Fotografia em cores de casal idoso caminhando em dia de sol, um deles usa máscara e o outro está com a máscara no queixo. Atrás deles, um muro verde com palavras em chinês escritas em branco. Ao fundo, alguns prédios.

Foto de cheng feng via Unsplash

Edição 233 – Autoridades sinalizam mudança na política de Covid Zero

Vacinas chinesas e gigantes de tecnologia na China

Mudança de rumo. O governo central parece ter decidido, de fato, relaxar as restrições de Covid-19 de modo mais amplo e estruturado, como dá a entender esta notícia de segunda-feira (5) na Xinhua. Na quarta-feira (7), a Comissão Nacional de Saúde divulgou 10 medidas, com o objetivo de fazer a transição no país da política de Covid Zero para focar na mitigação de riscos — a Reuters explica. Na semana passada, após uma série de protestos com essa demanda, as autoridades pareciam ainda indecisas sobre quais caminhos tomar: algumas cidades diminuíram restrições, mas outras não. O anúncio, no dia 1º de dezembro, do resultado de uma pesquisa chinesa sobre a menor patogenicidade da variante ômicron parece ter sido a justificativa para a mudança. Naquele dia, Sun Chunlan, uma das vice-premiê do país, afirmou que a política de Covid Zero sofreria alterações e seria otimizada, algo a ser feito de forma mais flexível, como explica essa matéria da Folha. Assim, no dia seguinte, uma série de limitações foram removidas (inclusive barricadas de contenção), além de exigências de testes constantes e de apresentação de resultados — mudanças que causaram alguns desentendimentos iniciais.

Segue o baile. Enquanto a China repensa a política de tolerância zero à Covid-19, os protestos no país seguem, mas não sem restrições por parte do governo. Neste texto para O Globo, Marcelo Ninio conta como Pequim mantém a mão forte contra quem ousa se queixar do comando do país. Um artigo do South China Morning Post cita autoridades europeias, que, em reunião com  Xi, teriam abordado o tema dos protestos e contam que o líder chinês vê nas manifestações um resultado de frustração de estudantes com a pandemia. O assunto apareceu também nas páginas do The Wall Street Journal. Seja lá qual for a origem do que está acontecendo, merece um cafezinho para acompanhar esta análise publicada na Boston Review sobre o clima criado nos últimos anos, o que culminou no que está acontecendo agora. Aliás, a AP fala sobre como tudo teria começado agora em Shanghai e o Technology Review traz um personagem central do Twitter sobre as informações das ruas chinesas: o professor Li, um artista chinês radicado na Itália.

Como a China deu adeus a Jiang Zemin? De maneira solene, Pequim recebeu os restos mortais de Jiang Zemin no sábado (2). A cremação ocorreu nesta segunda-feira (5). Antes, houve uma cerimônia à qual compareceram Xi Jinping e os demais membros do Politburo, além de ex-integrantes da alta cúpula como Li Keqiang e Hu Jintao. Os mesmos convidados fizeram parte de um funeral de Estado no Grande Salão do Povo, na terça-feira (6), com transmissão ao vivo e três minutos de silêncio. Após o anúncio do falecimento de Zemin, veículos da imprensa chinesa, além dos sites de algumas universidades, homenagearam o líder disponibilizando suas interfaces em preto e branco. Houve ainda, como mostra a Bloomberg, uma pausa no mercado financeiro durante a cerimônia de despedida do ex-presidente chinês.

As condolências também vieram de fora. Diversos países e lideranças de organizações internacionais enviaram mensagens a Pequim — inclusive o governo brasileiro — além  do presidente eleito Lula, ressaltando que a relação bilateral se transformou em parceria estratégica durante o seu governo. Jiang esteve no Brasil em 1993 e em 2001. O China Global South publicou uma análise sobre como o ex-presidente chinês foi essencial na criação das atuais relações entre China e países da África, o que se manifesta também na quantidade de diplomatas e lideranças africanas na lista dos pêsames. Para a Foreign Policy, o pesquisador Victor Shih escreveu um obituário, contando sobre o papel de Jiang em transformar a China em uma potência mundial.

É o fim da “era de ouro” das relações entre Reino Unido e China, segundo o primeiro-ministro britânico Rishi Sunak. A declaração se deu após um jornalista da BBC ser detido pela polícia de Shanghai durante os recentes protestos. Também não ajuda o cancelamento dos planos para um encontro com Xi Jinping durante o G20. Mas talvez o caso mais significativo do desentendimento entre as duas nações esteja se desenvolvendo em Hong Kong: Jimmy Lai escolheu um advogado britânico para representá-lo em seu julgamento por sedição e conluio com forças estrangeiras, o que foi aprovado pela Corte de Apelação Final local. No entanto, por se tratar de um caso envolvendo a Lei de Segurança Nacional, o líder de Hong Kong John Lee decidiu pedir que Pequim ofereça sua interpretação da Lei, adiando o julgamento para 13 de dezembro. A expectativa é que Pequim recuse a participação do advogado, o que poderia barrar a atuação de representantes estrangeiros no território — algo até então corriqueiro, como já comentamos brevemente, e considerado um indício da imparcialidade do sistema judicial local.

Fim da linha. Lembra do caso Meng Wanzhou? Ele chegou ao fim na semana passada. Foi removida a acusação de fraude bancária contra a CFO da Huawei, um desfecho esperado para o caso que se arrastou por mais de três anos. Meng já havia sido liberada da prisão domiciliar em que estava, no Canadá, após um acordo com as autoridades dos Estados Unidos, em setembro de 2021. Este texto da CBC, porém, mostra que, ainda que a executiva esteja livre das acusações, a empresa não está. Novos desdobramentos sobre possíveis fraudes e evasões da Huawei devem acontecer a partir de fevereiro, quando uma reunião para definir a data dos julgamentos está prevista.

Vitória: ainda que pareça difícil por fim a isso, o governo chinês declarou o fim do vício em jogos entre menores de idade!? Segundo relatório lançado no final de novembro, 75% dos jovens jogadores restringiram a atividade a três horas por semana. Ainda segundo o documento, 85% dos pais entrevistados aprovam as medidas de supervisão sobre a jogatina dos jovens implementadas em agosto de 2021, estabelecidas para controlar o tempo que jovens dedicavam ao “ópio espiritual”. A expectativa do setor é de que o novo índice de consumo moderado de games pela juventude abra caminho para a retomada da indústria do videogame na China: desde que as medidas foram adotadas, o país chegou a ficar nove meses sem licenciar nenhum jogo, jejum quebrado em abril de 2022.

O que há em um nome? A forma de nomear  crianças chinesas geralmente representa as aspirações que as famílias projetam no bebê. Não raro, em décadas passadas meninas carregavam em seu registro o desejo dos pais por um herdeiro do sexo masculino. Assim, entre os três sobrenomes mais comuns na China (Wang, Li, and Zhang), há hoje 32 mil mulheres chamadas Yanan, algo como “atrás apenas de um homem”. Outros nomes comuns são Yingdi (seja bem vindo, irmãozinho) e Aidi (amor pelo irmãozinho). O SCMP contou recentemente a história de Chen Xingwan, que pôde mudar seu nome sem grandes dificuldades após a adoção do Código Civil Chinês em 2021, que formalizou essa possibilidade. Hoje, muitas irmãs mais velhas estão fazendo essa mudança que antes era uma luta: no ano passado, a Sixth Tone contou a história de Fang Qian, que perseverou por mais de três meses e falou com dezenas de pessoas para conseguir mudar seu nome, Zhaodi (aceno a um irmãozinho).

Dia 1º de dezembro é o Dia Mundial do Combate à AIDS — data criada há 35 anos. Estima-se que 1,25 milhão de pessoas vivam com o HIV na China, e o estigma ainda segue grande, como contam esta matéria de Wei Xiangnan e esta de Rayner Tan, que aborda o enfrentamento ao preconceito online. O número de infecções ainda cresce, principalmente entre homens heterossexuais acima de 60 que vivem no campo, mas a taxa de incidência vem diminuindo em diversas cidades nos últimos dois anos. 

Na década de 1990, o país foi o centro de um escândalo de venda de sangue e transfusões mal feitas que levaram a uma epidemia de HIV/AIDS no país. São quase 30 anos da descoberta do primeiro grande surto do vírus na China, na cidade de Ruili. Em 2003, o governo lançou uma campanha oferecendo terapia antirretroviral gratuita a pessoas vivendo com o vírus, aconselhamento e testagem gratuitos, assistência econômica para familiares e escolarização para crianças órfãs por causa ou afetadas pelo HIV/AIDS. Esta recém lançada reportagem em vídeo da DW (que demorou sete anos para ser finalizada) conta essa história e ouve Ximei, uma fazendeira que se contaminou após um acidente de trator. Ela explica como é a realidade das políticas governamentais, a rede de apoio que construiu para outras pessoas que vivem com o vírus e os preconceitos que enfrenta. Desde 2019, esse tema aparece na nossa newsletter e já lemos sobre isso no Clube do Livro.

reforma electoral en Hong Kong

Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.

Cabiam dois na porta: um navio naufragado há 150 anos foi resgatado nas águas do rio Yangtzé. A Radii conta sobre a descoberta, feita em 2015, mas só agora trazida à tona. Ao que tudo indica, é o resgate mais bem preservado do país.

Fotojornalismo: a Far & Near propõe uma reflexão sobre como fotografar protestos na China sem comprometer a identidade dos manifestantes. Aplicável a muitos outros contextos.

Protestos: a feminista Yige Dong explica nesta entrevista para a Tempest o contexto dos protestos anti-Covid zero e contra condições de trabalho insalubres, ocorridos na Foxconn de Zhengzhou em novembro.

Acadêmico: como vai o projeto China 2025? Este working paper do National Bureau of Economic Research estadunidense acredita que vai bem devagar.

Tempos difíceis: as criadoras da Elephant Room trouxeram uma reflexão sobre a indústria cinematográfica doméstica na China desde o começo da pandemia, as dificuldades de produção e a (falta de) perspectiva de profissionais da área.

Imagem de fundo vermelho com texto em branco. Caracteres chineses cujo pinyin é笔名 bǐ míng.
Para a expressão da semana, escolhemos uma palavra usada para designar o termo “nome autoral” ou “nome de guerra” – 笔名 bǐ míng. A sugestão é do The China Project que, neste texto, debate o uso de pseudônimo para autoria de textos na China como forma de proteção.
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