Edição 200 — Mercado de trabalho preocupa jovens chineses
Desafio que o Brasil entende bem, o mercado de trabalho preocupa chineses recém-saídos da universidade. Em junho, cerca de 10,76 milhões de jovens devem se formar, o maior número da história do país. Simultaneamente, com o clima no exterior cada vez mais hostil para asiáticos, um número recorde de estudantes chineses pretende voltar ao país após terminar seus estudos no estrangeiro. Uma longa matéria da Caixin descreve o cenário: segundo pesquisa realizada pelo site de carreiras Zhaopin e o China Institute for Employment Research da Universidade Renmin, o primeiro trimestre de 2022 viu uma queda de 4,5% nas ofertas de vagas para recém-graduados, em comparação com 2021. Esses números reforçam os dados do governo que mostram que o desemprego em áreas urbanas afeta mais a faixa etária de 16 a 24 anos. De modo geral, há uma disparidade entre os interesses/demanda (trabalhar com o setor de internet, construção ou cultura) e a oferta (pouca gente quer trabalhar no setor de manufatura). A regulação sobre aulas particulares também afetou muitos jovens com ensino formal que encontrariam oportunidades nessa área. Não surpreende que a segurança oferecida pelo setor público atraia o interesse crescente dessa geração, como contamos aqui no ano passado.
Enquanto procuram um emprego, muitos desses jovens escolhem seguir estudando. Uma matéria da SixthTone mostra como, em 2022, cerca de 4,6 milhões de pessoas (um aumento de 21% em relação ao ano anterior) se inscreveram para a prova necessária para entrar num curso de pós-graduação na China. O texto, escrito pelo sociólogo Wu Xiaogang, argumenta que a expansão da graduação nos últimos 30 anos desvalorizou o diploma como diferencial diante dos empregadores, aumentando a procura pela pós-graduação, e isso piorou com a chegada da pandemia. Ao mesmo tempo, o país — ao não conseguir criar demanda para esses jovens profissionais — se vê com uma sobre-educação na sua força de trabalho. Uma das soluções estudadas pelo governo, comentada na matéria da Caixin, é aumentar o ensino técnico.
Superando as expectativas, a economia chinesa cresceu 4,8% no primeiro trimestre. O número traz certo alívio, já que a segunda maior economia global enfrenta crises sucessivas de Covid-19. A expansão do PIB nos primeiros três meses ficou acima da verificada no trimestre final de 2021, de 4%, e da estimativa feita por analistas ouvidos pela Caixin, que apostavam em uma expansão um pouco mais modesta, de 4,4%. A reportagem da revista econômica traz detalhes setoriais do que avançou entre janeiro e março de 2022.
Nem só carbono zero. Para muito além da meta de zerar as emissões de carbono até 2060, Pequim também almeja reciclar 25% de todo seu lixo têxtil até 2025. Com isso, o país, que é o maior produtor têxtil mundial, deve produzir 2 milhões de toneladas de fibra reciclada em três anos. Se você quiser saber mais sobre o problemão da sobra de tecidos e roupas, esta matéria de 2020 da Bloomberg trata desse desafio em Pequim e nas maiores cidades chinesas.
Em lockdown desde o fim de março, Shanghai registrou três mortes por Covid-19 nesta segunda (18). Como mostra a CNN, três idosos não vacinados faleceram após dias internados em hospitais. A baixa vacinação de pessoas mais velhas é um dos principais desafios para a China lidar com a onda de ômicron que atinge o país. Enquanto isso, cidadãos confinados seguem tendo dificuldade de acesso a itens alimentícios, como contado aqui, e também no relato deste jornalista. As reclamações da população permanecem, tal qual o controle sobre o que é publicado nas redes sociais.
Além do impacto direto na vida e no dia a dia das pessoas, o fechamento de cidades como Shanghai tem um peso grande na economia e na cadeia de abastecimento na Ásia, como mostra esta análise do Macropolo.
Rinha de narrativas. Na última quarta-feira (13), o Departamento de Estado dos EUA lançou seu relatório anual sobre direitos humanos no mundo. O capítulo dedicado a China, Hong Kong, Macau e Tibete destaca o “genocídio” e os “crimes contra a humanidade” cometidos contra uigures em Xinjiang. Há também uma longa e diversa lista de acusações de violações que seriam cometidas pelo estado chinês contra cidadãos opositores ao governo. Sobre Macau e Hong Kong, foram destacadas a erosão da liberdade de imprensa e as reformulações dos sistemas eleitorais das duas regiões administrativas especiais, além dos presos políticos honconguenses. Em resposta ao relatório, Pequim iniciou uma campanha difundindo acusações de violações de direitos humanos cometidas pelos EUA. Como reportou o What’s on Weibo, a tentativa de engajar netizens nesse esforço não foi muito bem sucedida — tem um bocado de gente frustrada com a atuação do governo no lockdown em Shanghai e com a censura ao assunto nas redes sociais.
A China deve ratificar dois tratados internacionais contra o trabalho forçado ainda esta semana. O tema está sendo discutido pelo Comitê Permanente do Congresso Nacional Popular (CNP), cuja 34ª sessão se iniciou na segunda-feira (18). Segundo um artigo de Mimi Lau para o SCMP, mesmo que os tratados não sejam implementados na prática, o timing da decisão sinaliza boa vontade e comprometimento chinês no combate ao trabalho forçado em um momento delicado. Em maio, a Alta Comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, deve visitar a província de Xinjiang, onde a China é acusada de promover trabalho forçado de uigures, entre outras violações de direitos humanos. A ratificação dos tratados também pode melhorar as relações de Pequim com a União Europeia, uma vez que o Acordo Global de Investimentos UE-China (CAI, sigla em inglês) prevê essa medida. O progresso em torno do CAI está parado desde a imposição de sanções europeias contra a China por causa de Xinjiang e retaliações por parte do governo chinês contra indivíduos e entidades europeias. Será que os ventos estão mudando?
O acordo China-Tailândia para a construção de três submarinos foi interrompido após uma empresa alemã se recusar a fornecer os motores a diesel utilizados na embarcação. Segundo o Bangkok Post, a empresa chinesa responsável pela fabricação dos submergíveis chegou a oferecer motores equivalentes fabricados na China, mas a marinha tailandesa rejeitou a oferta. O premiê tailandês Prayut Chan-o-cha alertou que o contrato pode ser cancelado se não se encontrarem alternativas satisfatórias, mas que os dois governos estão trabalhando juntos para contornar o problema.
Mais que parceiros: parceiros estratégicos. O professor e pesquisador Maurício Santoro acabou de lançar um livro acadêmico sobre as relações Brasil-China. Este artigo do autor para a revista Interesse Nacional resume os principais pontos da construção dessa parceria estratégica.
Alto, avante e tudo o mais. Não é de hoje que comentamos aqui sobre o setor espacial na China. A Agência de Inteligência de Defesa dos EUA relatou recentemente que tanto a China quanto a Rússia estão avançando firmes e fortes na militarização do espaço. Mas nem tudo é coisa de militar: uma matéria da CNN conta sobre os planos chineses de desenvolvimento de voos hipersônicos com finalidade turística até 2030. Na semana passada, Xi Jinping esteve em Hainan, local da base de Wenchang — de onde vários lançamentos famosos saíram, como a Tianhe e a Chang’e 5. Lá, o líder chinês falou sobre como a base é importante para a indústria espacial do país, que deve garantir que segue os padrões globais de segurança e que sua equipe deve inovar em busca de exploração espacial.
Falando nisso, nesta segunda-feira, pousaram no deserto de Gobi os três taikonautas que ficaram um semestre em órbita na estação espacial Tiangong. Essa foi a missão espacial tripulada mais longa já realizada pela China.
Parem as máquinas! Ganhou uma bolada quem apostou que iria pra frente aquela proposta apresentada durante as Duas Sessões sobre a regulação de tipologias cafonas. A SixthTone chamou a atenção nesta semana para uma campanha governamental, iniciada no começo do mês, com o objetivo de promover a autorregulação no uso de caracteres chineses pelas empresas de rádio, televisão e internet. O alvo da regulação seriam fontes que apresentam caracteres despadronizados, feios ou estranhos, ou que violem as normas, significados culturais e padrões estéticos dos caracteres chineses. Ainda segundo a SixthTone, embora especialistas ressaltem que deve haver algum espaço para a liberdade artística na tipografia, a proposta parece ter agradado netizens, especialmente aqueles que valorizam a preservação da cultura tradicional chinesa.
Chega de venda de itens roubados. O governo chinês tem fechado o cerco contra vários mercados. Um deles, sobre o qual ainda não falamos aqui, é a venda de antiguidades roubadas. Como mostra o The Arts Newspaper, desde que uma medida fiscalizatória foi implementada no ano passado, o governo solucionou cerca de 2.200 crimes ligados ao patrimônio cultural. Com isso, 58 mil antiguidades foram recuperadas. A matéria fala ainda sobre a necessidade de novas ações para que o fim deste mercado ilegal seja uma realidade mais próxima. Este é um assunto sem fim e antigo, já que estamos falando de uma civilização com mais de 5 mil anos de história. Vale ler no SCMP sobre o debate a respeito do número real de obras roubadas por comunidades estrangeiras na China.
Meteu essa, sim. O órgão Administração Nacional de Rádio e Televisão (ou NRTA) vai regular a atuação de livestreamers de jogos de videogame, tanto em plataformas específicas (similares ao Twitch, como o Douyu ou o Huya) quanto em programas de TV ou aplicativos de vídeos curtos (como o Douyin/TikTok). Em anúncio publicado no seu site na sexta-feira (15), a NRTA cita o vício de tela entre jovens e a legislação de proteção de menores. Os itens da nota incluem: não disseminar jogos sem licenças na China, manter uma postura civilizada e sadia, não incentivar (ou convidar para lives) pessoas com comportamentos considerados negativos na internet, implementar mecanismos de proteção de menores — especialmente na hora deles gastarem dinheiro. A regulação deve impactar principalmente jogos estrangeiros e competições, como conta Iris Deng para o SCMP. Para pessoas que acompanham a área, a novidade que será de fato implementada (e Elden Ring que lute, pois não tem licença). O movimento do NRTA foi acompanhado pelo anúncio de uma campanha de dois meses da Administração de Ciberespaço da China para a “limpeza” de apps de vídeos, como conteúdo pornográfico.
O mês tem sido agitado para os gamers chineses. Há duas semanas, contamos da ambição de Pequim de regular a atuação de livestreamers — especialmente com foco em evasão fiscal. E na semana passada, que o país voltou a emitir licenças para jogos, após meses de silêncio. Uma matéria recente de Sisi Jiang conta como desenvolvedores de jogos tem sido impactado pelo fechamento de Shanghai — um dos principais centros do país nesse quesito.
Zheng He foi um grande explorador chinês do século XV. Sob seu comando, o império da China chegou a praticamente todos os cantos do mundo. Esta seção é inspirada nele e te convida a explorar ainda mais a China.
Ilustrações: a artista Jam Dong está reimaginando a anatomia humana em uma série de desenhos bem-humorados. Confira as imagens e relatos da ilustradora nesta matéria do NeoCha.
Vamos de comida: na sua coluna mensal sobre comida chinesa, o Radii China trouxe um especial sobre o famoso 泡菜 pào cài, o picles chinês. É de dar água na boca!
Literatura: a parceria entre o podcast BiYiNiao do Livro e a Editora Cai Cai gerou um audiolivro da obra A Menina que Amava as Plantas, de Xu Lu, sobre a renomada pesquisadora e vencedora do Nobel Tu Youyou. Bora ouvir.
Largar tudo e vender a arte na praia: às vezes dá vontade, né? Já que falamos de emprego, confira essa matéria sobre jovens chineses que decidiram largar o escritório e investir numa carreira de ceramista na famosa cidade de Jingdezhen, berço da porcelana.
Futuro: a SupChina chamou especialistas para especular sobre como a China pode lidar com a questão da censura no metaverso.