Edição 263 – Surpresa! Wang Yi é o ministro das Relações Exteriores (sim, de novo)
E não é que as fofocas tinham fundamento? Passado um mês desde que Qin Gang foi visto em público, o ministro das Relações Exteriores chinês foi removido de seu cargo e substituído pelo antecessor, Wang Yi. A decisão foi tomada após uma sessão especial do Comitê Permanente do Politburo, na última terça-feira (25), e o anúncio não foi rico em detalhes. Sendo assim, as perguntas e especulações seguem à toda: Wang Yi será ministro interino? O que Qin Gang fez de errado? Observadores apontam que Qin mantém (por enquanto) seu cargo como Conselheiro de Estado; além disso, o termo “removido”, ao invés de “demitido” parece indicar que, se ele está sendo investigado, ainda não há conclusão sobre nenhum crime. No entanto, algo parece certo: a remoção não se deu por questões pessoais, como problemas de saúde, porque menções a Qin foram removidas dos sites governamentais – no entanto, posts de usuários das redes sociais circulam o nome do ex-ministro livremente. Mais uma vez, a falta de transparência na elite política chinesa deixa muita incerteza no ar.
O Papa e a China. No começo deste mês, o Papa Francisco veio a público nomear 21 Cardeais, um dos mais altos postos da hierarquia católica. Chamou atenção a nomeação do Bispo de Hong Kong, Dom Stephen Chow Sau-Yan, que assumiu a diocese de Hong Kong há apenas dois anos a pedido do próprio Papa, o que tem sido vista como um sinal de alta preocupação do Vaticano com a China. O debate sobre o catolicismo no país tem sido algo bastante sensível nos últimos anos: houve um acordo secreto com o Vaticano em 2018, que Pequim parece ter violado, e o Cardeal Joseph Zen foi detido em 2022, sob a Lei de Segurança Nacional, diante da acusação de organizar um fundo de apoio a manifestantes contrários a Pequim.
Corrida eleitoral em Taiwan. A eleição de janeiro está cada vez mais próxima e, com a definição das candidaturas ao topo da liderança em Taipei, plataformas também estão passando por escrutínio. Lai Ching-te é o nome do candidato governista, do Partido Democrático Popular (PDP). Pelo Kuomintang (KMT), principal partido de oposição, concorre Hou You-yi, e Ko Wen-je é a nomeação da “terceira via”, pelo Partido Popular Taiwanês (PPT). O Asia Times reportou como cada um deles vê a relação da ilha com a China continental, especialmente a respeito do “Consenso de 1992”, que estabeleceu que ambas entidades faziam parte de uma só China, mas sem definir qual delas. Segundo a matéria, para o PDP o consenso já está morto, enquanto KMT e PPT pretendem segui-lo, ainda que o PPT queira esclarecimentos de Pequim. Ou seja, as relações interestreito e a estabilidade regional podem estar em risco caso Lai, atual favorito, vença o pleito. Outra questão que preocupa é o combate às mudanças climáticas e a política energética de Taiwan: a transição para energia limpa e renovável, plataforma do atual governo, é um desafio enorme. Apesar de ambiciosas metas ambientais, Taipei não vem conseguindo diminuir significativamente o uso de combustíveis fósseis em sua matriz energética, como expõe esta análise do The Diplomat.
O norte agora é outro. Se a indústria automobilística do Brasil vem sofrendo com a debandada das montadoras europeias e estadunidenses, agora está gerando oportunidades para as chinesas. A BYD anunciou na semana passada (20) que deve abrir um complexo industrial na Bahia, em espaço que antes comportava a produção da Ford. Com um investimento de R$3 bilhões, a expectativa é de que a fabricação de veículos híbridos e elétricos gere 5 mil novos empregos na cidade de Camaçari. A maior fabricante de veículos elétricos do mundo não está sozinha: a Great Wall Motor deve iniciar sua produção em São Paulo em 2024, ocupando um espaço deixado pela Mercedes-Benz. O objetivo das montadoras chinesas no Brasil é conquistar o mercado latino-americano e facilitar exportações para os Estados Unidos e Canadá.
Diplomacia chinesa volta-se para o Iêmen. Nos últimos meses, a China vem se posicionando como mediadora de conflitos no Oriente Médio, e o Iêmen tem sido um desses esforços desde maio. A analista Emily Milliken conta que Pequim tem reforçado seus laços com todos os atores do conflito no país e conversado com lideranças nos últimos dois meses, tanto com rebeldes e o governo de transição quanto com potenciais separatistas, através de acordos comerciais e participação em reuniões de alto nível. Mas por quê? Milliken diz que, muito além de contrapor-se aos EUA, a China procura garantir suprimento de petróleo e influência sobre uma região geopoliticamente importante, na saída do Mar Vermelho.
A crise imobiliária na China segue impactando a economia. Responsável por 25% do produto interno bruto, a construção civil foi indicada como o principal desacelerador da economia após a divulgação, na semana passada, do PIB chinês no segundo semestre: um crescimento de 6,3%, abaixo do esperado. Nesta segunda-feira (24), o Politburo anunciou que deve “ajustar e otimizar” as políticas públicas relativas ao mercado imobiliário. A expectativa é que a medida ajude a controlar a depreciação do valor de empresas do setor, cuja queda nas ações parece apontar para um movimento semelhante ao visto com a Evergrande. Como conta a Sixth Tone, a crise no mercado também diminuiu a busca pela formação de novos arquitetos. A grande oferta de mão de obra jovem qualificada academicamente contrasta com a demanda por trabalhadores para atuação em fábricas e no campo, o que contribui para o alto desemprego entre recém-formados.
MeToo sem fronteiras. Nesta terça-feira (25), o ex-ídolo pop Kris Wu foi ouvido pela corte de Pequim sobre sua apelação contra a condenação, recebida em novembro de 2022, a 13 anos de cadeia. Chinês com passaporte canadense, Wu deveria ser deportado ao Canadá depois de cumprir pena. Outro caso intercontinental que tomou as manchetes esta semana foi a acusação feita contra Wang Dan, ex-preso político, conhecido ativista pela democracia na China e professor universitário em Taiwan. O jovem Lee Yuan-chun, de Taiwan, afirma que Wang teria tentado estuprá-lo em 2014, em Nova York, o que Wang nega. A Deutsche Welle fez uma investigação revelando testemunhos de alunos que apontam comportamentos inadequados do professor, e ao menos um estudante fez acusações de assédio sexual.
Não deixa de ser cômico, mas o problema é mais embaixo. Como conta Fran Lu para o South China Morning Post, um apartamento na província de Sichuan deu o que falar após vizinhos perceberem que o dono havia colocado sete vacas para “pastar” na varanda. É isso mesmo que você leu. O vídeo dos animais viralizou no Douyin, a versão chinesa do TikTok, gerando mais de quatro milhões de visualizações. O apartamento faz parte de um complexo residencial de pessoas removidas de áreas rurais e realocadas em áreas urbanas – uma das principais estratégias de combate à pobreza no país. O episódio com o minigado está longe de ser algo comum, mas revela algumas das dificuldades de adaptação a um novo estilo de vida e cultura de populações realojadas. Os animais foram resgatados e pastam bem.
E mais livros: um programa de televisão reúne respeitadas figuras literárias chinesas (os autores Yu Hua e Su Tong, o editor Cheng Yongxin e o acadêmico Ye Zi) para conversar sobre literatura em uma ilha – até o Nobel Mo Yan apareceu em um episódio.
I’m a Barbie girl: and he’s just Ken. O filme da Barbie não está sendo um grande sucesso de bilheteria na China, mas o The China Project conta como ele incitou discussões (e até critério de avaliação) de relacionamentos com homens heterossexuais que se sentiram ameaçados pelo longa-metragem.
Padrão: aproveitando o gancho de corpos padrões, um acalorado debate sobre jogos otome, que são direcionados a mulheres e vêm sendo acusados de criarem expectativas irreais sobre os homens. Bom, os jogos voltados a homens não foram criticados, conta a Radii.
Para ouvir: no centésimo episódio do Nü Voices, um dos temas é a cantora Coco Lee, que faleceu no início do mês em Hong Kong. Ouça algumas das canções de Lee, inclusive a música Reflection (em mandarim), do filme Mulan.
O South China Morning Post conta sobre o sucesso do “fedido” macarrão de lesma (que sim, leva lesma). Típico da cidade de Liuzhou, ele vem conquistando paladares por toda a Ásia.