Fotografia em cores de cartaz em azul, com as palavras STOP WAR (pare a guerra) escritas em amarelo.

Foto de Tong Su via Unsplash

Edição 245 – Visita de Xi a Moscou termina sem avanços de paz

Vacinas chinesas e gigantes de tecnologia na China

Voltando ao dia a dia. Com o fim do encontro anual das Duas Sessões, agora a jornada começa para os burocratas chineses organizarem a casa para interpretar os discursos, receber novos chefes e desenhar as novas políticas. Entre apanhados gerais e análises, um dos pontos de destaque da reforma (que engloba tanto o Partido quanto o Estado) foi a criação de um órgão de governo para a fiscalização sobre o setor financeiro, a Comissão Central Financeira, e há uma comissão que vai também olhar para o papel do Partido no sistema financeiro chinês – como explica a matéria da Reuters. Junto vem também uma Comissão Central de Tecnologia que formulará as políticas estratégicas, enquanto o Ministério da Ciência e Tecnologia passará por um redesenho voltado à implementação dessas políticas, explica o China Neican. Isso se alinha com o plano de uma China digital, que foi anunciado no final de fevereiro.  No The Wall Street Journal, a crítica é de que essas reformas são para centralizar o poder de Xi. Quanto às pautas ambientais, o China Dialogue resumiu na sua newsletter.

Uma visita histórica. É assim que tem sido noticiada a decisão de Ma Ying-jeou, ex-líder de Taiwan, de ir à China continental no início da próxima semana. É a primeira vez, desde 1949, que um líder taiwanês visita o território. Ma, que é integrante do Kuomintang, o Partido Nacionalista, é visto como o chefe político de Taiwan que mais se aproximou de Pequim durante sua gestão. A viagem tem um caráter pessoal: ele fará uma visita de homenagem aos ancestrais em Hunan, e e acompanhará estudantes taiwaneses em visitas a universidades locais. A notícia foi divulgada pelo Instituto que representa o líder político, opositor ao atual governo de Taipei, comandado pelo Partido Democrático Progressista. Quando estava no poder, em 2015, Ma se reuniu com Xi Jinping em Singapura, em um encontro também considerado histórico

Enquanto isso, a atual líder do governo de Taipei, Tsai Ing-wen, anunciou que sua viagem à Guatemala e a Belize deve incluir duas passagens pelos Estados Unidos: Nova York no dia 29 de março e Califórnia, antes do retorno a Taiwan. Ainda não há confirmação ou negação de um encontro com o presidente da Câmara dos Representantes estadunidense Kevin McCarthy, que afirmou no início do mês que aproveitaria a ocasião para receber Tsai.

A nova era. Está quase tudo pronto em Pequim para receber o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, que visitará a China entre os dias 26 e 31 de março. Este é o tom dado por esta matéria. Serão pelo menos cinco dias de viagem, com direito a uma parada em Pequim e outra em Shanghai. A comitiva inclui 240 empresários (que vão por conta própria), além de parlamentares e ministros, como o da economia (Fernando Haddad), saúde (Nísia Trindade) e agricultura (Carlos Fávaro). De acordo com o Poder 360, houve um enxugamento da pauta de negociações após o pedido dos chineses, removendo discussões sobre cultura e esportes. Mesmo assim, pelo menos quatro acordos na área de Ciência e Tecnologia devem ser fechados por lá, na presença da ministra Luciana Santos. Nem só na imprensa brasileira a visita de Lula tem sido mencionada: de acordo com Nelson de Sá, o petista tem sido saudado pela mídia chinesa como “velho amigo”. Aliás, as Frentes Parlamentares Brasil-China e Brics foram relançadas na semana passada.

O encontro em Moscou. Apesar das expectativas de que o encontro de Xi Jinping e Vladimir Putin pudesse trazer avanços para uma negociação de paz entre Rússia e Ucrânia, o líder chinês voltou a Pequim após três dias de visita sem que praticamente nenhum avanço tivesse sido feito nesse sentido. Ainda que Putin tenha aceitado discutir o plano de paz proposto pelo governo chinês, a chance que a Ucrânia e países ocidentais aceitem é baixa. Contrariando o que se pensava, Xi não estendeu a viagem à Ucrânia – mas há expectativa dele fazer uma ligação à Zelensky. Na imprensa ocidental, a leitura predominante é de que Xi e Putin reforçaram laços de proximidade e de crítica aos Estados Unidos. Este também foi o tom da cobertura dada pelo SCMP, que fala em “solidificação” da parceria entre os países vizinhos. O The New York Times escreveu que enquanto a guerra segue, a China reabasteceu os suprimentos russos para drones. A Xinhua replicou em inglês um artigo de autoria de Xi que foi publicado na imprensa russa. O Tracking People’s Daily mostra como a cobertura por parte dos chineses também foi de tom de aproximação. 

O império contra-ataca. Se todo o drama do governo Trump de tentar banir o TikTok dos EUA ou tentar que ele fosse não avançou e chegou a ser arquivado, agora é a vez do governo Biden ir contra o aplicativo chinês. Segundo a matéria do The New York Times, a nova administração vinha negociando por melhora na segurança e  na proteção de dados, mas decidiu exigir uma postura mais extrema, retomando os termos do governo anterior. Especialistas na área, como aponta Paris Marx, questionam se faz sentido exigir o banimento com base na segurança nacional, enquanto a legislação estadunidense segue fraca na proteção dos dados de usuários de plataformas digitais. O próprio CEO do TikTok também ecoa essa questão e diz que a proposta atual da empresa (em parceria com a Oracle, que é dos EUA) lida com as preocupações apontadas sobre segurança. Analistas questionam se, no fim das contas, não é mais pela geopolítica do que pelos dados.

O inimigo do meu inimigo é meu amigo? Os Estados Unidos decidiram que não, pelo menos em relação a Guo Wengui, preso na em Nova York na quarta-feira passada (15). Guo é um popular dissidente que fugiu da justiça chinesa para pregar a democracia nos EUA ao lado de Donald Trump e aliados – vale ver este vídeo da Vice para conhecer seu repertório. Agora, ele deve responder, junto com seu sócio Kin Ming Je, por diferentes crimes de fraude e lavagem de dinheiro: segundo o governo estadunidense, o 1 bilhão de dólares que apoiadores investiram em suas iniciativas de mídia, um clube exclusivo e criptomoedas, na verdade custeiam sua vida de luxo.

Tempos estranhos no ensino superior. Segundo autoridades locais de Pequim, em 2023 devem se formar mais estudantes de pós-graduação do que da graduação na cidade. Os motivos para isso são variados e vão dos efeitos da pandemia sobre o fluxo de estudantes saindo e voltando para a cidade a políticas de priorização da pós-graduação adotadas por instituições de ensino superior locais. Além disso, a dificuldade para encontrar emprego está empurrando recém-graduados para a pós-graduação na esperança de melhorarem suas qualificações. Porém, como ressalta a matéria do SCMP, a situação da capital chinesa não se reflete nem é representativa de outras cidades do país.

Um passo para frente, dois para trás? Além de ter um dos leites de coco mais consumidos e famosos na China, a empresa Coconut Palm também é conhecida por fazer propagandas bastante machistas. Porém, no Dia Internacional da Mulher (8), a companhia divulgou uma nova campanha na qual homens altos e musculosos apresentavam tanto o produto quanto seus músculos para o público. A iniciativa gerou altas controvérsias em redes sociais e, como apurou a Sixth Tone, há quem diga que, ao objetificar homens e mulheres, a empresa estaria defendendo a igualdade de gênero. Detalhe: as vendas não parecem ter sido impulsionadas pela nova campanha.

Tetra. Pela quarta vez, o governo chinês vetou a participação de representantes da Wikimedia Foundation como observadores das reuniões do Comitê Permanente de Direitos Autorais e Direitos Conexos da Organização Mundial de Propriedade Intelectual, integrante do sistema das Nações Unidas. Segundo os representantes chineses, a Wikimedia usa a Wikipedia e seus outros projetos para disseminar desinformação. A fundação anunciou que deve se candidatar à participação novamente na assembleia geral de julho deste ano, uma vez que, pelas regras do comitê, desde 2022 não é necessário que haja unanimidade para esse tipo de decisão.

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Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.

Documentário: a Far & Near traz a primeira parte de uma ótima entrevista com o documentarista Chen Weixi, do filme 76 Days (sobre o início da pandemia), no qual ele fala sobre seu trabalho e seu curta-metragem Happiness Is £4 Million, que foi cotado para o Oscar de 2022.

Clube em abril: ainda nem aconteceu o nosso encontro do Clube do Livro de março (dia 27!) e já estamos aqui para falar do de abril. O motivo é a resenha na Quatro Cinco Um sobre a obra Contos de Fantasia Chineses, de Pu Songling, foco da nossa discussão do próximo mês.

História de um infográfico: contamos sobre a cidade murada de Kowloon, uma parte extremamente densa de Hong Kong que foi demolida na década de 90. Há 10 anos atrás, o SCMP publicava uma matéria visual sobre Kowloon que ficou famosa. Adolfo Arranz contou mais sobre o processo de criação por trás da história. 

O perfil ideal: o setor de tecnologia é forte no mundo todo e são muitos os estereótipos do “tipo ideal” no mercado. O Sixth Tone traz um perfil de Zhang, um guru desse segmento na China.

Governança por hora: este fascinante fio no Twitter do historiador Tom Mullaney contou como o fuso horário de Pequim governa a China, que possui apenas dois fusos em toda a sua enorme extensão territorial — o horário oficial de Pequim e um horário local de Xinjiang (o que faz a região ter dois horários simultâneos). Para se aprofundar, tem também este artigo acadêmico.

 



Morreu aos 91 anos, em Pequim, o médico militar Jiang Yanyong, que denunciou que a China estaria escondendo a epidemia de Sars em 2003. A vida do médico foi marcada por fatos políticos, incluindo prisão domiciliar por denunciar os acontecimentos na Praça da Paz Celestial em 1989.

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