entre governos já anda mais complicada no leste europeu — com a Estônia e a Letônia anunciando saída do grupo 14 + 1 (o 1 seria a China) pela falta de crítica das ações russas na Ucrânia. O 14+1 era considerado um sucesso pelo governo chinês nas relações com a Europa e foi bastante impulsionado pela Iniciativa Cinturão e Rota, explica James Palmer.

Não acredite no que vê nas redes sociais. Uma série de discussões surgiu sobre o papel de influenciadores chineses que incentivam “passeios” turísticos em lugares perigosos e sem estrutura, conta o WhatsOnWeibo. A situação veio à tona após sete pessoas morrerem em Pengzhou, região da província de Sichuan, um local que ficou famoso após ter sido divulgado por influenciadores. O grupo de turistas se afogou durante uma chuva torrencial e outras oito pessoas ficaram feridas. Influenciadores colocando seguidores em risco é um problema que o Brasil também conhece bem.

O nacionalismo anti-Japão em alta. A semana foi marcada por relatos de nipofobia na sociedade chinesa. Ganhou o noticiário local e internacional a prisão de uma jovem por simplesmente vestir um kimono, peça tradicional japonesa. Ela estava na cidade de Suzhou, próxima a Shanghai, fazendo cosplay de um mangá e tirando fotos quando foi abordada por policiais e detida. As imagens, que viralizaram nas redes, mostram um policial irritado questionando se ela é ou não chinesa. O argumento para levar a jovem detida era de que ela estaria “provocando brigas e causando problemas”, crime comumente usado para enquadrar diversos tipos de dissidência no país.

Também foi uma peça de roupa tradicional que complicou a famosa rede de lojas MiniSo: ela descreveu como“gueixa japonesa” o estilo de bonecas vestidas com o qipao chinês. Nacionalistas usaram as redes sociais para criticar a empresa por se passar por japonesa no exterior. Original de Guangzhou, a rede de lojas usa uma série de referências nipônicas em sua identidade visual e é considerada uma “versão chinesa da Muji”, loja de departamentos japonesa. Agora a empresa declara estar passando por um processo de “apagar” a identidade japonesa de sua marca.  

Sobrou até para o Taobao. O neologismo tǎngpíng 躺平 já deu o que falar na sociedade chinesa. Mas agora, mais de um ano após o termo ganhar espaço entre os jovens, o Taobao — plataforma online de vendas da Alibaba na China — resolveu excluir produtos com a expressão de suas lojas. Tǎngpíng pode ser traduzido como “ficar deitado”, no que seria uma reação da geração de jovens chineses de resistir às intensas jornadas de trabalho do país.

reforma electoral en Hong Kong

Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.

Uma grande perda: o tradicional restaurante Lin Heung Tea House, especializado em dim sums e pratos cantoneses, fechou as portas em Hong Kong após mais de 100 anos de atividade. O SCMP publicou uma matéria de despedida do local.

Essa cidade apocalíptica está familiar: o jogo Stray, em que você finge ser um gato, bombou. Mas, para além da vibe, o cenário foi inspirado na famosa e densamente povoada cidade murada de Kowloon, que existiu em Hong Kong até a década de 90. Já tínhamos mencionado como HK é inspiração para muitos jogos.

Zine: ao longo de uma década, de 2005 a 2015, a zine Les+ serviu como ponto de encontro da subcultura lésbica chinesa, onde mulheres compartilhavam suas histórias, alegres e tristes, e construíam uma comunidade. O SupChina relembra a trajetória da publicação.

Fim: o  The China NGO Project encerrou suas atividades e vale ler seu texto de despedida. O projeto se iniciou em 2017 para apoiar ONGs estrangeiras a partir da criação de uma lei específica para a sua atuação no território chinês. O site segue no ar com notícias, análises e a legislação pertinente.

Podcast: o episódio mais recente de The China-Africa Podcast é sobre a percepção que as sociedades africanas têm dos EUA e da China. A conversa é com o CEO do Afrobarometer, Joseph Asunka.

Ué: o que será que Elon Musk, absolutista da liberdade de expressão, teria a dizer em um ensaio para a China Cyberspace, revista do órgão regulador do ciberespaço chinês? A newsletter Beijing Channel traduziu o texto do controverso empresário.

Se mistura: evento de networking em São Paulo para o pessoal que se interessa por China e tecnologia LATAM China Tech. Será no dia 5 de setembro e tem apoio do Observa China.

Imagem de fundo vermelho com texto em branco. Caracteres chineses cujo pinyin é 背黑锅 bēi hēi guō.
Expressão usada para quando alguém é culpado por algo que não é de sua responsabilidade. Seria uma expressão a “bode expiatório” ou “pagar o pato” e, português. A inspiração para esta expressão idiomática veio desta notícia aqui, sobre a China ter feito testes de Covid em peixes.
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