
Edição 345 – A dissolução do Partido Democrático em Hong Kong
O Partido Democrático de Hong Kong, considerado a maior força de oposição local, está prestes a ser dissolvido. A notícia foi anunciada em abril, após pressão de Pequim. Com isso, as eleições de dezembro deste ano devem acontecer sem a maior força de resistência. O The New York Times faz uma grande análise sobre o que isso significa para a cidade, que fica entre um descontentamento local e pressão do comando do PCCh. A dissolução do Partido Democrático ocorre após uma série de seus líderes terem sido presos. E por falar nisso, no mês passado, quatro prisioneiros acusados de subversão foram liberados. Isso não quer dizer nem que a repressão de Pequim está se amenizando, e nem que ela está limitada a Hong Kong. O South China Morning Post conta como a China tem usado falsas ONGs para controlar o discurso junto a agências da ONU, especial em questões ligadas a direitos humanos.
Não está bom pro Jack Ma (de novo). O fundador da Alibaba apareceu envolvido em uma operação do governo chinês para pressionar um empresário que vivia na França a voltar à China. O objetivo era que H (como o empresário é identificado na reportagem) concordasse em testemunhar contra Sun Lijun, ex-vice-ministro da Segurança Pública da China. Essa história é contada em reportagens publicadas por veículos como o britânico The Guardian e os franceses Radio France e Le Monde e fazem parte do China Targets, investigação do ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, na sigla em inglês). Nessa série de relatos, jornalistas descrevem métodos de repressão transnacional usados pelo governo chinês para perseguir inimigos do regime. De acordo com documentos apresentados a um tribunal na França, o empresário alvo teria gravado conversas com oficiais e amigos recrutados como mensageiros, entre eles Ma — num enredo que mistura justiça, lealdade forçada e o uso estratégico de redes pessoais. O telefonema do criador do Alibaba ocorreu em 2021, quando ele estava em reabilitação com Pequim. Na conversa, Ma diz ter ouvido “deles”que ele seria o único capaz de persuadir o empresário a voltar ao território chinês.
O que acelerou a indústria de EVs na China: investimento estatal ou competição? A guerra dos carros elétricos na China ficou ainda mais brutal. Com lançamento de drones decolando do teto de carros em movimento, direção autônoma gratuita e recarga em cinco minutos, a BYD está redefinindo o que significa competir no maior mercado de EVs do mundo. A empresa já abocanha 27% das vendas, enquanto estrangeiras como Tesla e Toyota perderam espaço e correm para formar parcerias locais — a BMW, por exemplo, fechou acordos com Alibaba e Huawei. O novo sistema God’s Eye, lançado sem custo adicional, pressionou o modelo de negócios de rivais que apostavam em assinaturas de software.
A China cancelou a importação de 12 mil toneladas de carne suína dos EUA na última semana. O maior corte do produto desde 2020 ocorre em meio à escalada tarifária entre os dois países. Com tarifas efetivas de até 172% sobre a carne vinda dos EUA, Pequim tem reforçado suas compras de países como Brasil, Espanha e Chile, dando um recado direto a produtores estadunidenses: não há mais alvos pontuais. Os cortes afetaram também outros produtos agrícolas dos EUA, como o milho, a soja e os laticínios. A ofensiva comercial tem impacto imediato sobre os preços futuros da suinocultura americana (e até brasileira) e simboliza um possível redesenho das cadeias agroalimentares globais.
Viagens. Uma delegação brasileira liderada pelo ministro da Casa Civil Rui Costa visitou a China na semana passada em busca de novas parcerias e investimentos para o PAC. O ministro esteve em reunião acompanhado de Magda Chambriand (presidente da Petrobrás), para falar com o empresariado chinês. Na pauta estavam estaleiros, transporte naval e ferroviário. Além disso, o recém apontado ministro das comunicações Frederico de Siqueira Filho também foi e aproveitou para vender a ideia de investimentos chineses em data centers no Brasil para o Kwai, ainda que o tema principal da sua ida parece ter sido satélites de baixa órbita e o acordo do ano passado com a SpaceSail. É tudo preparação para a ida de Lula à China agora em maio.
O mercado de entrega de comida em Hong Kong está passando por mudanças. Desde que a empresa Deliveroo anunciou sua saída em março, Keeta, que pertence ao grupo chinês Meituan, vem pressionando comerciantes a pagarem mais pega taxa de entrega ou assinar um contrato de exclusividade com eles. Desde que o Deliveroo saiu do mercado, o principal concorrente do Keeta é a empresa de Cingapura foodpanda. De acordo com o Deliveroo (de capital do Reino Unido) e pessoas atentas ao funcionamento do mercado, há uma pressão de capital chinês para dificultar a operação de concorrentes no local. Isso tem resultado em alta dos preços para quem quer operar no mercado de entregas em Hong Kong, e também para quem quer pedir comida por aplicativo. Nem comerciantes, nem os consumidores parecem estar contentes com o que está acontecendo.
Será? Há um mês, contamos do cortador de cabos submarinos (responsáveis por boa parte do tráfego da internet) que a China parecia ter desenvolvido, segundo publicação de um artigo acadêmico. A partir de uma reportagem do South China Morning Post que dominou algumas manchetes preocupadas em jornais mundo afora, o jornalista Zichen Wang questiona a escolha do jornal de basear artigos com premissas mais “sensacionalistas” a partir de um ou outro artigo científico. Ele traz uma comparação da matéria com a publicação acadêmica, bem outros exemplos parecidos e levanta a bola sobre essa prática – que de modo algum é limitada ao SCMP. Afinal, quem não lembra do uso de matérias argumentando o uso de cloroquina contra a Covid-19 sob a justificação de um artigo publicado sobre o tema? Vale o recado para sempre estar atento – inclusive a mea culpa.
Totalmente sucesso: o premiado Ainda Estou Aqui chegou aos cinemas na Ásia. Na China, a exibição por enquanto foi em festival e entra em cartaz em meados de maio. O filme fez sucesso e levou a galera ao choro, conta a Folha de S. Paulo. Na Coreia do Sul também bateu forte e trouxe lembranças da história da ditadura no país.
18+: Shanghai recebeu no final de abril a sua feira internacional de produtos adultos, que conta com mais de 400 exibidores e muita tecnologia. O uso de IA brilhou.
Fóruns: a Ginger River River conta sobre o Tieba, um fórum de discussão criado pelo Baidu nos anos 2000 e que sobrevive como espaço de discussão da galera old school da internet chinesa, como conta esta postagem no WeChat.
Visual: o The New York Times fez uma visualização bem interessante de como a casa média nos EUA vai ficar em frente ao tarifaço de Trump – e mostrando como muito do que se tem é feito na China.
A história do permanente: talvez você não se lembre de quando isso era uma febre nos anos 1980 e 1990 no Brasil, mas o permanente (essa técnica de cachear os cabelos de forma que resiste a lavadas) tem sua história em Shanghai que remonta ao século 19. Vale dar uma conferida como tudo começou.
China’s La La Land